Quarta-feira, 01.10.14

A Europa que os alemães querem só dá recessão

A Alemanha continua a desejar mais austeridade para a Europa, mesmo com a crise a bater-lhe à porta.

As principais economias do euro - Alemanha, França e Itália - estão ou em recessão, ou em anemia.

O Sul da Europa continua a patinar, com muito desemprego e muita dívida em Portugal, Espanha e Grécia.

A Irlanda melhorou apenas ligeiramente, e as coisas também não vão especialmente bem na Polónia ou na Holanda.

 

Quatro anos de intensa austeridade, imposta pela Alemanha da Sra Merkel, deram nisto: uma Europa em profunda crise.

As tensões políticas, como seria de esperar, multiplicam-se.

Os extremismos crescem em França, em Itália, na Grécia, e na própria Alemanha começam também a nascer.

Porém, os alemães não aprendem, nem querem abandonar a sua postura dura e teimosa.

 

Mesmo quando Draghi defende uma expansão da procura, com baixas de impostos e investimentos públicos, a Alemanha diz não.

Não quer nada, e ataca as intenções de Draghi de expandir a oferta monetária, baixando os juros e injectando dinheiro na economia.

Mesmo com a Europa atacada pelo desemprego, pela recessão, pela deflação e pela dívida, a Alemanha tudo rejeita e tudo sabota.

Até quando continuará esta cegueira?

 

 

publicado por Domingos Amaral às 10:39 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Quarta-feira, 03.09.14

Draghi contra Merkel, ou o bom contra a vilã

Mario Draghi é um dos poucos líderes europeus que merece o meu apreço.

Há dois anos, em Julho de 2012 e em plena crise financeira europeia, salvou o euro com uma frase e uma promessa.

Enquanto os outros queriam era recuperar a confiança com austeridade draconiana, ele percebeu que a Europa precisava era de um banco central que estivesse totalmente comprometido com a moeda única.

Na altura, os fanáticos da austeridade não quiserem reconhecer o óbvio: depois de Draghi falar, as taxas de juro da dívida pública dos países caíram a pique.

Aquilo que anos de austeridade não tinham conseguido, Draghi conseguiu com umas meras palavras.

 

Foi isso que Draghi veio reconhecer na semana passada, no seu já célebre discurso de Jackson Hole.

Para ele, não foi o excesso de dívida pública de certos países que colocou em causa o euro, mas sim uma falha no papel do BCE como credor de última instância.

Se o BCE tivesse agido a tempo, como fizeram o FED americano ou o Banco de Inglaterra, o pânico europeu não teria crescido.

Mas Draghi disse mais: defendeu que as políticas monetárias e orçamentais devem ser expansionistas, para acabar com a grave crise que assola a Europa.

 

Ora, dizer isto é chocar de frente contra a linha dura da Europa, a linha germânica, defendida por Merkel, Schauble ou Oli Rehn.

Os fanáticos da austeridade, com a Alemanha à cabeça, espumaram de raiva ao ouvir as palavras de Draghi.

Merkel telefonou-lhe logo, a pedir satisfações; e Schauble disse que ele tinha sido mal interpretado.

Para os alemães, não há qualquer dúvida, só a austeridade continua a poder salvar a Europa.

 

Deviam olhar em volta e ver os estragos que as suas políticas provocaram.

A Europa continua afocinhada na crise, com Itália, França e Alemanha em recessão, e outros países em crescimento mínimo.

O desemprego é muito alto, e a deflação já grassa. 

São esses os resultados da austeridade germânica, mas Merkel e Schauble, teimosos e fanáticos, não querem dar o braço a torcer.

Para eles, na Europa germânica só há uma verdade, a da Alemanha e mais nenhuma.

 

Esta é a grande luta europeia do momento, os austeritários contra o BCE.

Merkel, Rehn, Schauble, Passos e Maria Luís, contra Draghi.

Que Deus dê muita força ao super Mário Draghi, é o que eu desejo, para ver se damos cabo dessa gente tão pouco inteligente.

 

 

publicado por Domingos Amaral às 10:35 | link do post | comentar
Segunda-feira, 01.09.14

Ucrânia: que tal partir ao meio, metade para Merkel, metade para Putin?

Já aqui o tinha escrito e volto a escrever: a única solução para a Ucrânia parece ser a divisão do país em dois.

A parte russa, que Putin invadiu com soldados seus mascarados de clandestinos, poderá ser a Ucrânia de Leste, ou Nova Rússia, como Putin prefere.

Terá capital em Donetsk, e ligação ao mar, fazendo fronteira com a Crimeia recentemente anexada.

Quanto à parte ocidental, que deseja juntar-se à Europa, poderá ter capital em Kiev, e chamar-se Ucrânia do Oeste, ou simplesmente Ucrânia.

 

Na verdade, essa separação será apenas a confirmação histórica de uma divisão que durou séculos, entre uma zona de leste, associada à Rússia, e uma zona de Oeste, associada à Polónia.

A Ucrânia, tal como a conhecemos depois da queda da URSS, é uma entidade com pouco significado histórico, e até cultural, pois divide-se entre um leste onde a maioria do povo é russo, e um oeste onde a maioria é ucraniana.

 

Naturalmente, Putin sabe isso, conhece a história da região melhor que os europeus ou americanos, e sabe também que não pode deixar a parte leste do país deslocar-se para uma associação com a Europa germânica.

Portanto, melhor seria que todos, europeus e americanos, aceitassem o destino da história, cedendo a Putin mais um bocado de território para evitar uma destruição ainda maior na região, e a morte de muitos inocentes.

E quem quiser fazer comparações com Hitler devia pensar um pouco melhor, pois nada é igual a 1938 ou 39, o mundo mudou muito.

 

O que as pessoas se têm de perguntar é isto: quem está disposto a morrer por Donetsk?

Não me parece que, nem na América, nem na Europa, existam muitos a querer ir para a guerra.

Sanções, sim, e devem aumentar, mas guerra? Isso ninguém deseja.

publicado por Domingos Amaral às 17:26 | link do post | comentar | ver comentários (4)
Terça-feira, 27.05.14

A austeridade é a mãe de todos os radicalismos

A dívida pública portuguesa voltou este ano a subir, e já ultrapassa os 130% do PIB.

Quanto mais pagamos, em juros e amortizações, mais devemos.

É a armadilha da dívida em todo o seu esplendor dramático, um local terrível para um país estar.

Mas, não era imprevisível, pelo contrário.

Quem tenha lido este blog, já sabe que houve dezenas de países que caíram nesta situação nos últimos cinquenta anos.

Perante uma forte recessão económica, os países optam por fazer austeridade dura, o que só agrava as suas contas, e mesmo que as exportações cresçam, não conseguem crescimento económico muito forte.

Assim, com a dívida já grande, o PIB cai com a austeridade, e a dívida no final é ainda maior.

Quanto mais se paga, mais se deve.

 

Foi quase sempre assim nas dezenas de "programas de ajustamento" que foram aplicados a muitos países por esse mundo fora.

E Portugal e Irlanda não são excepções.

Podem ter "regressado aos mercados", mas as suas dívidas públicas são hoje muito maiores do que eram há 4 anos atrás.

Se o problema era a "dívida excessiva", e foi com isso que se justificou a austeridade, o que dizer agora, que a dívida é maior do que era?

O que dizer agora, quando é agora bem mais difícil pagar a dívida do que era há quatro anos?

Há alguém que acredite mesmo que será possível Portugal e Irlanda pagarem esta dívida nos próximos 50 anos?

Mesmo que o nosso crescimento fosse superior a 4% ao ano, isso seria difícil, quanto mais com crescimento que anda à volta de 1% ao ano.

 

A verdade é esta: as políticas de austeridade não resultam.

Pelo contrário, só agravam a armadilha da dívida.

A confiança dos mercados é importante, mas não altera o essencial: a dívida assim não pode ser paga, é impossível.

Isto, já muitos sabiam há quatro ou cinco anos.

Krugman, De Grauwe, Soros, Stiglitz, até Rogoff, todos eles eminentes economistas, já tinham dito que isto ia acabar como está a acabar: com uma dívida ainda maior e mais difícil de pagar.

Porém, a Europa de Merkel e seus seguidores passou quatro longos anos obcecada pela "austeridade" e os resultados estão à vista.

Não há crescimento económico que se veja (excepto na Alemanha, claro); o desemprego alastra; a deflação é um perigo real; os partidos extremistas de direita ou de esquerda crescem; e há um desencanto geral com a Europa, que pode levar ao seu desagregamento.

E tudo isto para quê?

 

Basta olhar para os Estados Unidos para perceber qual devia ter sido o caminho.

Obama recusou-se a fazer austeridade, e limitou-se a aumentar os impostos aos mais ricos.

O FED está há quatro anos a ajudar a economia com estímulos monetários, e ninguém quer ouvir falar em austeridade.

Compare-se com o que aconteceu na Europa, com a austeridade draconiana, e com a inércia do Banco Central Europeu, e está explicado porque é que a Europa está à deriva, triste e paralisada. 

 

E Portugal está também paralisado, e com o sistema político à beira da desagregação.

É isto o que a austeridade faz aos países: mata-os por dentro.

Que depois nasçam monstros, ninguém se pode admirar.

As Marines Le Pen, as Auroras Douradas, o Beppe Grillos e outros, são os filhos bastardos da austeridade. 

A austeridade é a mãe de todos os radicalismos europeus, foi nela que eles se amamentaram.

Veremos o que acontece à Europa quando eles crescerem e forem grandes...

 

 

publicado por Domingos Amaral às 10:23 | link do post | comentar
Quarta-feira, 09.04.14

Passos Coelho e o aumento do salário mínimo

De repente, quando nada o fazia prever, Passos Coelho mudou de ideias, e já quer aumentar o salário mínimo.

Depois de três longos anos a recusar tal ideia, a mudança abrupta de posição é surpreendente.

No passado, Passos sempre recusara os aumentos de salário mínimo com argumentos "ideológicos".

Não aumentava porque o aumento ia "criar desemprego"; não aumentava porque "um aumento prejudicava a criação de emprego"; não aumentava porque "um aumento ia provocar um aumento de todos os outros salários", que seriam empurrados para cima pelo mínimo.

Passos seguia a cartilha neo-liberal, as ideias de António Borges, do FMI, ou de Merkel, e defendia tais ideias com empenho.

Ainda há pouco mais de dois meses, ele negara qualquer subida do salário mínimo, mesmo depois dos parceiros sociais, empresários ou sindicatos, terem dito que apoiavam a subida, e mesmo depois do CDS ter defendido a subida.

Não, não e não, era a posição de Passos Coelho, nunca abrir essa discussão antes de 2015.

 

O que mudou então, para Passos Coelho mudar a sua decisão?

Todos os argumentos que ele apresentou antes, em defesa da manutenção do salário mínimo, continuam os mesmos.

O que mudou foi a posição da Alemanha.

Merkel, devido ao acordo com o SPD, foi obrigado a introduzir um salário mínimo na Alemanha, e logo que isso aconteceu, toda a Europa percebeu que o vento tinha mudado.

Quando a líder espiritual das políticas muda de ideias, os seus seguidores já podem também mudar de ideias.

Assim é Passos: se Merkel faz, ele faz, se Merkel não deixa, ele não faz.

Devem existir poucos Governos na Europa tão seguidistas de Merkel como o nosso.

Na prática, é ela que governa Portugal, e Passos não passa do feitor da quinta.

O que nos vale é que, desta vez, Merkel tomou uma boa decisão e Portugal vai beneficiar disso.

 

 

publicado por Domingos Amaral às 11:57 | link do post | comentar
Terça-feira, 11.03.14

A sra Merkel não deixa reestruturar a dívida!

Foi hoje revelado um manifesto de múltiplas "personalidades" que apela à reestruturação da dívida portuguesa.

Só peca por tardio, o dito manifesto.

Neste blog, por exemplo, há mais de ano e meio que escrevo que a "reestruturação" da dívida é das poucas saídas possíveis para Portugal.

Porém, não irá acontecer, com manifestos ou sem manifestos.

E não irá acontecer porque a Alemanha não deixa.

Empolgada com os resultados que começam a aparecer, de recuperação da zona euro, e sobretudo empolgada com a hipótese de Portugal conseguir regressar aos mercados em breve, a sra. Merkel nem quer ouvir falar em reestruturação da dívida.

Para ela, a austeridade é um caminho salvador, produz bons resultados, e resolverá a crise europeia.

E, além disso, a sra Merkel tem com ela todos os alemães, que não admitem "perder dinheiro" com os povos do Sul, esses libertinos e gastadores.

Pedir a "reestruturação" da dívida é pois pregar no deserto, pois os alemães estão-se nas tintas para o que nós pensamos, tal como se estão nas tintas para o que muitos economistas defendem.

 

É evidente, para quem conheça a história económica dos últimos setecentos anos, que não há casos relevantes de países que tenham saído da crise sem reestruturação de dívida.

O mito da "austeridade expansionista", tal como o mito do "crescimento pelas exportações", não passam disso mesmo, mitos.

Nenhum país conseguiu ultrapassar uma situação de dívida excessiva só com a austeridade ou com as exportações.

Mais tarde ou mais cedo, todos reestruturam as suas dívidas e a vida continuou.

Foi assim com a Alemanha, sobretudo a seguir à Segunda Guerra Mundial, mas também com muitos outros países por esse mundo fora.

Só que, havia uma diferença essencial entre esses países e o Portugal actual.

É que os países que reestruturaram as suas dívidas tinham uma moeda autónoma, e Portugal não tem.

 

Estar no euro muda tudo, principalmente porque estar no euro implica estar dependente de outros países para tomar decisões.

Dentro do euro, só se pode reestruturar a dívida se os nossos parceiros estiverem de acordo, e isso não acontece.

Nem vai acontecer nos tempos mais próximos, pois os alemães não se deixam persuadir nestas circunstâncias.

Uma reestruturação da dívida permitiria a Portugal pagar muito menos juros, o que libertaria fundos para estimular a economia.

Mas, para isso era preciso que os credores aceitassem essa reestruturação, recebendo menos dinheiro já.

Politicamente, tal hipótese é uma impossibilidade.

A carga pesada da dívida vai continuar sobre os nossos ombros, pois essa é a vontade da Alemanha.

E nada se faz na Europa sem a benção da mulher de Berlim, essa é que é essa.  

publicado por Domingos Amaral às 12:28 | link do post | comentar
Segunda-feira, 10.03.14

Programa cautelar: Cavaco bem quer, mas Merkel não deixa

O presidente da República tem feito tudo para avisar o país sobre a necessidade de um "programa cautelar".

Por mais que a situação tenha melhorado, para Cavaco estamos ainda numa zona perigosa, e sobretudo muito vulneráveis a qualquer mutação dos sentimentos dos mercados.

O esforço de consolidação orçamental foi enorme, as taxas de juro baixaram, mas apesar desses bons sinais a situação é ainda frágil.

Cavaco escreve, e avisa o país, apelando à prudência, pedindo cautela.

Temo que ninguém o oiça.

Embora na Europa muitos já tenham dito o mesmo (Barroso, Draghi, etc), nas últimas semanas o discurso europeu mudou, pois já todos perceberam que a Alemanha não quer que Portugal vá para um programa cautelar.

Merkel quer uma "saída limpa" de Portugal, para a apresentar como um "troféu".

Além disso, Merkel teme que se levasse um "programa cautelar" ao seu parlamento, ele fosse vetado, ou fossem impostas condições draconianas pelo SPD para aprovar tal coisa.

Por isso, vai obrigar Portugal a uma saída limpa, como fez com a Irlanda.

O caso Irlandês foi apresentado como uma vitória nacional de Dublin, mas não foi apenas isso, foi também uma obrigação imposta por Berlim.

O caso Português será semelhante.

Passos e o seu Governo vão apresentar a "saída limpa" como um colossal e esmagador triunfo das suas políticas, embora não estejam a fazer mais do que cumprir a vontade da Alemanha.

É uma situação arriscada, mas parece-me que ninguém quer saber o que Cavaco pensa.

Na Europa, manda Merkel, e os outros obedecem.

publicado por Domingos Amaral às 11:25 | link do post | comentar
Segunda-feira, 03.03.14

E a guerra a aproximar-se...

Por vezes, o impensável acontece, e normalmente é logo depois de acontecer o impossível.

Há dois meses, ninguém imaginava possível uma invasão da Crimeia pelas tropas russas.

As pessoas sabiam que a situação na Ucrânia não era fácil, que havia muita revolta, e uma divisão profunda do país entre os pró-russos e os pró-Europa.

Admitia-se turbulência e alta tensão, mas não se julgava possível muito mais do que isso.

Mas, dia a dia, a situação foi resvalando.

Primeiro, subiram de nível os confrontos em Kiev.

Temeu-se nessa altura a guerra cívil, que passou de impossível a imaginável em semanas.

O Presidente ucraniano fugiu, e sentiu-se alívio a Ocidente: as coisas iam entrar nos eixos, em breve haveria eleições na Ucrânia, os maus tinham perdido.

Não foi isso que aconteceu, infelizmente.

As forças russas começaram a movimentar-se, junto às fronteiras da Ucrânia, e a situação começou a agravar-se.

Aquilo que há meses era um impossível, a invasão da Crimeia, acabou por acontecer, e bem mais depressa do que o mundo esperava.

E agora estamos num local perigossímo, num abismo europeu, com a Rússia a ameaçar o Ocidente, aliada à China.

Aquilo que há dois meses seria impensável, uma situação de conflito quase militar entre Ocidente e Rússia, já mudou de carácter, e agora parece apenas impossível.

É sempre assim, o impensável passa a impossível, o impossível passa a possível, e em apenas algumas semanas o que era impensável passou a ser...possível.

Por mais que a todos nós seja absurda a ideia de uma guerra com a Rússia, as engrenagens da guerra já começaram a mexer-se, e ninguém pode dar certezas de nada.

Quem sabe se Obama, Merkel e Cameron não estarão, daqui a meses, a braços com um conflito armado em plena Europa, enfrentando um Putin cada vez mais ambicioso?

Seria uma tragédia colossal, mas deixou de ser uma tragédia impensável no espaço de semanas...

 

publicado por Domingos Amaral às 11:55 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Quarta-feira, 27.11.13

A Alemanha acabou de virar à esquerda, e ainda bem para nós!

Com o acordo hoje anunciado na Alemanha, entre o SPD e a Sra Merkel, o país vai virar um pouco à esquerda.

Merkel, apesar de contrariada, aceitou a imposição de um salário mínimo mais elevado, e também o crescimento da despesa pública alemã, nomeadamente com mais investimentos públicos em estradas.

De repente, Merkel é obrigada a fazer o que não fez, aumentar a despesa pública!

Essas são boas notícias para a Europa, para o euro e para Portugal.

A Alemanha, país mais rico, é um rebocador das outras economias europeias, e gastando mais pode puxar pelas outras, que exportarão mais.

É o contrário do que Merkel fez durante os últimos quatro anos, e que tanto mal provocou na Europa.

Desde 2009 que muitos vinham pedindo que ela estimulasse a economia alemã, mas ela resistiu teimosamente, sempre defendendo a austeridade, sem perceber que assim agravava a crise europeia.

Quem me lê, sabe bem que não admiro em nada a Sra Merkel. Acho-a lenta a raciocinar, pouco inteligente e com um grave preconceito contra certos países do Sul.

Nos últimos quatro anos, à frente de um Governo com os liberais, Merkel foi tudo o que uma líder europeia não devia ser.

Foi ela que gerou uma enorme crise de confiança no euro, ao dizer em finais de 2009 que a Alemanha não pagava a dívida dos outros países.

A partir daí, a eurozona andou à deriva, e só estabilizaria em 2012, quando Mário Draghi prometeu fazer tudo para "salvar o euro".

Mas, a desastrosa influência de Merkel não se viu só nessas frases assassinas.

Durante vários anos, tentou sabotar qualquer solução europeia da crise.

Tentou evitar os mecanismos de estabilidade europeia, tentou sabotar a intervenção do BCE, e ainda continua a tentar evitar a união bancária.

Em vez de liderar a Europa, na procura de uma solução europeia integrada, que fizesse a zona euro sair da crise, Merkel manteve o discurso obstinado em defesa da austeridade, obrigando os países da Europa do Sul a suportarem sozinhos um ajustamento duro e rápido.

O resultado está à vista de todos: o desemprego aumentou muito na Europa, os países do Sul estão numa recessão dura, a deflação é agora o maior perigo que a zona enfrenta, e por fim, prova dos nove de como as políticas de austeridade falharam, as dívidas soberanas, em vez de terem descido, subiram!

Veja-se o caso de Portugal, por exemplo.

Há quatro anos, em Janeiro de 2009, a taxa de juro da dívida pública rondava os 6%, e o stock total de dívida ia nos 150 mil milhões de euros.

Quatro anos de dura austeridade depois, a taxa de juro continua a rondar os 6%, mas o stock de dívida é agora de 230 mil milhões de euros!

Com mais desemprego, mais impostos e mais recessão. Pior era difícil.

Porém, na Europa, todos já perceberam que a austeridade germânica não leva a lado nenhum.

Finalmente, a partir de agora, será a própria Alemanha a ter de mudar. A viragem à esquerda da Alemanha, contra a vontade da Sra Merkel, é pois uma boa notícia para nós. E para o euro também. 

publicado por Domingos Amaral às 12:17 | link do post | comentar
Sexta-feira, 08.11.13

Europa: a armadilha da dívida e da deflação

Ontem, o sr. Mario Draghi, governador do Banco Central Europeu, admitiu pela primeira vez que a Europa pode estar confrontada com um novo e grave problema, a deflação!

A deflação é o oposto da inflação, é um processo continuado de descida de preços, e é tão perigosa ou mais que a inflação.

Numa deflação, as pessoas esperam que os preços desçam, e por isso não consomem, pois amanhã poderão comprar mais barato do que hoje.

Portanto, em vez de consumirem, poupam.

Assim, o crescimento económico é mais difícil, e é isso que se está a passar na zona euro, e por isso Draghi desceu as taxas de juro do BCE.

Mas, a deflação traz outro grave problema: embora os preços dos bens e dos ativos desçam, as dívidas não descem de valor, pelo contrário, há um aumento real do seu valor!

Com deflação, é muito mais difícil pagar dívidas, e é esse também o drama da zona euro, sobretudo dos países que estão muito endividados, como Portugal, Grécia, Irlanda, Espanha, Itália ou Chipre.

Porém, ninguém se deve espantar que isto esteja a acontecer.

Já nos anos 30, o economista Irving Fischer tinha escrito sobre esta situação, a chamada "armadilha da dívida e da deflação". 

Nessa armadilha, quando os países caem nela, quanto mais dívida pagam, mais devem!

Os esforços para reduzir a dívida, se forem muito pronunciados, se a austeridade for muito forte, provocam recessão, e isso leva à subida da dívida em percentagem do PIB!

É o chamado "paradoxo da desalavancagem": quando todos cortam as despesas ao mesmo tempo, isso gera uma tal contração, que todos ficam pior no fim, ainda com mais dívida.

Ao mesmo tempo, a deflação faz com que as pessoas poupem mais, e nasce o segundo paradoxo, o "paradoxo da poupança"!

Supostamente, é boa ideia poupar, ainda por cima em tempos difíceis como os que atravessamos. Contudo, se toda a gente poupar ao mesmo tempo, consome-se menos e a economia encolhe.

Lembram-se de Passos Coelho ter dito recentemente que os portugueses "tinham poupado demais"?

Pois é, tanto os assustaram, e tanto lhes cortaram o rendimento disponível, que eles se assustaram e pouparam muito, o que retraiu ainda mais a nossa economia!

São esses mecanismos que geram o sarilho em que a Europa está hoje metida.

A cruzada austeritária liderada pela Sra Merkel deu nisto: uma Europa sem crescimento económico, cheia de desempregados, e confrontada com o drama da deflação!

As fúrias contra a despesa do Estado, os ajustamentos austeritários, os programas das "troikas", conduziram a Europa a este terrível cenário.

E, pelo meio, os únicos que estão bem são os alemães, que batem recordes de excedentes comerciais, enquanto os outros se afundam em déficits.

O caminho da austeridade está a dar cabo da Europa, de Portugal e de vários outros países, e mais tarde ou mais cedo vai gerar-se um abismo entre os alemães e todos os outros. 

Ou as políticas europeias mudam, e se volta a apostar no crescimento e na despesa dos Estados, ou todo o edifíico do euro e da união monetária ficará em risco, e a divisão entre um Norte rico e um Sul pobre vai provocar um cisma poderoso!

 

publicado por Domingos Amaral às 12:36 | link do post | comentar
 

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