A sra Merkel não deixa reestruturar a dívida!
Foi hoje revelado um manifesto de múltiplas "personalidades" que apela à reestruturação da dívida portuguesa.
Só peca por tardio, o dito manifesto.
Neste blog, por exemplo, há mais de ano e meio que escrevo que a "reestruturação" da dívida é das poucas saídas possíveis para Portugal.
Porém, não irá acontecer, com manifestos ou sem manifestos.
E não irá acontecer porque a Alemanha não deixa.
Empolgada com os resultados que começam a aparecer, de recuperação da zona euro, e sobretudo empolgada com a hipótese de Portugal conseguir regressar aos mercados em breve, a sra. Merkel nem quer ouvir falar em reestruturação da dívida.
Para ela, a austeridade é um caminho salvador, produz bons resultados, e resolverá a crise europeia.
E, além disso, a sra Merkel tem com ela todos os alemães, que não admitem "perder dinheiro" com os povos do Sul, esses libertinos e gastadores.
Pedir a "reestruturação" da dívida é pois pregar no deserto, pois os alemães estão-se nas tintas para o que nós pensamos, tal como se estão nas tintas para o que muitos economistas defendem.
É evidente, para quem conheça a história económica dos últimos setecentos anos, que não há casos relevantes de países que tenham saído da crise sem reestruturação de dívida.
O mito da "austeridade expansionista", tal como o mito do "crescimento pelas exportações", não passam disso mesmo, mitos.
Nenhum país conseguiu ultrapassar uma situação de dívida excessiva só com a austeridade ou com as exportações.
Mais tarde ou mais cedo, todos reestruturam as suas dívidas e a vida continuou.
Foi assim com a Alemanha, sobretudo a seguir à Segunda Guerra Mundial, mas também com muitos outros países por esse mundo fora.
Só que, havia uma diferença essencial entre esses países e o Portugal actual.
É que os países que reestruturaram as suas dívidas tinham uma moeda autónoma, e Portugal não tem.
Estar no euro muda tudo, principalmente porque estar no euro implica estar dependente de outros países para tomar decisões.
Dentro do euro, só se pode reestruturar a dívida se os nossos parceiros estiverem de acordo, e isso não acontece.
Nem vai acontecer nos tempos mais próximos, pois os alemães não se deixam persuadir nestas circunstâncias.
Uma reestruturação da dívida permitiria a Portugal pagar muito menos juros, o que libertaria fundos para estimular a economia.
Mas, para isso era preciso que os credores aceitassem essa reestruturação, recebendo menos dinheiro já.
Politicamente, tal hipótese é uma impossibilidade.
A carga pesada da dívida vai continuar sobre os nossos ombros, pois essa é a vontade da Alemanha.
E nada se faz na Europa sem a benção da mulher de Berlim, essa é que é essa.