Quinta-feira, 13.03.14

Porque é que Passos Coelho se irritou tanto com o manifesto?

Passos Coelho irritou-se muito com o manifesto que pede a reestruturação da dívida.

Ainda a coisa não tinha nascido e já estava ele a matá-la no ventre da mãe.

Furioso contra os notáveis, jurou que jamais a dívida seria reestruturada.

Até me espantou, pois Passos não costuma ligar muito ao que dizem os supostos "notáveis" do país.

 

O que se passou para Passos perder a paciência?

É evidente que podemos dizer que este não é o timing certo para falar em reestruturação da dívida.

A dois meses do final do programa de ajustamento, estou de acordo que não é o momento certo.

Agora, o importante é terminar o programa, diz Passos, e não criar dúvidas aos nossos credores.

Sim, mas porque é que Passos acha que o manifesto dos notáveis cria dúvidas aos credores?

 

Em todos os países, quando existem crises de dívida pública, há quem defenda a reestruturação ou renegociação.

Não há qualquer novidade na ideia, que não é nem absurda, nem inesperada.

Porém, qual o real poder dos signatários do manifesto?

Na verdade, nenhum. 

São pessoas de esquerda, de direita, de centro, dali e daqui, mas nenhuma delas tem qualquer poder para condicionar Portugal.

Nem o PS, nem Cavaco, nem Portas, subscreveram o manifesto.

Então, porque se enfureceu Passos, como se tudo o que tinha feito até agora ficasse em causa?

 

Na realidade, Passos está sempre a criar inimigos, e precisa deles para se engrandecer.

Ontem, era o Tribunal Constitucional, hoje são os "notáveis do manifesto".

Alguém a quem se pode atirar culpas, alguém que se pode criticar.

Mas, se o TC ainda era uma instituição que podia limitar as escolhas do Governo, os "notáveis do manifesto" nem isso conseguem.

Enfurecer-se contra eles é uma inutilidade, é ruído sem sentido.

Ou será que Passos acha que a sra Merkel leu o manifesto dos notáveis portugueses e já nem dorme por causa disso?

Ou acha que o rating de Portugal vai ser abalado pelas ideias conjuntas de Louçã e Bagão Felix?

 

publicado por Domingos Amaral às 13:14 | link do post | comentar
Terça-feira, 11.03.14

A sra Merkel não deixa reestruturar a dívida!

Foi hoje revelado um manifesto de múltiplas "personalidades" que apela à reestruturação da dívida portuguesa.

Só peca por tardio, o dito manifesto.

Neste blog, por exemplo, há mais de ano e meio que escrevo que a "reestruturação" da dívida é das poucas saídas possíveis para Portugal.

Porém, não irá acontecer, com manifestos ou sem manifestos.

E não irá acontecer porque a Alemanha não deixa.

Empolgada com os resultados que começam a aparecer, de recuperação da zona euro, e sobretudo empolgada com a hipótese de Portugal conseguir regressar aos mercados em breve, a sra. Merkel nem quer ouvir falar em reestruturação da dívida.

Para ela, a austeridade é um caminho salvador, produz bons resultados, e resolverá a crise europeia.

E, além disso, a sra Merkel tem com ela todos os alemães, que não admitem "perder dinheiro" com os povos do Sul, esses libertinos e gastadores.

Pedir a "reestruturação" da dívida é pois pregar no deserto, pois os alemães estão-se nas tintas para o que nós pensamos, tal como se estão nas tintas para o que muitos economistas defendem.

 

É evidente, para quem conheça a história económica dos últimos setecentos anos, que não há casos relevantes de países que tenham saído da crise sem reestruturação de dívida.

O mito da "austeridade expansionista", tal como o mito do "crescimento pelas exportações", não passam disso mesmo, mitos.

Nenhum país conseguiu ultrapassar uma situação de dívida excessiva só com a austeridade ou com as exportações.

Mais tarde ou mais cedo, todos reestruturam as suas dívidas e a vida continuou.

Foi assim com a Alemanha, sobretudo a seguir à Segunda Guerra Mundial, mas também com muitos outros países por esse mundo fora.

Só que, havia uma diferença essencial entre esses países e o Portugal actual.

É que os países que reestruturaram as suas dívidas tinham uma moeda autónoma, e Portugal não tem.

 

Estar no euro muda tudo, principalmente porque estar no euro implica estar dependente de outros países para tomar decisões.

Dentro do euro, só se pode reestruturar a dívida se os nossos parceiros estiverem de acordo, e isso não acontece.

Nem vai acontecer nos tempos mais próximos, pois os alemães não se deixam persuadir nestas circunstâncias.

Uma reestruturação da dívida permitiria a Portugal pagar muito menos juros, o que libertaria fundos para estimular a economia.

Mas, para isso era preciso que os credores aceitassem essa reestruturação, recebendo menos dinheiro já.

Politicamente, tal hipótese é uma impossibilidade.

A carga pesada da dívida vai continuar sobre os nossos ombros, pois essa é a vontade da Alemanha.

E nada se faz na Europa sem a benção da mulher de Berlim, essa é que é essa.  

publicado por Domingos Amaral às 12:28 | link do post | comentar
 

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