Europa: a armadilha da dívida e da deflação
Ontem, o sr. Mario Draghi, governador do Banco Central Europeu, admitiu pela primeira vez que a Europa pode estar confrontada com um novo e grave problema, a deflação!
A deflação é o oposto da inflação, é um processo continuado de descida de preços, e é tão perigosa ou mais que a inflação.
Numa deflação, as pessoas esperam que os preços desçam, e por isso não consomem, pois amanhã poderão comprar mais barato do que hoje.
Portanto, em vez de consumirem, poupam.
Assim, o crescimento económico é mais difícil, e é isso que se está a passar na zona euro, e por isso Draghi desceu as taxas de juro do BCE.
Mas, a deflação traz outro grave problema: embora os preços dos bens e dos ativos desçam, as dívidas não descem de valor, pelo contrário, há um aumento real do seu valor!
Com deflação, é muito mais difícil pagar dívidas, e é esse também o drama da zona euro, sobretudo dos países que estão muito endividados, como Portugal, Grécia, Irlanda, Espanha, Itália ou Chipre.
Porém, ninguém se deve espantar que isto esteja a acontecer.
Já nos anos 30, o economista Irving Fischer tinha escrito sobre esta situação, a chamada "armadilha da dívida e da deflação".
Nessa armadilha, quando os países caem nela, quanto mais dívida pagam, mais devem!
Os esforços para reduzir a dívida, se forem muito pronunciados, se a austeridade for muito forte, provocam recessão, e isso leva à subida da dívida em percentagem do PIB!
É o chamado "paradoxo da desalavancagem": quando todos cortam as despesas ao mesmo tempo, isso gera uma tal contração, que todos ficam pior no fim, ainda com mais dívida.
Ao mesmo tempo, a deflação faz com que as pessoas poupem mais, e nasce o segundo paradoxo, o "paradoxo da poupança"!
Supostamente, é boa ideia poupar, ainda por cima em tempos difíceis como os que atravessamos. Contudo, se toda a gente poupar ao mesmo tempo, consome-se menos e a economia encolhe.
Lembram-se de Passos Coelho ter dito recentemente que os portugueses "tinham poupado demais"?
Pois é, tanto os assustaram, e tanto lhes cortaram o rendimento disponível, que eles se assustaram e pouparam muito, o que retraiu ainda mais a nossa economia!
São esses mecanismos que geram o sarilho em que a Europa está hoje metida.
A cruzada austeritária liderada pela Sra Merkel deu nisto: uma Europa sem crescimento económico, cheia de desempregados, e confrontada com o drama da deflação!
As fúrias contra a despesa do Estado, os ajustamentos austeritários, os programas das "troikas", conduziram a Europa a este terrível cenário.
E, pelo meio, os únicos que estão bem são os alemães, que batem recordes de excedentes comerciais, enquanto os outros se afundam em déficits.
O caminho da austeridade está a dar cabo da Europa, de Portugal e de vários outros países, e mais tarde ou mais cedo vai gerar-se um abismo entre os alemães e todos os outros.
Ou as políticas europeias mudam, e se volta a apostar no crescimento e na despesa dos Estados, ou todo o edifíico do euro e da união monetária ficará em risco, e a divisão entre um Norte rico e um Sul pobre vai provocar um cisma poderoso!