Quarta-feira, 01.10.14

A Europa que os alemães querem só dá recessão

A Alemanha continua a desejar mais austeridade para a Europa, mesmo com a crise a bater-lhe à porta.

As principais economias do euro - Alemanha, França e Itália - estão ou em recessão, ou em anemia.

O Sul da Europa continua a patinar, com muito desemprego e muita dívida em Portugal, Espanha e Grécia.

A Irlanda melhorou apenas ligeiramente, e as coisas também não vão especialmente bem na Polónia ou na Holanda.

 

Quatro anos de intensa austeridade, imposta pela Alemanha da Sra Merkel, deram nisto: uma Europa em profunda crise.

As tensões políticas, como seria de esperar, multiplicam-se.

Os extremismos crescem em França, em Itália, na Grécia, e na própria Alemanha começam também a nascer.

Porém, os alemães não aprendem, nem querem abandonar a sua postura dura e teimosa.

 

Mesmo quando Draghi defende uma expansão da procura, com baixas de impostos e investimentos públicos, a Alemanha diz não.

Não quer nada, e ataca as intenções de Draghi de expandir a oferta monetária, baixando os juros e injectando dinheiro na economia.

Mesmo com a Europa atacada pelo desemprego, pela recessão, pela deflação e pela dívida, a Alemanha tudo rejeita e tudo sabota.

Até quando continuará esta cegueira?

 

 

publicado por Domingos Amaral às 10:39 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Segunda-feira, 18.11.13

As 7 razões porque 2013 está a ser melhor que 2012

Parece evidente a todos que a economia portuguesa está melhor em 2013 do que esteve em 2012.

O desemprego baixou um pouco, e a recessão não foi tão forte, com dois trimestres seguidos de algum crescimento.

O déficit orçamental não baixou muito, mas também não piorou, e as taxas de juro da dívida estão agora abaixo de 6%.

Mas, o que é que mudou entre 2012 e 2013?

Muita coisa, e convém perceber o quê.

 

1) Lá fora, mudou o ambiente financeiro.

Em 2012, as taxas de juro da dívida portuguesa, e de quase todos os países europeus, foram vítimas de enorme instabilidade, com crescimentos muito acentuados.

Porém, a partir de Setembro, quando o BCE anunciou o programa OMT, as coisas desanuviaram, e esse diminuir das tensões prolongou-se por 2013.

Tanto o BCE, como sobretudo o FED americano e o Banco do Japão, aplicaram uma política monetária expansiva em 2013, com quedas das taxas de juro ou "quantitative easing".

É sobretudo por isso que se verifica uma calmaria nos mercados das dívidas públicas, pois os investidores, "os mercados", têm mais garantias de liquidez e portanto não estão tão desconfiados.

E foi sobretudo isso que permitiu à Irlanda voltar "aos mercados", e poderá auxiliar Portugal nesse objectivo em 2014.

 

2) Lá fora, as bolsas internacionais têm estado a subir.

Uma das consequências da política monetária expansiva que tem sido seguida nos EUA, no Japão e um pouco na Europa, foi a subida das bolsas internacionais.

Em 2013, as bolsas de Nova Iorque batem recordes, e as europeias e japonesas também têm estado sempre a subir.

Além do que isso significa em termos psicológicos, há também um "efeito riqueza" que se vai espalhando à economia.

Como as suas carteiras de ações se valorizam, os consumidores podem aproveitar para consumir mais, e as empresas para investir. 

 

3) Lá fora, houve várias economias que melhoraram os seus crescimentos económicos.

A América continuou a crescer, o Japão começou a crescer, a na Europa, a Alemanha e o Reino Unido também conseguiram algum crescimento.

Até a própria Espanha, tão deprimida em 2012, melhorou a sua situação!

Embora a China tenha estado abaixo do esperado, há indicadores que os chineses irão estimular mais o seu mercado interno, e isso já se sentiu um pouco em 2013.

Os rebocadores da economia mundial, embora tenham crescido pouco, estão pois em terreno positivo, e isso possibilitou a que os países mais pequenos, como Portugal, tenham conseguido exportar mais em 2013 do que em 2012.

 

4) Cá dentro, sentiu-se a melhoria do cenário internacional.

As exportações portuguesas beneficiaram com os crescimentos de vários países, e bateram vários recordes.

Além do mérito nacional, isso só foi possível porque as "economias rebocadoras" aumentaram a procura dos nossos bens.

No teatro financeiro, Portugal também beneficiou muito das descidas das taxas de juro da dívida que a actuação dos bancos centrais europeu e americano possibilitaram. 

Por fim, também a nossa bolsa de Lisboa esteve bem, sobretudo no segundo semestre de 2013, o que valorizou muito as carteiras dos que têm valores mobiliários, e produziu um efeito positivo extra, que pode ter tido algum efeito positivo no consumo.

 

5) Cá dentro, o turismo português teve um ano excelente.

Seja por mérito próprio, seja devido à instabilidade no Norte de África, que desviou para Portugal muitos turistas, a verdade é que o ano foi muito bom, o que permitiu uma entrada de receitas adicional que muito jeito nos deu. 

Esta crescimento adicional foi importante para compensar os efeitos negativos da recessão interna.

Foram os estrangeiros que nos ajudaram, e o mesmo aconteceu à Grécia.

 

6) A economia portuguesa adaptou-se melhor ao aumento do IRS do que aos cortes na despesa.

Em 2012, os cortes nos subsídios de férias e Natal, e os muitos cortes em despesas intermédias do Estado, provocaram uma recessão interna muito cavada. O desemprego disparou, e o PIB caiu muito mais do que se esperava, tendo por isso também diminuído muito as receitas fiscais.

A brutal austeridade provocou uma brutal recessão.

No entanto, em 2013 a política orçamental mudou.

Em vez de cortar à bruta na despesa, o Governo subiu o fortemente IRS.

O que se verificou, em 2013, foi que a economia absorveu muito melhor o aumento do IRS, e a recessão foi muito menos forte.

Aumentar os impostos provocou menos danos do que cortar na despesa, é essa a lição a retirar.

 

7) O Tribunal Constitucional deu, mais uma vez, uma boa ajuda à economia.

O veto do TC ao corte de um dos subsídios em 2013 ajudou a economia portuguesa.

Ao impedir que o Governo aplicasse esse corte, o TC permitiu que esse dinheiro fosse parar ao bolso das pessoas, ajudando a economia pela via do consumo.

Em vez de criticar TC, o Governo devia agradecer ao TC por ter ajudado ao crescimento da economia.

Embora não exista ainda qualquer "milagre económico", algum do crescimento económico que existiu em 2013 deve-se ao TC e não ao Governo.  

 

Em resumo: 2013 foi melhor do que 2012, mas era bom perceber que, se o Governo tivesse feito o que queria, cortar os 2 subsídios a funcionários e pensionistas, provavelmente não estaria agora a festejar o regresso ao crescimento económico, pois a recessão teria sido bem mais forte, como foi em 2012.

A estranha conclusão é esta: este Governo beneficiou, não das suas políticas desejadas, mas daquilo que foi obrigado a fazer contrariado.

E é pena que ainda não tenha aprendido a lição, e que anuncie para 2014 mais cortes na despesa.

Já devia ter percebido que isso é pior para a economia do país, e no limite para o próprio Governo.

 

 

publicado por Domingos Amaral às 10:49 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Segunda-feira, 23.09.13

Portugal, Merkel, e a nossa armadilha da dívida

Portugal está na típica "armadilha da dívida".

Se cortar na despesa para fechar o deficit, causa recessão e desemprego, e a dívida pode aumentar porque o PIB cai.

Se estimular a economia, com descidas de impostos, agrava o deficit e a dívida pode aumentar.

Ou seja, façamos o que fizermos, há sempre algum objectivo que falha.

Ou falha o deficit, ou falha o crescimento, ou falha a dívida.

É a "armadilha da dívida" em todo o seu esplendor. Quanto mais pagamos, mais devemos.

Como sair deste imbróglio?

A "austeridade", tão do agrado de Passos, Gaspar ou Merkel, causou muitos danos, com um desemprego altíssimo e várias crises políticas.

Com isso, ganhou-se alguma credibilidade, mas não se alterou a marcha imparável do crescimento da dívida.

Agora, veio um pouco de crescimento económico, com mais turismo e exportações, mas também isso não impede os juros de subirem.

Há um preconceito contra Portugal, como disse ontem Passos Coelho?

O problema é mais profundo do que esse, infelizmente.

Ao contrário do que muitos têm dito nos últimos anos, dentro do euro não há uma solução nacional para a questão das "dívidas soberanas".

Nem Portugal, nem a Grécia, nem o Chipre, nem a Irlanda, têm capacidade para pagar sozinhos a monumental dívida que contraíram.

Estão presos numa armadilha: emitiram dívida numa moeda que não controlam, e a desconfiança que sobre eles paira é permanente.

Sozinhos, jamais sairão desta prisão.

Desenganem-se os que pensam que a austeridade, as reformas estrurais, ou as exportações vão permitir o crescimento necessário para pagar estas dívidas. Não vão.

Um segundo resgate, ou um programa cautelar, podem ser diferentes do ponto de vista político, mas não são muito diferentes do financeiro.

É mais dinheiro emprestado, com muitas condições, seja pela "troika", seja pelo BCE.

E não nos tira da armadilha.

A única solução é europeia.

Só a Europa, com os seus recursos, e a sua força política, poderá solucionar definitivamente a questão.

Mutualizar a dívida é absorver a dívida dos prevaricadores; mas também é impedir que esses países, no futuro, se endividem mais.

Porém, não parece ser esse o caminho da Sra. Merkel.

A sua vitória de ontem foi retumbante, e histórica. Mas, não chega para governar sozinha.

Mudará Merkel, aliada ao SPD ou aos Verdes; tornando-se mais europeia e menos alemã?

Ou continuará a insistir numa receita que causa muitos danos e não resolve o problema da dívida?

Portugal está no topo da preocupações de Merkel, diz hoje o Wall Street Journal, e pode despoletar mais uma crise do euro.

É tudo verdade, mas Merkel, se quisesse, podia caminhar noutro sentido, menos duro e punitivo.

As soluções nacionais, de sacrifício e "troikas", estão esgotadas.

Não há soluções solitárias, só de conjunto. 

Talvez Passos tenha mesmo de ir lá falar com ela, pedir-lhe compreensão e ajuda. Mas só isso, é insuficiente.

Mais Europa, é o que é preciso.

Caso contrário, irá prolongar-se este ciclo de agonias, com pequenos interlúdios de alívio, como foi este Verão. 



 

publicado por Domingos Amaral às 10:03 | link do post | comentar | ver comentários (2)
Sexta-feira, 09.08.13

Viva Obama, alguém que está contra a austeridade na Europa!

Barack Obama falou sobre a Grécia e as suas palavras foram contundentes: a austeridade não vai resolver o problema grego.

Só cortes na despesa do Estado e impostos altos não irão ser capazes de tirar o país da profunda recessão em que está mergulhado.

Obama sabe do que fala.

Também na América, o partido republicano quis ser "austeritário", cortando o deficit e diminuindo a dívida.

Obama foi muito atacado pelos moralistas e pelos austeritários, que acham mais grave existirem dívidas do que desemprego.

Porém, não hesitou, e nunca praticou a austeridade que lhe pediam.

Pelo contrário, tentou estimular a economia com mais despesa do Estado. Subiu os impostos também, mas só para os mais ricos.

O resultado foi bom: enquanto a Europa inteira afocinhava numa recessão, a América começava a sair da crise.

Começava e continua a sair da crise.

Com a ajuda dos estímulos do FED, que injecta mais fundos na economia, o desemprego já desce há muitos meses.

Nada disto foi possível na Europa.

Os alemães, sempre aterrados com o trauma de uma inflação que ninguém vê, impedem o BCE de lançar estímulos semelhantes aos do FED.

E Merkel e seus lugares-tenentes massacraram os pequenos países do Sul com doses cavalares de austeridade.

O resultado é o que se vê.

Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha, Itália, Chipre e até a França, não conseguem crescimento decente.

Os pequenos sinais positivos que aparecem são sobretudo isso, pequenos.

A Europa do Sul foi aprisionada na "armadilha da dívida". Faz-se austeridade para baixar a despesa do Estado, mas isso gera mais recessão, e a dívida continua sempre a crescer.

Não há saída desta armadilha assim. Nem as exportações, nem as reformas do Estado, pagam estas dívidas.

As únicas soluções são outras: reestruturação individual ou mutualização europeia das dívidas.

Até a revista "The Economist", paladina do liberalismo económico, não tem dúvidas.

Hoje, o editorial é lapidar: Portugal, Irlanda e Grécia não vão pagar as suas dívidas, os programas de ajustamento, de tão draconianos na sua austeridade, falharam.

Mas, na Europa não há um Obama, e ele aqui não manda quase nada.

É pena.

Com líderes com ideias erradas, a Europa é incompetente, e por isso fica para tráz. 

publicado por Domingos Amaral às 12:57 | link do post | comentar | ver comentários (7)
Terça-feira, 25.06.13

Zangam-se as comadres (FMI e Comissão Europeia) e descobrem-se as verdades...

As "troikas" têm os dias contados. O FMI e a Comissão Europeia já andam pegados, e há acusações mútuas e ressentimentos de parte a parte.

Embora não seja fácil o divórcio imediato, há pelo menos uma separação clara, e a "troika" já vive, por assim dizer, em casas separadas.

O que levou a zanga tão profunda? O reconhecimento da verdade, pela parte do FMI, e a continuação em "estado de negação", por parte da Comissão Europeia. Uns já admitem os erros, outros continuam cegos pelo seu próprio fanatismo.

Na semana passada, o FMI tornou público um documento onde diz, preto no branco, que a acção das "troikas" na Grécia, Portugal, Irlanda e Chipre foi um terrível falhanço!

E quais são as causas desse humilhante falhanço? Em primeiro lugar, os países credores nunca reconheceram a evidência de que a dívida dos países do Sul não era pagável, e tinha de se proceder a um imediato perdão geral, com renegociação da nova dívida.

Ou seja, o FMI vem reconhecer em meados de 2013 aquilo que muitos economistas, entre os quais me incluo, tinham defendido desde pelo menos 2010!

Era evidente, para quem estivesse de boa fé e percebesse um mínimo de economia, que jamais as dívidas públicas da Grécia e da Irlanda, mas também de Portugal e Chipre, poderiam ser pagas na totalidade. Não o aceitar, logo em 2010, foi uma perda de tempo e um sacrifício inútil para essas economias.

Mas, o FMI diz mais. Diz que foi sobretudo a teimosia de certos países (leia-se Alemanha) mas também da Comissão Europeia e do BCE, dominados ambos pela linha dura dos falcões da austeridade, que impôs o princípio de que só os devedores é que ajustavam, nunca os credores!

Esse princípio é totalmente errado, pois a irresponsabilidade foi mútua. Tanto foram irresponsáveis os devedores, que pediram demasiado dinheiro emprestado; como os credores, cegos pela ganância de ganhar dinheiro fácil e que fizeram péssimas avaliações de risco.

Porém, os falcões de Merkel e do Bundesbank, bem como o BCE e o patético Oli Rehn da Comissão, não aceitaram nenhum "perdão"! Era preciso fazer sofrer os "irresponsáveis" devedores do Sul da Europa.

Nasceu aí o segundo grave erro, que o FMI agora reconhece: os programas de "ajustamento" impostos pelas "troikas" foram demasiado rápidos, demasiado bruscos, e substimaram os efeitos recessivos de tanta austeridade!

Durante três anos, muitos economistas, entre os quais me incluo, pregaram no deserto, dizendo precisamente isso. A "austeridade" à bruta que foi imposta à Grécia, à Irlanda, a Portugal, mas também um pouco por todo o resto da Europa, não traria bons resultados. 

Como está à vista de todos, foram os críticos que tiveram razão. A Europa está numa crise geral, o desemprego cresceu para valores tremendos, e nenhum dos países do Sul está hoje em melhores condições para pagar a sua dívida pública, pelo contrário, as dívidas cresceram imenso!

Infelizmente para todos nós, a lucidez e auto-crítica do FMI é tardia, e além disso parece-me que não mudará nada de essencial. A Europa continua cega e não quer admitir que errou e que é fundamental mudar de caminho.

A Europa toda? Não. Curiosamente, a Sra Merkel revelou há dias os seus planos de governo para os próximos anos. A Alemanha prepara-se para gastar 20 mil milhões de euros em "auto-estradas" e aumentar a despesa do Estado em muitos outros "subsídios"!

Viva Merkel, a dona da Europa, que obriga os outros a poderosos sacrifícios para depois poder gastar à tripa forra no seu país. Grande senhora, sem dúvida!

 

publicado por Domingos Amaral às 11:41 | link do post | comentar | ver comentários (4)
Terça-feira, 28.05.13

Os falsos mitos económicos da Europa

A Europa está infestada de mitos económicos, histórias falaciosas e fantasias grosseiras, que nos foram vendidas ao longo de duas décadas, e que a deixaram como está, em agonia e com um sombrio futuro pela frente.

E quais são esses mitos que ensombram a Europa? Aqui deixo uma pequena lista:

 

MITO 1 - As dividas dos países do Sul têm de ser pagas, custe o que custar. 

É o mais grave mito que atinge a Europa no presente, onde se mistura uma moralidade de merceeiros com a cegueira dos fanáticos.

Há uma coisa que os europeus deviam meter de vez na cabeça: os países do Sul não têm qualquer hipótese de pagar as dívidas.

Veja-se por exemplo Portugal: a dívida pública atinge 127% do PIB, e a dívida privada, de que se fala menos porque não dá jeito, atinge 340% do PIB.

Sim, leu bem, no total a dívida de Portugal quase chega aos 470% do PIB nacional! E, parecidos connosco, estão a Grécia, a Irlanda, Chipre, a Espanha, a Itália.

Estas dívidas nunca serão pagas.

Enquanto os europeus não perceberem isso, e não reestruturarem as dívidas, e mutualizarem uma grande parte delas, as economias europeias continuarão afocinhadas no desespero e no desemprego.

 

MITO 2 - As exportações vão salvar o crescimento dos países.

É outro mito fantástico, a que os países em crise se agarram, como os náufragos se agarram às bóias de salvação.

Com o consumo e o investimento privados retraídos, e com os gastos dos Estados impedidos de aumentarem, todos olham para as exportações como a salvação das pátrias!

Vã esperança, e patética fantasia. As exportações ajudam, mas não salvam. Não existem praticamente casos de países que tenham saído de recessões profundas só à custa de exportações. 

Para mais, quando quase todos os países europeus querem exportar, para onde vão eles exportar se ninguém quer importar?

 

MITO 3 -  A austeridade orçamental vai resolver o problema das dívidas.

Mais um mito muito promovido pela Europa, em especial pela Alemanha, que durante anos impôs aos outros este caminho.

Como se tem visto, a Europa inteira está em recessão, com um desemprego a crescer para níveis perigosos em muitos países, e não houve qualquer melhoria verdadeiramente significativa, nem nos déficits públicos, nem no crescimento económico, nem na capacidade de pagar dívidas.

Cinco anos depois de 2008, a Europa está cada vez mais pobre e mais paralisada.

 

MITO 4 - A inflação faz mal às economias.

Este é um mito repetido como se fosse um dogma, uma profissão de fé. Contudo, e ao contrário do que dizem os papagaios de poder, para os europeus era precisamente um pouco de inflação que dava jeito agora.

Principalmente no Norte da Europa, pois assim os salários no Norte subiriam mais do que os salários no Sul, permitindo a países como Portugal, Espanha, Grécia, Itália, Irlanda, recuperarem a "competitividade" relativa que perderam.

Mas, quem falar em inflação é queimado em auto-de-fé pela inquisição económica da Alemanha!

 

 

MITO 5 - A liberdade de movimentos de capitais é essencial para a Europa.

Outro terrível mito, que está na origem da maior parte das desgraças financeiras que assolam a Europa.

Infelizmente, foi devido à sagrada liberdade de movimentos de capitais que as economias do Sul se endividaram sem restrições.

Com os capitais a circularem pelos mercados financeiros à velocidade da luz, é impossível controlar as dívidas dos países. 

O que é necessário agora é alguma repressão financeira, que obrigue os bancos e os Estados a uma moderação, e que volte a impor restrições aos seus delírios financeiros.

Se os mercados financeiros não fossem tão livres, e tão gananciosos, talvez não estivéssemos onde estamos hoje. 

 

MITO 6 - A União Europeia não pode ser uma união de transferências dos países ricos para os países pobres

Eis a mitologia europeia em todo o seu esplendor! O mito diz que os povos do Norte não têm de "pagar", e que os povos do Sul não podem viver "à conta" dos do Norte. Pois...

Basta olhar para os Estados Unidos da América para perceber que uma união monetária não significa que vamos ser todos iguais.

Pelo contrário, haverá sempre Estados ricos e Estados pobres; tal como na Europa existirão sempre países ricos e países pobres.

E nos Estados Unidos são os Estados ricos que financiam os pobres, transferindo para lá dinheiros federais.

Se a Europa quiser sobreviver enquanto união monetária, é isso que terá de acontecer. Os países do Norte terão de transferir fundos para os do Sul, gostem ou não. Caso contrário, a união monetária não funciona.

Quem pensar o contrário continua a viver num mundo de fantasia.

 



 

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Terça-feira, 26.03.13

Chipre: como rebentar com um pequeno país

Se, há coisa de cinco anos, algum europeu tivesse dito que um dia se iriam lançar confiscos sobre os depósitos bancários de outros europeus, todos lhe teríamos chamado maluco! Mas, a verdade é que o impensável acontece todos os meses nesta Europa.

A forma como a Europa está a dar cabo de um pequeno país como Chipre é um manual cínico da brutalidade. Depois de ter deixado o país nove meses na expectativa (sim, o pedido de resgate de Chipre foi feito há nove meses!), eis que a Europa inteira se lança numa fúria castigadora contra uma pequena ilhota do Mediterrânio.

Ora tomem lá com confisco de depósitos e os accionistas e depositantes que salvem os bancos, que a Europa não vos vai salvar porque vocês são um paraíso fiscal cheio de russos mafiosos! Sim senhor, e viva a solidariedade europeia. Com amigos destes, quem é que precisa de inimigos?

Havia várias maneiras diferentes de salvar os bancos cipriotas, basta ler qualquer Financial Times ou The Economist para saber que há muitas maneiras de esfolar um coelho, mas a Europa, sempre liderada pela Alemanha, quer dar um "castigo exemplar" ao Chipre.

É este o grave problema europeu. Em vez de admitirem que estamos todos no mesmo barco (o euro), e que foi esse barco que estava mal construído e a meter água desde o primeiro dia, e que por isso era necessário remodelar o barco todo, de cima a baixo; em vez disso, certos europeus preferem o castigo para aqueles que eles elegem como prevaricadores!

A mensagem da Alemanha é sempre a mesma: vocês portaram-se mal e agora têm de pagar por isso! Foi assim com a Grécia, com a Irlanda, com Portugal, com a Espanha, com a Itália e agora também com Chipre.

Para os alemães, todos estes países e povos viveram "acima das suas possibilidades", atolaram-se em "dívidas" e agora têm de fazer "sacrifícios" para se reabilitarem! Há que penar, sofrer o castigo, para depois ressuscitar, já puro e bom!

Esta mensagem moral é de um cinismo atroz. É como se fosse o traficante de droga a dizer ao consumidor que ele agora tem de se sacrificar e muito para ficar saudável. Quem é que nos emprestou o dinheiro para nos endividarmos? Foi a Alemanha! Mas, quem oiça os alemães falar decerto pensará que eles não tiveram nada a ver com isso! 

Veja-se o caso de Chipre. A Alemanha, há um ano, decidiu que os credores privados da Grécia deviam perder dinheiro. Com isso, afundou os bancos cipriotas, que tinham imensa dívida grega. Mas, agora que é preciso ajudar os bancos de Chipre, a Alemanha faz de conta que não teve nada a ver com o assunto, e que nem foi ela que causou a falência dos bancos cipriotas. É tudo culpa do off-shore e dos russos! 

Assim se destrói a Europa, passo a passo. Aquilo que irá acontecer em Chipre nos próximos meses não vai ser bonito de se ver, mas os ricos alemães não querem saber do sofrimento dos outros povos. Desde que eles continuem ricos...

Os pequenos países da Europa que se preparem, pois o futuro vai ser muito difícil. O egoísmo alemão, a fúria moralista cega da senhora Merkel e dos seus ajudantes locais, vai destruir um a um os pequenos países.

Um dia, daqui a uns anos, a Alemanha vai olhar à sua volta e descobrir um círculo de países na miséria, carregados de ódios e ressentimentos contra os alemães. Depois queixem-se...

publicado por Domingos Amaral às 11:43 | link do post | comentar | ver comentários (8)
Segunda-feira, 18.03.13

Portugal e a Europa estão na Boca do Inferno

Qualquer dia, arriscamo-nos que o que aconteceu ontem no Chipre aconteça na Grécia, na Irlanda, em Portugal ou mesmo em Espanha ou Itália.

Qualquer dia, numa segunda-feira acordamos e a Europa e os Governos foram-nos ao bolso e tiraram-nos uma parte dos nossos depósitos, do que é nosso.

Este fim de semana, na Europa, foi atrevessada uma linha vermelha, uma linha muito perigosa, que estabele a separação entre o que é aceitável e o que é inaceitável. Este fim de semana, a Europa deu mais um passo na direção do abismo, do qual se tem aproximado todos os meses um pouco mais.

Depois de mais de uma década ter tolerado e até promovido alegremente perigosas irresponsabilides aos seus bancos, aos seus mercados financeiros e aos seus governos, a Europa, desde 2009, decidiu um caminho absurdo de austeridade e dureza, que não tem resolvido nenhuma coisa e só tem agravado a crise por todo o lado.

Na Grécia, a situação é cada vez mais dramática e assustadora. Na Irlanda, não há meios de se ver o fim do filme de terror que o colapso da banca irlandesa gerou. Em Espanha, não há sinais de melhoria. Em Itália, o sistema político está um caos. E em Portugal, vemos todos os dias à nossa frente desenrolar-se um desastre em câmara lenta. 

É isto que a Europa tem para oferecer aos seus povos? Austeridade brutal que nada resolve e, se for caso disso, confisco dos depósitos bancários das pessoas? Será que ninguém percebe que estão a ser torpedeadas as fundações das nossas sociedades modernas, que está a ser demolida todos os dias a nossa confiança nas instituições?

O que se passou no Chipre, com o confisco dos depósitos das pessoas, é um acto de "terrorismo económico" gravíssimo, praticado pelas instituições europeias! Pela primeira vez, na Europa unida que temos há muitos anos, passou-se uma linha vermelha essencial, e ninguém sabe o que pode acontecer a partir daqui. Quando é que os líderes europeus vão acordar deste sono trágico que os vitima?

Nos anos 30, há cerca de 80 anos, a Europa estava assim. Os governantes também acreditavam na "austeridade" e faziam enormes cortes na despesa, e os países afundaram numa recessão brutal que atirou para o desemprego milhões e gerou fome e perdição. O resultado, é bom que as pessoas se recordem, foi Hitler, o mais célebre e mais terrível filho da austeridade.

É isso que os políticos europeus querem? Levar os povos ao desespero, fustigando-os com austeridade, até ao ponto em que eles se revoltam e nasça uma ira incontrolável e imprevisível? Se não é parece..

Portugal e a Europa estão na Boca do Inferno. Sim, estamos à porta do Inferno, embora muitos ainda não saibam e muitos mais não o queiram admitir. Mas estamos. Daqui até ao fogo e ao ranger de dentes é só um passo... 

publicado por Domingos Amaral às 11:31 | link do post | comentar
Sexta-feira, 08.02.13

A Irlanda também já teve o seu perdão de dívida

Depois da Grécia em Dezembro, foi agora a vez da Irlanda. Hoje, foi aceite pelo Banco Central Europeu um monumental reescalonamento da dívida da Irlanda, o que na prática significa um perdão e um adiamento do pagamento de muitos milhões de euros em juros.

Mais de três anos depois da crise financeira do euro ter começado, a Europa aceitou finalmente fazer aquilo que muitos, desde 2009, diziam ser essencial: reestruturar a dívida pública dos países que estavam com excesso de dívida.

Foram precisos três anos para a lenta Sra Merkel aceitar o óbvio: a dívida da Irlanda, tal como a da Grécia e a de Portugal, e provavelmente também a de Espanha, não é pagável com austeridade, e só renegociando a dívida, e com os credores a aceitaram certas perdas e adiamentos longos de pagamentos, é que a situação se podia resolver.

Há três anos, ninguém aceitou este princípio de bom senso, e a Alemanha obrigou a programas de austeridade duríssimos, que obviamente não tornaram os países capazes de pagar as suas dívidas. Não é com milhões de desempregados que se pagam as dívidas excessivas dos países, e a austeridade desmiolada que se praticou provocou uma crise grave na Europa.

Agora, tanto a Grécia como a Irlanda já conseguiram renegociar a dívida. Só falta Portugal. Contudo, o nosso Governo parece bem mais determinado em prosseguir a austeridade fortíssima do que em renegociar a nossa dívida. Passos Coelho e Gaspar não param de falar na necessidade imperiosa de cortar 4 mil milhões de euros em despesa do Estado.

Ora, pergunto eu, porque não renegociar a dívida e baixar a fatura altíssima de juros? Se a Irlanda e a Grécia já o fizeram, porque não o faz Portugal? E, já agora, que sentido faz cortar 4 mil milhões de euros em despesas sociais quando se gastam quase 14 mil milhões nos nossos bancos? A austeridade não se aplica à banca e aos banqueiros?

publicado por Domingos Amaral às 17:45 | link do post | comentar
Quarta-feira, 16.01.13

Passou a tempestade no euro...

Como nas últimas semanas já vieram dizer Draghi, Lagarde ou Durão Barroso, a crise financeira de confiança no euro parece ultrapassada.

E como eu sempre aqui escrevi, essa crise terminaria no dia em que se dessem duas garantias. A primeira era a de que o BCE podia comprar dívida dos Estados, e a segunda era que a Grécia não saía do euro, mesmo que para isso precisasse de ver a sua dívida perdoada, ou reestruturada. 

Se a Europa tivesse feito isso logo em inícios de 2010, a grave crise do euro não teria acontecido, e se calhar Portugal nunca teria precisado de um resgate da "troika". Contudo, foram precisos três longos anos para a Europa reconhecer o óbvio. 

Só em Junho de 2012, uma primera declaração de Draghi, a dizer que "tudo faria para salvar o euro", começou a acalmar os mercados, e viram-se as primeiras descidas nas taxas de juro. A segunda vaga de descida iniciou-se em Setembro, quando o BCE aprovou a compra de dívida dos Estados (apesar da oposição da Alemanha). E a terceira vaga de descida, a que mais beneficia Portugal, deu-se logo após a decisão de reestruturar a dívida da Grécia. 

Infelizmente para todos os europeus, foram necessários 3 longos anos para convencer os alemães de que esta era a única saída, e que só assim se salvaria o euro. Durante 3 anos, a Sra Merkel e o Bundesbank resistiram a todas as mudanças, convictos que só a austeridade fiscal chegaria para resolver uma crise que era sobretudo de confiança.

Primeiro recusaram os resgates, depois recusaram os fundos de estabilização europeus, e depois ainda tentaram recusar a possibilidade do BCE intervir e a união bancária. Porém, o resto da Europa conseguiu convencê-los que a austeridade, sozinha, não resolvia nada.

Infelizmente, esta cegueira alemã obrigou alguns pequenos países, como Grécia, Portugal e Irlanda, a sofrerem muito mais do que era necessário. Só quando a crise ameaçou a Espanha, a Itália, e até um pouco a França, é que os alemães tomaram juízo e se renderam às evidências.

Os planos forçados de austeridade, impostos pelas "troikas" aos pequenos países da Europa, são filhos desta teimosia e desta cegueira germânica. Já toda a gente percebeu que foram exagerados, na profundidade e na rapidez dos ajustamentos exigidos. Geraram recessões cavadas, desemprego altíssimo, instabilidade social e política, e não foram eles que resolveram a crise do euro, mas sim o BCE.

Estes 3 anos de fúria austeritária deixaram a Europa mais enfraquecida. Como Juncker disse, na hora da despedida, a Europa foi bruta com os fracos, não resolveu o drama do desemprego e foi pouco solidária.

Além disso, a crise geral do euro pode ter chegado ao fim, mas a crise específica desses países não chegou. Na Grécia, na Irlanda, em Espanha, em Portugal, continua um sofrimento desnecessário. Até quando?

Até quando demorarão os poderosos da Europa a perceber que, para resolver uma crise financeira que podia ter sido resolvida facilmente pelo BCE, geraram crises económicas prolongadas que não sabem como resolver?

Em Portugal, no meio da recessão, o Governo quer cortar mais 4 mil milhões de euros de despesa, cerca de 2,5 por cento do PIB. Pior precipício orçamental não há. Até quando esta gente continuará cega? Será que é com 1 milhão de desempregados que se pagam as dívidas do país? 

publicado por Domingos Amaral às 15:34 | link do post | comentar | ver comentários (1)
 

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