Segunda-feira, 29.09.14

Costa pode ser o Obama lusitano

Como eu já esperava, António Costa venceu folgadamente contra António José Seguro.

Por mais que o outro o atacasse, poucas dúvidas havia que entre os dois, ele era o melhor.

E agora, com o PS a seus pés, Costa tem de pensar em como ganhar o resto do país.

A sua personalidade tem várias vantagens, a principais das quais é que ele alegra a esquerda sem assustar a direita.

 

Conheço muita gente de direita que tem simpatia, admiração e respeito por António Costa, e que admite mesmo votar nele.

A direita desiludida com Passos e Portas poderá, talvez pela primeira vez, votar no PS, pois a fúria contra o Governo é imensa.

À esquerda, embora o PCP tenha vindo a crescer, o desmembramento do Bloco poderá ser também um aliado de Costa.

Louçã ainda empolgava muitos, mas isso não se passa com a actual liderança bicéfala, de Semedo e Martins.

 

Portanto, Costa pode entusiasmar os que sempre votaram PS, mais aqueles que votaram no Bloco ou noutros fenómenos de esquerda, como Marinho e Pinto e o Livre, e ainda pode ganhar votos ao centro e mesmo à direita.

Como é que isso se consegue?

Enganam-se os que pensam que é preciso ter muitas ideias e fazer muitas promessas.

 

Obama provou que mais importante que políticas concretas é mudar o estado de espírito das pessoas.

Contra a austeridade brutal, a esperança.

Contra a recessão geral, a crença que há um futuro melhor para os portugueses

O "yes, we can" de Obama pode ser adaptado para Portugal.

 

Basta querer, basta falar diferente, basta acreditar.

Tal como George W. Bush na América, Passos e Portas cometeram tantos erros e estragaram tanto o país que a mudança é muito desejada pela grande maioria dos portugueses.

Daqui até às eleições, a única dúvida é saber quantos serão. 

publicado por Domingos Amaral às 09:57 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Quarta-feira, 03.09.14

Draghi contra Merkel, ou o bom contra a vilã

Mario Draghi é um dos poucos líderes europeus que merece o meu apreço.

Há dois anos, em Julho de 2012 e em plena crise financeira europeia, salvou o euro com uma frase e uma promessa.

Enquanto os outros queriam era recuperar a confiança com austeridade draconiana, ele percebeu que a Europa precisava era de um banco central que estivesse totalmente comprometido com a moeda única.

Na altura, os fanáticos da austeridade não quiserem reconhecer o óbvio: depois de Draghi falar, as taxas de juro da dívida pública dos países caíram a pique.

Aquilo que anos de austeridade não tinham conseguido, Draghi conseguiu com umas meras palavras.

 

Foi isso que Draghi veio reconhecer na semana passada, no seu já célebre discurso de Jackson Hole.

Para ele, não foi o excesso de dívida pública de certos países que colocou em causa o euro, mas sim uma falha no papel do BCE como credor de última instância.

Se o BCE tivesse agido a tempo, como fizeram o FED americano ou o Banco de Inglaterra, o pânico europeu não teria crescido.

Mas Draghi disse mais: defendeu que as políticas monetárias e orçamentais devem ser expansionistas, para acabar com a grave crise que assola a Europa.

 

Ora, dizer isto é chocar de frente contra a linha dura da Europa, a linha germânica, defendida por Merkel, Schauble ou Oli Rehn.

Os fanáticos da austeridade, com a Alemanha à cabeça, espumaram de raiva ao ouvir as palavras de Draghi.

Merkel telefonou-lhe logo, a pedir satisfações; e Schauble disse que ele tinha sido mal interpretado.

Para os alemães, não há qualquer dúvida, só a austeridade continua a poder salvar a Europa.

 

Deviam olhar em volta e ver os estragos que as suas políticas provocaram.

A Europa continua afocinhada na crise, com Itália, França e Alemanha em recessão, e outros países em crescimento mínimo.

O desemprego é muito alto, e a deflação já grassa. 

São esses os resultados da austeridade germânica, mas Merkel e Schauble, teimosos e fanáticos, não querem dar o braço a torcer.

Para eles, na Europa germânica só há uma verdade, a da Alemanha e mais nenhuma.

 

Esta é a grande luta europeia do momento, os austeritários contra o BCE.

Merkel, Rehn, Schauble, Passos e Maria Luís, contra Draghi.

Que Deus dê muita força ao super Mário Draghi, é o que eu desejo, para ver se damos cabo dessa gente tão pouco inteligente.

 

 

publicado por Domingos Amaral às 10:35 | link do post | comentar
Terça-feira, 27.05.14

A austeridade é a mãe de todos os radicalismos

A dívida pública portuguesa voltou este ano a subir, e já ultrapassa os 130% do PIB.

Quanto mais pagamos, em juros e amortizações, mais devemos.

É a armadilha da dívida em todo o seu esplendor dramático, um local terrível para um país estar.

Mas, não era imprevisível, pelo contrário.

Quem tenha lido este blog, já sabe que houve dezenas de países que caíram nesta situação nos últimos cinquenta anos.

Perante uma forte recessão económica, os países optam por fazer austeridade dura, o que só agrava as suas contas, e mesmo que as exportações cresçam, não conseguem crescimento económico muito forte.

Assim, com a dívida já grande, o PIB cai com a austeridade, e a dívida no final é ainda maior.

Quanto mais se paga, mais se deve.

 

Foi quase sempre assim nas dezenas de "programas de ajustamento" que foram aplicados a muitos países por esse mundo fora.

E Portugal e Irlanda não são excepções.

Podem ter "regressado aos mercados", mas as suas dívidas públicas são hoje muito maiores do que eram há 4 anos atrás.

Se o problema era a "dívida excessiva", e foi com isso que se justificou a austeridade, o que dizer agora, que a dívida é maior do que era?

O que dizer agora, quando é agora bem mais difícil pagar a dívida do que era há quatro anos?

Há alguém que acredite mesmo que será possível Portugal e Irlanda pagarem esta dívida nos próximos 50 anos?

Mesmo que o nosso crescimento fosse superior a 4% ao ano, isso seria difícil, quanto mais com crescimento que anda à volta de 1% ao ano.

 

A verdade é esta: as políticas de austeridade não resultam.

Pelo contrário, só agravam a armadilha da dívida.

A confiança dos mercados é importante, mas não altera o essencial: a dívida assim não pode ser paga, é impossível.

Isto, já muitos sabiam há quatro ou cinco anos.

Krugman, De Grauwe, Soros, Stiglitz, até Rogoff, todos eles eminentes economistas, já tinham dito que isto ia acabar como está a acabar: com uma dívida ainda maior e mais difícil de pagar.

Porém, a Europa de Merkel e seus seguidores passou quatro longos anos obcecada pela "austeridade" e os resultados estão à vista.

Não há crescimento económico que se veja (excepto na Alemanha, claro); o desemprego alastra; a deflação é um perigo real; os partidos extremistas de direita ou de esquerda crescem; e há um desencanto geral com a Europa, que pode levar ao seu desagregamento.

E tudo isto para quê?

 

Basta olhar para os Estados Unidos para perceber qual devia ter sido o caminho.

Obama recusou-se a fazer austeridade, e limitou-se a aumentar os impostos aos mais ricos.

O FED está há quatro anos a ajudar a economia com estímulos monetários, e ninguém quer ouvir falar em austeridade.

Compare-se com o que aconteceu na Europa, com a austeridade draconiana, e com a inércia do Banco Central Europeu, e está explicado porque é que a Europa está à deriva, triste e paralisada. 

 

E Portugal está também paralisado, e com o sistema político à beira da desagregação.

É isto o que a austeridade faz aos países: mata-os por dentro.

Que depois nasçam monstros, ninguém se pode admirar.

As Marines Le Pen, as Auroras Douradas, o Beppe Grillos e outros, são os filhos bastardos da austeridade. 

A austeridade é a mãe de todos os radicalismos europeus, foi nela que eles se amamentaram.

Veremos o que acontece à Europa quando eles crescerem e forem grandes...

 

 

publicado por Domingos Amaral às 10:23 | link do post | comentar
Sexta-feira, 21.02.14

Quem tem razão: Portas ou o FMI?

Esta semana, muitos foram o que escreveram sobre a suposta querela entre Portas e o FMI, que teriam interpretações muito diferentes sobre o que aconteceu, e o que está a acontecer, à economia portuguesa.

Para Portas, e de uma maneira geral para o Governo, há um "milagre económico".

As exportações portuguesas dispararam, o desemprego baixa, o ajustamento está completo, e o país pode libertar-se da "troika".

Para o FMI, o cenário não é tão cor-de-rosa, e não há qualquer "milagre económico".

Portugal apenas teve uma recessão muito forte, deixou de importar e por isso a balança comercial ficou positiva; as exportações cresceram pouco, e se não fosse a nova refinaria da GALP o resultado era minúsculo; e os salários ainda têm de descer muito, para o país ser competitivo.

Quem tem razão? Portas, com o seu entusiasmo; ou o FMI, com o seu cepticismo?

O que é interessante nesta questão é que ambos têm razão.

Aquilo que separa Portas e o FMI é uma emoção, um estado de alma, não uma realidade.

Portas está super-optimista, e o FMI está pessimista, e portanto cada um vê a realidade em função do sentimento de futuro que sente.

 

Vejamos a situação objectiva.

As exportações subiram? Sim, subiram, mas não subiram espectacularmente, e de facto, se tirarmos a refinaria da Galp do cenário, o crescimento é curto. 

Portas tem razão, quando diz que as exportações cresceram; mas o FMI também, quando alega que a estrutura de exportações não melhorou muito, Galp à parte.

Há crescimento económico? Sim, há, e isso deve ser celebrado, e aí Portas tem razão.

Porém, é frágil, como alerta o FMI, e baseia-se muito no turismo e nas exportações da Galp, e se o crescimento acelerar lá vai fazer crescer as importações outra vez, e complicar a balança comercial.

O desemprego está a descer? Sim, está, e isso é uma boa notícia, como diz Portas.

Contudo, como aponta o FMI, e outras entidades, na descida do desemprego contam muito a emigração e a sazonalidade do turismo, e por isso não se deve celebrar em demasia aquilo que pode esvair-se a qualquer momento.

E quanto à descida dos salários, quem tem razão? Os salários não têm de descer mais, como dizem Portas e Pires de Lima, e o ajustamento está feito?

Ou têm de continuar a descer, como dizem o FMI e a Comissão Europeia, para o país ser mais competitivo?

Em teoria, estas últimas entidades têm razão, mas há décadas que essa teoria económica foi contestada.

Em meados do século XX, Keynes avisou que há muita rigidez nos salários, e é muito difícil eles descerem, seja em que país for. Os ajustamentos salariais não funcionam bem por causa disso, e portanto outras soluções devem ser procuradas.

Pelos vistos, nem o FMI nem a Comissão leram Keynes, e a insistência neste ponto é uma tontaria.

O comportamento de Portas e Pires de Lima revela o que Keynes há muitos anos explicou: os países, as sociedades, os sistemas políticos, rejeitam as descidas de salários, e portanto não vale a pena ter grandes ilusões nesse campo.

Mas, nada como uma fútil polémica para entreter a malta... 

 

publicado por Domingos Amaral às 11:44 | link do post | comentar
Quinta-feira, 06.02.14

Europa ou América: quem se safou melhor?

Há cada vez mais diferenças entre a América e a Europa na forma como a crise económica tem sido combatida, e por mais que os amantes da austeridade estejam a cantar vitória, a realidade é muito menos agradável do que eles pensam.

 

Veja-se por exemplo, o que fez Obama.

Desde 2008, ajudou os bancos para evitar o colapso e tentou estimular a economia com programas de despesa pública.

Depois, evitou os cortes mais drásticos que os republicanos queriam executar, subiu o IRS para os mais ricos, e agora até já anunciou uma subida do salário mínimo para certos funcionários públicos.

Ao mesmo tempo, o banco central americano, o FED, esteve quatro anos a injectar fundos na economia, para a estimular pois ela estava longe do pleno emprego, e só nos últimos meses reduziu essas injeções para um ritmo menor. 

Ou seja, Keynes e Friedman ao mesmo tempo.

E quais foram os resultados?

Embora lentamente, a economia americana começou a crescer, crescimento esse que acelerou em 2013, e está agora a caminho dos 3% por ano, com o desemprego a cair, e o dólar num valor razoável.

As bolsas estão bem, a dívida não cresceu muito, e a América está com uma saúde económica muito superior à de outras regiões do mundo.

Obama foi keynesiano, e só não foi mais porque os republicanos não deixaram.

E o FED foi intervencionista, como dizia Friedman, e imprimiu moeda porque a economia estava longe do pleno emprego e não havia perigo de inflação.

Os americanos atacaram a recessão com todas as armas que tinham, fiscais e monetárias, e a América levantou-se do chão.

 

Agora, vejamos o que fez a Europa.

Desde 2009, ajudou os bancos com dinheiros públicos, e tentou estimular inicialmente as economias com despesa pública.

Porém, em inícios de 2010 os alemães entraram em pânico, e a Europa entrou numa cruzada de austeridade violenta, cortando a despesa pública à bruta, rejeitando qualquer subida dos salários mínimos, e com subidas generalizadas de impostos.

Ao mesmo tempo, o Banco Central Europeu demorou três anos até declarar que intervinha nos mercados comprando dívida pública, e desde então para cá nunca o fez, apenas mexendo ligeiramente nas taxas de juro, que desceu. 

A Europa rejeitou Keynes, e ignorou Friedman.

E quais foram os resultados?

A Europa afocinhou numa gravíssima crise, que atingiu o seu pico entre 2012 e 2013.

Embora existam áreas que estão a crescer um pouco, o crescimento económico na Europa é muito frágil e curto.

Além disso, o desemprego está em níveis muito elevados, e os salários desceram em muitas regiões.

Pior, as dívidas públicas de muitos países cresceram , em vez de descerem.

Além disso, a Europa está em deflação, os preços estão a cair demais, o que ainda complica mais a vida dos países com problemas, pois as pessoas adiam ainda mais os seus consumos se esperam que os preços desçam no futuro.

Em conclusão, a Europa foi anti-keynesiana, e a intervenção do BCE foi demasiado tímida, anti-Friedman, e o resultado é muito pouco abonatório.

 

Os defensores da austeridade a todo o custo deviam pensar nisso: qual a estratégia que resultou melhor, a americana (Keynes + Friedman)? Ou a europeia (nem Keynes, nem Friedman)?

A resposta é óbvia! 

 

 

publicado por Domingos Amaral às 10:11 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Sexta-feira, 20.12.13

O Tribunal Constitucional é bom para economia mas mau para as finanças!

As decisões do Tribunal Constitucional têm sempre consequências importantes. Umas são negativas, mas outras são positivas.

As negativas são financeiras, as positivas são económicas.

Comecemos pelas primeiras: o corte de 10% nas pensões, que o TC ontem chumbou, levanta problemas ao país, sobretudo em termos de percepção dos mercados financeiros.

É esse o receio do Governo: que os mercados duvidem da capacidade portuguesa em cumprir as metas acordadas com a "troika", levando os juros a subir.

Nesse caso, dificilmente se consegue evitar um programa cautelar, e mesmo um segundo resgate voltaria a ser possível.

Seria uma situação péssima para Portugal, que ninguém tenha dúvidas disso.

 

Porém, curiosamente, os juros da dívida pública portuguesa hoje ainda não subiram!

Será que os mercados estão distraídos, ou não há muita ligação entre uma coisa e outra, como diz o Governo?

O que me parece estar a acontecer é que "os mercados" estão à espera para ver o que o Governo apresenta como medidas de substituição, e só aí farão o seu juízo.

Se o IVA subir, se o IRS subir, se subir a CES, talvez se consigam os milhões em falta, e nesse caso não haverá grande drama, e não há razões para os juros subirem muito. 

Seja como for, o chumbo do TC provoca efeitos financeiros negativos, mesmo que menos graves e dramáticos do que o Governo tem dito.

 

E quanto aos efeitos positivos?

Esses serão sobretudo económicos. O corte de 10% nas pensões era muito recessivo, havia muita gente que via o seu rendimento disponível baixar, e teria de cortar nos seus consumos.

Seriam muitos milhões a menos, e isso podia representar uma contração do PIB adicional.

Como o TC chumbou o corte das pensões, esse dinheiro continuará a ser pago aos pensionistas, e não haverá contração dos consumos e do PIB por essa via, o que é bom.

Já em 2013 se verificou isso: o TC chumbou os cortes nos subsídios de Natal e férias, e isso foi uma óptima notícia para a economia.

Se houve alguma lição a retirar dos anos de 2012 e 2013, é que a economia portuguesa se adapta bem melhor à subida no IRS, de 2013, do que aos cortes na despesa, de 2012.

 

Portanto e em resumo: notícias menos boas para as finanças, mas boas para a economia portuguesa!   

publicado por Domingos Amaral às 12:27 | link do post | comentar
Quinta-feira, 19.12.13

As razões porque este Governo melhorou muito desde Julho

Nada como uma crise grave para obrigar um Governo a governar melhor.

O susto que Passos Coelho apanhou, quando viu Portas a fugir, e Cavaco a desejar um acordo com o PS, produziu bons resultados.

E, de então para cá, mesmo sem o dizer, o Governo tem corrigido alguns dos seus mais óbvios erros políticos e económicos.

Aqui se apresenta uma pequena lista das melhorias evidentes:

 

1 - O Governo passou a dar mais importância ao consenso político e social.

Nos primeiros dois anos, a teimosia de Gaspar e Passos conduziu a uma crispação evidente, seja com o PS, seja com os parceiros sociais.

No entanto, de Julho para cá, e mesmo apesar dos primeiros encontros com o PS terem sido inconclusivos, a verdade é que o Governo se tem esforçado por ir ao encontro da oposição e dos desejos dos parceiros sociais.

O acordo sobre o IRC é a melhor prova disso.

António José Seguro pode não ser o melhor político do mundo, mas é preferível o Governo entender-se com ele em certas áreas do que passar o tempo todo a criticar o PS.

 

2 - O Governo mudou a política orçamental e o país agradeceu.

Mesmo contrariado, o Governo foi obrigado a abandonar a política de cortes cegos na despesa, que em 2012 tão maus resultados produziram.

Para 2013, aumentou-se muito o IRS e o resultado foi..."um milagre económico"!

A recessão amainou, o desemprego começou a descer, e as receitas fiscais cresceram muito.

Ao contrário do que se passara em 2012, em 2013 a política do Governo não afundou o país, e isso fez diminuir a tensão em Portugal.

Lamentávelmente, não é certo que o Governo tenha aprendido esta lição, e para 2014 anunciam-se mais "cortes na despesa".

É pena que não se aprenda com os erros, mas se a economia melhorou, muito se deve à excelente adaptação do país ao aumento do IRS. 

 

3 - O Governo moderou os ataques ao Tribunal Constitucional

Sobretudo nos últimos meses, os ataques ao TC diminuíram, e foi executada pelo Governo uma estratégia mais inteligente, em parte de sedução, em parte de pressão internacional indireta, mas não um ataque frontal, como fizera Passos nos primeiros meses do ano.

Foi correto, e diminui a crispação.

Não se pode dizer que as culpas da má situação económica sejam do TC quando, como explicou um estudo do Jornal de Negócios, o TC deixou passar 80% da austeridade que o Governo queria aplicar! 

Veremos se hoje essa estratégia mais "soft" dá frutos positivos na questão das pensões.

 

4 - O Governo tem somado vitórias importantes nas privatizações

Depois da EDP e da Ana, vieram os CTT e em breve a Caixa Seguros.

São vitórias importantes e que melhoram as contas públicas.

Podemos discutir em teoria se é bom ou não privatizar certas empresas, mas uma vez tomada a decisão, é justo reconhecer que os objetivos estabelecidos foram atingidos. 

 

5 - O Governo desviou-se subtilmente da estratégia germânica de combate à crise na Europa

Em certos momentos, o Governo conseguiu deslocar ligeiramente das posições alemãs, mais duras; e já defendeu uma União Bancária mais profunda, ou mesmo a mutualização de certas dívidas. 

Ao mesmo tempo que a Europa se vai afastando subtilmente do nefasto discurso da austeridade (Oli Rehn, por exemplo, já diz que é preciso moderar o ritmo da consolidação!), o Governo vai também corrigindo o tiro.

 

Em conclusão: há males que vêm por bem, e Passos aprendeu muito com a crise de Julho!

publicado por Domingos Amaral às 10:29 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Sexta-feira, 13.12.13

O erro do FMI e o erro de Passos Coelho

Às vezes, é preciso olhar para os números para percebermos a gravidade do que se passou em Portugal.

Eis os números da austeridade, quatro anos depois.

 

Em 2010, o PIB português era de 172,8 mil milhões de euros.

Em 2013, deverá rondar os 164 mil milhões de euros.

Ou seja, a austeridade anulou-nos mais de 8 mil milhões de euros de riqueza produzida em Portugal! 

 

Em 2010, a taxa de desemprego portuguesa foi de 10,8.

Em 2013, a taxa de desemprego portugesa deverá ficar pelos 15,8, um aumento de quase 50%.

Quatro anos de austeridade criaram mais 300 mil desempregados do que havia antes.

 

Em 2010, a dívida pública portuguesa rondava os 160 mil milhões de euros, já incluindo aqui muita coisa que na altura não estava contabilizado.

Em 2013, quatro anos depois, a dívida pública portuguesa está em cerca de 230 mil milhões de euros, um aumento de 70 mil milhões de euros!

É este o resultado de quatro anos de austeridade, Portugal tem mais 70 mil milhões de dívida do que tinha!

 

Em 2010, a taxa de juro da dívida portuguesa no mercado secundário era no início do ano de 5,5%.

Em 2013, a taxa de juro da dívida pública portuguesa é no final do ano de 5,8%.

Ou seja, para curar o trágico perigo das dívidas soberanas, estivemos quatro anos em austeridade, e a taxa de juro é agora mais alta do que quando começámos!

 

A directora do FMI, a sra Lagarde, já admitiu o óbvio, que as políticas de ajustamento cometeram muitos erros, e que os resultados foram muito piores do que se esperava, especialmente em Portugal e na Grécia.

No entanto, por cá temos um primeiro-ministro que continua apaixonado pela ideia da "austeridade expansionista", e que fica muito irritado quando ouve o FMI reconhecer os erros.

Infelizmente, Passos Coelho jamais terá a humildade do FMI, e jamais reconhecerá que as suas políticas, que ele implementou e implementa com entusiasmo, não produziram bons resultados, bem pelo contrário.

Os fanáticos de uma ideia não querem saber da realidade, querem é ter razão!

 

 

 

 

publicado por Domingos Amaral às 11:14 | link do post | comentar | ver comentários (5)
Terça-feira, 10.12.13

A estranha contradição de Passos Coelho

"O Estado deve ajudar a economia a crescer contendo a despesa".

É esta a afirmação mais forte de Passos Coelho na entrevista que dá hoje ao Jornal de Negócios, e que a publicação puxa para título de capa.

Aposto que todos os meus amigos de centro-direita assinariam por baixo, e que adoram que o primeiro-ministro diga estas coisas.

Mas, há um pequeno problema, que pelos vistos escapa a Passos Coelho e a muita gente.

É que a frase é uma enorme contradição, tanto em termos teóricos como em termos práticos, como Portugal bem demonstra nos últimos dois anos.

Vamos primeiro à teoria.

Qualquer aluno de macroeconomia, no segundo ano do seu curso universitário, sabe que a despesa do Estado aumenta sempre o crescimento económico, e que o corte na despesa do Estado diminui sempre o crescimento económico de um país.

É isto que os alunos de economia aprenderam, ao longo de muitas décadas, e não há qualquer economista considerado, em qualquer país do mundo, que ensine outra coisa.

Ou seja, na teoria económica, a frase de Passos é um aborto, nunca se "ajuda" o crescimento com cortes na despesa do Estado.

Mas, além de ser um aborto teórico, é um aborto na prática.

Veja-se por exemplo o que aconteceu em Portugal.

Em 2012, o governo decidiu fazer profundos cortes na despesa do Estado.

Cortou os subsídios de férias e de Natal aos funcionários públicos e aos pensionistas, e cortou muitos "consumos intermédios" na despesa do Estado.

E qual foi o resultado?

Como previa a teoria económica, o resultado foi uma recessão dos diabos!

Caiu o PIB, aumentou drasticamente o desemprego, e caíram também as receitas fiscais, levando a que o deficit orçamental do Estado diminuisse muito pouco, e muito menos que o Governo desejava.

E tanto assim foi que o ministro das Finanças, Vítor Gaspar, se demitiu envergonhado com os resultados.

Ou seja, o corte de 2012, ou "contenção", como lhe chama Passos, na despesa do Estado foi um brutal fiasco económico, com efeitos destrutivos sobre Portugal.

Agora vejamos o que aconteceu em 2013.

Em 2013, impedido pelo Tribunal Constitucional de repetir a dose de cortes, o Governo foi obrigado a subir muito o IRS, com o já famoso "enorme aumento de impostos".

E o que aconteceu?

Bem, o que aconteceu foi que o PIB voltou a crescer, o desemprego começou a descer, as receitas fiscais do Estado cresceram imenso, e o deficit vai reduzir muito, até podendo acontecer que Portugal consiga ficar abaixo dos 5,5% que combinou com a "troika".

Ou seja, e citando o ministro Pires de Lima, em 2013 aconteceu um "milagre económico"!

E reparem que as exportações estiveram sempre a crescer, fosse em 2012 ou em 2013, portanto não foram elas, nem as responsáveis pela queda em 2012, nem pelo aumento do PIB em 2013.

A verdade nua e crua é esta: a economia portuguesa ajustou-se muito melhor ao aumento do IRS de 2013 do que aos brutais cortes de despesa de 2012!

Isto não é uma questão de ideologia ou crença, isto são factos!

Portanto, a frase de Passos Coelho é um estranho absurdo, só explicável por uma crença política.

Ele acredita mesmo numa ideia que é um aborto teórico e num aborto prático!

É isso que é pena, pois devia haver, ao fim destes anos e com estes resultados, mais lucidez em Passos.

Se ele tivesse aprendido alguma coisa com o que se passou em Portugal, o que Passos devia dizer era: "o Estado deve ajudar a economia a crescer mantendo o IRS alto, pois era baixo demais".

Ou: "a melhor maneira do Estado ajudar a economia a crescer é não fazendo cortes à bruta na despesa".

Ou ainda: "há duas maneiras de descer um deficit, uma são os cortes na despesa, outra são os aumentos de impostos, e esta última é muito mais eficaz e não destrói tanto a economia". 

Porém, Passos parece nem perceber de teoria económica, nem sequer olhar para a realidade da economia do seu país, e em 2014 vai repetir a receita de 2012, e massacrar Portugal com mais cortes de salários e pensões.

Sendo assim, como prevê a teoria e como a prática vem mostrando, é muito provável que em 2014 entremos em nova recessão.

Lá se irá o "milagre económico" de Pires de Lima para o lixo e a frase de Passos vai mostrar, mais uma vez, o esplendor do seu absurdo.

 

 

publicado por Domingos Amaral às 11:54 | link do post | comentar | ver comentários (3)
Quarta-feira, 27.11.13

A Alemanha acabou de virar à esquerda, e ainda bem para nós!

Com o acordo hoje anunciado na Alemanha, entre o SPD e a Sra Merkel, o país vai virar um pouco à esquerda.

Merkel, apesar de contrariada, aceitou a imposição de um salário mínimo mais elevado, e também o crescimento da despesa pública alemã, nomeadamente com mais investimentos públicos em estradas.

De repente, Merkel é obrigada a fazer o que não fez, aumentar a despesa pública!

Essas são boas notícias para a Europa, para o euro e para Portugal.

A Alemanha, país mais rico, é um rebocador das outras economias europeias, e gastando mais pode puxar pelas outras, que exportarão mais.

É o contrário do que Merkel fez durante os últimos quatro anos, e que tanto mal provocou na Europa.

Desde 2009 que muitos vinham pedindo que ela estimulasse a economia alemã, mas ela resistiu teimosamente, sempre defendendo a austeridade, sem perceber que assim agravava a crise europeia.

Quem me lê, sabe bem que não admiro em nada a Sra Merkel. Acho-a lenta a raciocinar, pouco inteligente e com um grave preconceito contra certos países do Sul.

Nos últimos quatro anos, à frente de um Governo com os liberais, Merkel foi tudo o que uma líder europeia não devia ser.

Foi ela que gerou uma enorme crise de confiança no euro, ao dizer em finais de 2009 que a Alemanha não pagava a dívida dos outros países.

A partir daí, a eurozona andou à deriva, e só estabilizaria em 2012, quando Mário Draghi prometeu fazer tudo para "salvar o euro".

Mas, a desastrosa influência de Merkel não se viu só nessas frases assassinas.

Durante vários anos, tentou sabotar qualquer solução europeia da crise.

Tentou evitar os mecanismos de estabilidade europeia, tentou sabotar a intervenção do BCE, e ainda continua a tentar evitar a união bancária.

Em vez de liderar a Europa, na procura de uma solução europeia integrada, que fizesse a zona euro sair da crise, Merkel manteve o discurso obstinado em defesa da austeridade, obrigando os países da Europa do Sul a suportarem sozinhos um ajustamento duro e rápido.

O resultado está à vista de todos: o desemprego aumentou muito na Europa, os países do Sul estão numa recessão dura, a deflação é agora o maior perigo que a zona enfrenta, e por fim, prova dos nove de como as políticas de austeridade falharam, as dívidas soberanas, em vez de terem descido, subiram!

Veja-se o caso de Portugal, por exemplo.

Há quatro anos, em Janeiro de 2009, a taxa de juro da dívida pública rondava os 6%, e o stock total de dívida ia nos 150 mil milhões de euros.

Quatro anos de dura austeridade depois, a taxa de juro continua a rondar os 6%, mas o stock de dívida é agora de 230 mil milhões de euros!

Com mais desemprego, mais impostos e mais recessão. Pior era difícil.

Porém, na Europa, todos já perceberam que a austeridade germânica não leva a lado nenhum.

Finalmente, a partir de agora, será a própria Alemanha a ter de mudar. A viragem à esquerda da Alemanha, contra a vontade da Sra Merkel, é pois uma boa notícia para nós. E para o euro também. 

publicado por Domingos Amaral às 12:17 | link do post | comentar
 

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