Sexta-feira, 01.11.13

Tem toda a razão, Dr. Álvaro Santos Pereira, é pena é que...

Álvaro Santos Pereira, ex-ministro da Economia de Passos Coelho, abriu ontem a alma.

Liberto das amarras do poder, disse finalmente o que pensa sobre o que se passa em Portugal e na Europa.

Para ele, não há qualquer hipótese de assim se pagar a dívida pública nacional. A única forma de o fazer é reescalonar a dívida, pagando a 40 ou 50 anos.

Para ele, a austeridade cega está a destruir as economias, as sociedades e até as democracias, e se continuar, pode gerar ditaduras em certos países.

Para ele, é terrível quando os ministros das Finanças mandam na Europa, sem dar espaço aos outros.

Para ele, Portugal não voltará ao crescimento económico se não for feita uma enorme descida da carga fiscal.

Devo dizer que sempre gostei de Álvaro Santos Pereira, e ainda gosto mais de o ouvir dizer isto tudo, quase tudo coisas que aqui venho defendendo, ou pelo menos soluções semelhantes, no mesmo sentido das dele.

Nem sempre estive de acordo com certas soluções do Ministro, como por exemplo no corte nos feriados, que como hoje se vê não altera rigorosamente nada à produtividade dos portugueses. 

No entanto, sempre senti em Santos Pereira um enorme desconforto, nem sempre verbalizado, com a solução que a Europa impôs à bruta, e que Passos Coelho quis cumprir na íntegra, ou até mais além.

É pois reconfortante ouvir Santos Pereira reconhecer a realidade e as suas convicções.

De facto, a dívida pública nacional não se paga com autoridade e exportações, só se paga se for reestruturada, reescalonada ou mutualizada pela Europa.

Não há outra solução, e só os teimosos, os estúpidos e os mal intencionados não o admitem.

E é evidente para todos que a austeridade está a destruir certas economias, e está a levar ao crescimento dos populismos de direita ou de esquerda, pondo em risco as democracias. Só não vê quem não quer ver.

Também estou de acordo com ele quando diz que, se os ministros das Finanças mandam na Europa, a coisa fica feia.

Schauble e os seus acólitos são demasiado obtusos e tortos para perceberem o que está em causa, e tem sido trágico que só eles comandem o destino da Europa, ajudados por uns metecos sem ideias, como Barroso, Merkel e outros.

A minha grande pena é que pessoas inteligentes, como Santos Pereira, não sejam capazes de mudar o poder por dentro, e só falem quando já não estão em posições de poder.

Antes de Santos Pereira, tinha sido Juncker, o luxemburguês, a dizer coisas semelhantes.

Mas, a verdade é que o poder está na mão do Império do Mal, dos Darth Vader da austeridade.

São eles que mandam, e enquanto isso acontecer, a Europa não vai mudar. 

publicado por Domingos Amaral às 16:06 | link do post | comentar | ver comentários (3)
Quinta-feira, 31.10.13

Portas e Passos: alguém percebe alguma coisa do que eles querem?

Nos últimos dias, temos assistido a um verdadeiro espectáculo de comunicação política!

Num dia, Paulo Portas declara, com pompa, que o Estado deve ser reformado!

Os impostos, o IRS, por exemplo, deverá descer, e para isso será nomeada uma comissão, para propor medidas para 2015, se isso for possível, é claro.

A segurança social, deverá ter plafonds, coisas fofinhas onde todos teremos a reforma garantida, e menos contribuições para pagar.

Os funcionários públicos, esses deverão ou ser despedidos, ou então ser aumentados, quando forem génios de qualidade.

A despesa geral do Estado, onde for possível, deverá diminuir, mas a qualidade dos serviços deverá aumentar, com mais investimento.

Por fim, escolas e hospitais e muitos serviços que tenham qualidade, poderão ser privatizados, ou dados em concessão.

Atenção, tudo isto se passará no futuro, num local mítico e fantástico, onde o "milagre económico" que já existe na cabeça do Dr. Pires de Lima nos conduzirá em breve.

Em que ano será esse futuro, perguntam os portugueses?

Bem, ninguém sabe. O Dr. Paulo Portas acredita que será no ano 2%, um ano qualquer daqui para a frente, em que a economia cresça 2%.

Ou seja, o nosso maravilhoso futuro colectivo depende do crescimento económico.

E o crescimento económico depende de quê? Isso o Dr. Paulo Portas não sabe, ou não diz.

Porém, no dia seguinte, o Dr. Passos Coelho apresenta o orçamento, e diz que, no presente, as coisas são diferentes do futuro do Dr. Paulo Portas.

No presente, haverá o oposto do que haverá no El Dorado do futuro.

No presente, alguns impostos sobem, o IRS não mexe, as pensões descem, os salários dos funcionários públicos levam fortes cortes, e não há qualquer plafond fofinho onde assentar as nossas reformas. 

Ah, e no presente, já me esquecia, é possível que muitos dos funcionários públicos que no futuro seriam considerados génios e aumentados pelo Dr. Portas, sejam no presente, ou no próximo ano, despedidos ou convidados a sair pelo Dr. Passos.

É este o país que nós temos, um país onde os economistas que têm dúvidas são "masoquistas", nas palavras do Dr. Cavaco; onde há um "milagre económico" a acontecer à frente dos nossos olhos, nas palavras do Dr. Pires de Lima, e onde o Dr. Portas vive num futuro radioso, e o Dr. Passos obriga milhões a apertar ainda mais o cinto, para que ele não falhe, o que como se sabe, é o mesmo que o país falhar.

A mim, estas coisas lembram-me o que o Obelix sempre comentava: "estes romanos são doidos!"

E depois ainda dizem que era o Eng. Sócrates que andava sempre a confabular e a tentar iludir-nos com as suas verdades...

publicado por Domingos Amaral às 15:18 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Sexta-feira, 25.10.13

O mistério da importância de Sócrates

Para mim, é um mistério.

Não consigo perceber porque é que ainda se dá tanta importância a José Sócrates.

Porque é que os comentadores se preocupam com o que ele diz, agora que ele é mais um comentador entre tantos.

Porque é que certos jornais continuam a fazer enormes títulos sobre os supostos "casos" da vida dele.

Porque é que o primeiro-ministro se vê obrigado a desmentir uma coisa que ele disse.

Porque é que outros políticos falam dele.

Porque é que tanta gente lhe continua a destilar ódio.

Porque é que pessoas sensatas, como Eduardo Catroga, continuam a dizer que ele devia ser "julgado".

Não consigo perceber.

Sócrates é talvez o político português que desperta mais ódios, mas já não me parece que desperte grandes paixões.

Porque é que dão tanta importância ao que ele diz?

Pela minha parte, nunca acreditei que ele fosse a única razão de todos os nossos males, e o que ele diz já pouco me interessa.

É apenas mais um "talking head" a esforçar-se para ser ouvido.

Neste mundo extremanente competitivo pela atenção, há cada vez mais palavrões, insultos, barbaridades e excessos ditos, quase todos os dias, na televisão ou nos jornais.

Por mera higiene mental, evito dar grande importância a essa avalanche de palavreado de pessoas que estão todas cheias de razão.

Portanto, não lhe ligo grande coisa.

Nem a ele, nem aos outros.

São apenas cabeças falantes que não mandam nada...

publicado por Domingos Amaral às 15:51 | link do post | comentar | ver comentários (2)
Quinta-feira, 24.10.13

Portugal e a recessão em W

Os economistas gostam muito de usar as letras do abecedário para classificar as recessões.

Há a recessão em V, com uma queda que é muito profunda, uma estadia curta no fundo, e uma recuperação tão rápida como a queda.

Há a recessão em L, onde há uma queda inicial muito profunda, e depois não há qualquer tipo de recuperação, apenas um prolongamento do fundo.

E depois há a recessão em W, que são duas recessões, dois V seguidos, onde por vezes a zona central do W é menos cavada.

Nesse caso, há uma primeira queda violenta, descendo pelo primeiro V, depois chegamos a uma zona de recuperação, que é mais pequena que a descida.

De seguida, a meio do W, há uma segunda descida para o fundo, que pode ser menos forte que a primeira

Só depois se volta a recuperar fortemente, subindo pelo segundo V acima.

Será isso que irá acontecer em Portugal, uma recessão em W?

Olhando para o que foram os dois últimos anos, podemos admitir que em 2012, com um corte na despesa pública, os efeitos recessivos foram fortes, e caímos pelo primeiro V abaixo.

Depois, em 2013, houve o aumento enorme de impostos, mas a recessão foi bem menos forte.

Não sendo ainda uma subida, foi uma melhoria ligeira, uma subidinha a meio do W.

Contudo, para 2014, o orçamento prevê brutais cortes na despesa e por isso arriscamo-nos a nova recessão.

É muito possível uma nova queda, embora menos grave que a primeira, e que vamos parar a um ponto recessivo semelhante ao acontecido em 2012.

Segue-se depois um crescimento rápido, subindo o segundo V depressa?

É cedo para fazer esse tipo de previsões.

Como diz toda a gente, incluindo Passos Coelho, há muitos "riscos".

Mais do que riscos, ou além deles, há um evidente dilema português.

O que é melhor: tentar corrigir o déficit do Estado, aumentando a recessão?

Ou tentar evitar a recessão, deixando o déficit ser maior do que a troika pede?

Eu pela minha parte, prefiro a segunda opção; mas a Europa e o Governo, é evidente, preferem a primeira.

publicado por Domingos Amaral às 16:34 | link do post | comentar | ver comentários (2)
Quarta-feira, 16.10.13

Desta vez, Portas e Passos estão nisto juntos, e enterrados até ao pescoço!

Desta vez, com o Orçamento para 2014, não há divisões na coligação.

Não há PSD para um lado, e CDS para o outro.

Desta vez, não há linhas "vermelhas", ou "se me perguntarem se eu concordei eu digo que não concordei".

Desta vez, não há Vítor Gaspar acima de Portas, como número 2 do Governo, uma coisa humilhante que causava mal estar.

Desta vez, não há nada disso.

Com a remodelação, Portas passou a número 2 e a todo poderoso da economia, e até negoceia com a troika.

E Pires de Lima, que fora do Governo era um crítico, dentro é apenas mais um dos seguidores.

Desta vez, Portas e Passos são uma entidade única, há um Governo unido, para o bem e para o mal. 

A margem de liberdade, ambígua mas inteligente, que Portas adquirira ao longo de dois anos, esfumou-se.

Portanto, o que devemos concluir é que este orçamento de 2014 é o primeiro em que há uma genuína união entre PSD e CDS, e que ambos o apoiam sem qualquer reserva.

E isso é que é estranho, pois este pode vir a ser o mais duro orçamento deste Governo.

Além disso, é um orçamento que demonstra, mais do que qualquer outro até agora, que o Governo não só não aprendeu com os erros, como entre a crença e a eficácia, escolhe sempre a crença.

Em primeiro lugar, o Governo devia aprender com os erros, económicos e constitucionais.

Em 2012, houve cortes profundos na despesa, quebra de salários e retirada de subsídios aos funcionários públicos.

Qual foi o resultado? Uma recessão muito profunda, muito desemprego, e muita perda de receita fiscal.

Além disso, o Tribunal Constitucional vetou a repetição dessas medidas em 2013.

Assim, o Governo mudou a estratégia, e para 2013 aumentou os impostos, sobretudo o IRS.

O que se verificou? A recessão foi bem menos grave que em 2012, e há claros "sinais positivos" de recuperação.

O que é que as pessoas inteligentes deviam deduzir destes resultados? Que a economia se adapta melhor à subida de impostos do que ao corte na despesa!

É essa a lição dos últimos 2 anos: cortar na despesa causa mais recessão do que subir os impostos!

E, ainda por cima, subir os impostos tem a vantagem de não ser uma estratégia inconstitucional!

Mas, aprendeu o Governo essa lição?

Nada disso. Para 2014 o Governo vai voltar a apostar num violentíssimo corte de despesa, repetindo o erro de 2012.

E, também no plano constitucional, faz novo braço de ferro com o TC, que já no passado por várias vezes avisou que os cortes salariais deviam ser transitórios...

Porque é que o Governo faz isto? Porque é que não aprende com os erros?

A única explicação para a persistência nesta estratégia de "corte brutal na despesa" não pode ser a "troika", pois a "troika" já permitiu várias soluções diferentes, desde 2011 até agora.

O que a "troika" impõe são as metas, não os caminhos para lá se chegar, esses foram variando, ano após ano.

A explicação é outra: é uma questão de crença fortíssima, quase de fé.

Há uma crença profunda entranhada no centro-direita português, tanto no PSD como no CDS.

Para a maioria das pessoas de direita, há uma trindade dogmática de crenças:

1- O peso do Estado tem de ser diminuído

2- Cortar na despesa é essencial

3- Qualquer subida de impostos é terrível.

Quando se acredita nisto como quem acredita na Santíssima Trindade, em Deus Pai, Filho e Espírito Santo, as pessoas perdem alguma lucidez para ver a realidade que está à frente dos seus olhos.

O centro direita português quer transformar essa crença em realidade, sem ter percebido uma coisa essencial, que há muitas décadas muitos economistas perceberam: quando se está numa recessão, o comportamento das pessoas é diferente, e as soluções não funcionam da mesma maneira.

A "economia da recessão" é diferente da "economia da expansão" ou da "economia da estabilidade".

Soluções que funcionam num momento, são desastrosas noutro momento.

Por isso, as pessoas deviam deixar as suas crenças de lado, e tentar a melhor solução.

A economia não é uma questão de fé, mas sim de eficácia.

Portanto, se tudo falhar, como pode falhar, Portas e Passos desta vez vão morrer juntos, atrelados à sua crença quase religiosa que este é o único caminho.

Não é, mas tal como na religião, também na economia o fanatismo das crenças costuma cegar as pessoas.

publicado por Domingos Amaral às 12:37 | link do post | comentar | ver comentários (4)
Terça-feira, 08.10.13

Embora lá dar uma ajudinha a Passos Coelho!

O primeiro-ministro, num raro momento de humildade, pediu ajuda aos economistas e aos comentadores públicos!

E esse raro pedido de ajuda é para quê?

Para ajudaram o Governo na difícil tarefa de explicar a necessidade de mais uma dose cavalar de austeridade, e ao mesmo tempo impedir que os portugueses embandeirem em arco com os "sinais positivos" da economia, e ganhem expectativas infundadas!

Genial, não é?

É difícil encontrar melhor ideia nos últimos duzentos anos de História de Portugal! 

Eis como deve ter nascido esta brilhante ideia de pedir ajuda aos comentadores e economistas.

A conversa é entre Passos e os seus luminosos acessores e conselheiros:

- Rapaziada, como é que vamos explicar esta nova austeridade?

- Pois...

- Alguém tem alguma ideia?

- Mas, senhor primeiro-ministro, não havia "sinais positivos"?

- Havia, e há. Poucos mas há.

- Então, o país melhorou, não melhorou?

- Sim, melhorou.

- Então como é que o senhor primeiro-ministro explica mais austeridade?

- Pois. É esse o problema, para isso é que estamos aqui... 

- Porque a troika manda? 

- Isso é chato, parece que eu não mando nada...

- Porque é preciso?

- Exacto!

- Mas, não é um bocado contraditório?

- Com aquilo do "estava tudo a melhorar"?

- Sim...

- E qual é o problema?

- Pois...

- Que tal dizer que está tudo melhor, mas não chega, é preciso piorar outra vez?

- E isso não vai dar cabo da recuperação?

- Sim, talvez, não sei bem, ninguém sabe...

- Que maçada!

- Isto de ser primeiro-ministro, é tramado...

- Talvez seja melhor chamar o Camilo Lourenço, ou o Gomes Ferreira, o outro qualquer, para explicar ao povo que tem de continuar a sofrer.

- Ah...Acham que os outros conseguem explicar melhor que eu?

- Não sei, mas pelo menos o povo deve acreditar mais neles. 

- ...

- E que tal pedir ajuda ao Dr. Fernando Ulrich? Ele é muito contundente!

- Óptima ideia, falem-lhe!

- E ao Dr. Marques Mendes?

- Esse é melhor a dar más notícias. É o melhor jornalista da actualidade, tem óptimas fontes, falo com ele todas as sextas. 

- Ah...pois...

- E economistas, quem é que se arranja?

- Isso, neste momento, é difícil. Muitos são masoquistas, como diz o senhor presidente. 

- E o Miguel Beleza? Está um bocado gordo, mas acho que tenho o telefone dele por aí...

- Não sei. Que tal lançar um pedido de ajuda público?

- Uma linha telefónica?

- Sim, tipo "Entenda o Governo", a funcionar 24 horas por dia. Só com comentadores a explicar o que aí vem!

- Isso nem era mal pensado, dá para fazer? 

- Dá, mas custa dinheiro.

- Ok, então eu faço um discurso, e peço-lhes ajuda, vamos ver se eles me ouvem...

publicado por Domingos Amaral às 16:10 | link do post | comentar | ver comentários (6)
Sexta-feira, 04.10.13

A economia está melhor, mas ninguém vai sentir muito...

Ontem, a "troika" aprovou as suas avaliações a Portugal, e o Governo confirmou que as medidas austeras são para manter em 2014.

No entanto, Passos, Portas e a "troika", todos nos dizem que a economia "está melhor", e que 2014 será "melhor" que 2013.

É provável que assim seja, mas no seu quotidiano a maior parte dos portugueses não irá sentir muito essas melhorias.

O desemprego pode descer umas décimas, mas os impostos continuarão altos, as pensões sofrerão cortes, bem como os salários dos funcionários públicos.

O crédito também não aliviará muito, nem para as empresas, nem para os particulares.

Tal como durante tantos anos no passado, parece haver uma disfunção clara entre uma entidade abstrata chamada Portugal, e a vida real dos portugueses.

Durante quase uma década, entre 2002 e o presente, os números económicos e financeiros de "Portugal" nunca foram brilhantes.

O crescimento foi fraco, com poucas excepções; o déficit esteve sempre alto, fora dos limites de Maastricht; o déficit comercial foi-se agravando sempre, porque havia muito mais importações do que exportações; os impostos foram sempre subindo; etc, etc.

No entanto, como havia crédito fácil e todos se endividavam (Estado, empresas e pessoas), havia sempre muito dinheiro disponível, e este "efeito riqueza" dava a ilusão a todos que se vivia cada vez melhor.

E, de facto, era verdade. Os portugueses viveram bem, mesmo que os números de Portugal fossem medíocres.

Agora, no presente, e depois de uma violentíssima crise financeira e económica, o que ouvimos é o oposto.

Os números de Portugal começam a melhorar. Há mais crescimento, menos déficit, ligeiramente menos desemprego.

Porém, os portugueses sentem-se muito pior, e todos se habituaram a viver com muito menos dinheiro do que antes.

É estranho, mas os portugueses não parecem ser os habitantes dessa entidade mítica chamada Portugal.

Há entre eles e Portugal um desfasamento permanente, como se não conseguissem acertar com o passo um do outro numa dança.

Quando Portugal parecia anémico, os portugueses dançavam vertiginosamente.

Quando Portugal parece arrebitar, os portugueses estão macambúzios e deprimidos...

Será que algum dia o passo desta valsa acerta? 

publicado por Domingos Amaral às 11:31 | link do post | comentar | ver comentários (3)
Segunda-feira, 30.09.13

A vitória das esquerdas e a armadilha de Passos Coelho

Ontem, aconteceu o que muitos esperavam. As esquerdas voltaram a crescer, o PSD foi derrotado fortemente, e o CDS aguentou-se bem.

As esquerdas, do PS e da CDU, são quem pode cantar vitória, e pelos vistos a Grândola que se foi ouvindo no último ano, um pouco por todo o país, era um indicador que a CDU estava a renascer.

Se há alguém que pode cantar vitória, são os comunistas, ganharam muitas câmaras e ganharam bem, embora em Lisboa tenham descido.

Também o PS e Seguro são vencedores, muitas câmaras ganhas, maior partido autárquico, essas coisas.

O CDS aguentou-se, fez o "penta" de câmaras, e quem esperava ver Portas como um derrotado, enganou-se redondamente.

A tal crise "Portas", que tanta gente dizia que o iria penalizar, não passou de um mito.

Portas resiste, e até vence no Porto. 

Quanto ao PSD, só não foi uma hecatombe pior porque o PS perdeu câmaras para a CDU, caso contrário teria sido uma catástrofe para Passos.

No entanto, ele é cada vez mais um líder preso nas próprias armadilhas que criou, para si e para o país. 

Há pouco mais de dois anos, Passos vencera as eleições, derrotando Sócrates, e vinha cheio de confiança que ia construir um país novo, liberal e eficiente.

Disse, com convição, que iria para além da "troika", no seu programa de Governo.

Pelos vistos, a cegueira era total.

Passos nunca chegou a perceber o sarilho em se meteu, pois governar nestas condições seria sempre terrível, uma vez que o país iria ser obrigado a brutais sacrifícios por uma Europa de fanáticos da austeridade.

Dois anos e alguns meses depois, o resultado está à vista.

Passos gerou uma brutal crise económica, com um desemprego altíssimo e uma recessão fortísissima, os alimentos para o crescimento das esquerdas e sobretudo da CDU.

Além disso, alienou durante dois anos o PS, ignorando-o e hostilizando-o.

Pelos vistos, quem ganhou com isso foi Seguro, que todos subestimavam, mas está cada vez mais líder do PS.

No meio desta trapalhada toda, Passos desprezou também o CDS de Portas, não o ouvindo, não o amansando, o que levou Portas a deitar a toalha ao chão em Julho.

Os bem pensantes quiseram dar cabo dele, mas o que diz o povo? Portas cresce, é o que diz o povo, ouviram?

Portanto, temos hoje um primeiro-ministro cada vez mais pequenino e frágil.

Passos está na armadilha que criou a si próprio. 

A sua estratégia política, de afrontamento permanente, falhou; e a sua estratégia financeira de austeridade, também falhou.

Resta apenas saber se o falhanço será brutal, com a necessidade de um segundo resgate, ou será menos mau, com o tal programa cautelar.

Isto tinha se ser assim, não havia outro caminho a não ser a austeridade e o afrontamento?

Claro que havia, mas Passos quis ser "liberal" e "firme", e acabou assim, cada vez mais frágil, cada vez mais pequeno, cada vez mais solitário.

E o país, como se safa desta?

Ninguém tem certezas. Ainda há uma pequena margem para evitar o segundo resgate, mas ontem ficou ainda mais estreita.

Como sempre aqui escrevi, a brutal austeridade iria colocar o país numa terrível armadilha, a armadilha da dívida, donde não se consegue sair, e onde há crises e ranger de dentes permanentes.

Esta crise é mais uma, e mais haverão nos próximos tempos...

publicado por Domingos Amaral às 10:32 | link do post | comentar | ver comentários (2)
Segunda-feira, 23.09.13

Portugal, Merkel, e a nossa armadilha da dívida

Portugal está na típica "armadilha da dívida".

Se cortar na despesa para fechar o deficit, causa recessão e desemprego, e a dívida pode aumentar porque o PIB cai.

Se estimular a economia, com descidas de impostos, agrava o deficit e a dívida pode aumentar.

Ou seja, façamos o que fizermos, há sempre algum objectivo que falha.

Ou falha o deficit, ou falha o crescimento, ou falha a dívida.

É a "armadilha da dívida" em todo o seu esplendor. Quanto mais pagamos, mais devemos.

Como sair deste imbróglio?

A "austeridade", tão do agrado de Passos, Gaspar ou Merkel, causou muitos danos, com um desemprego altíssimo e várias crises políticas.

Com isso, ganhou-se alguma credibilidade, mas não se alterou a marcha imparável do crescimento da dívida.

Agora, veio um pouco de crescimento económico, com mais turismo e exportações, mas também isso não impede os juros de subirem.

Há um preconceito contra Portugal, como disse ontem Passos Coelho?

O problema é mais profundo do que esse, infelizmente.

Ao contrário do que muitos têm dito nos últimos anos, dentro do euro não há uma solução nacional para a questão das "dívidas soberanas".

Nem Portugal, nem a Grécia, nem o Chipre, nem a Irlanda, têm capacidade para pagar sozinhos a monumental dívida que contraíram.

Estão presos numa armadilha: emitiram dívida numa moeda que não controlam, e a desconfiança que sobre eles paira é permanente.

Sozinhos, jamais sairão desta prisão.

Desenganem-se os que pensam que a austeridade, as reformas estrurais, ou as exportações vão permitir o crescimento necessário para pagar estas dívidas. Não vão.

Um segundo resgate, ou um programa cautelar, podem ser diferentes do ponto de vista político, mas não são muito diferentes do financeiro.

É mais dinheiro emprestado, com muitas condições, seja pela "troika", seja pelo BCE.

E não nos tira da armadilha.

A única solução é europeia.

Só a Europa, com os seus recursos, e a sua força política, poderá solucionar definitivamente a questão.

Mutualizar a dívida é absorver a dívida dos prevaricadores; mas também é impedir que esses países, no futuro, se endividem mais.

Porém, não parece ser esse o caminho da Sra. Merkel.

A sua vitória de ontem foi retumbante, e histórica. Mas, não chega para governar sozinha.

Mudará Merkel, aliada ao SPD ou aos Verdes; tornando-se mais europeia e menos alemã?

Ou continuará a insistir numa receita que causa muitos danos e não resolve o problema da dívida?

Portugal está no topo da preocupações de Merkel, diz hoje o Wall Street Journal, e pode despoletar mais uma crise do euro.

É tudo verdade, mas Merkel, se quisesse, podia caminhar noutro sentido, menos duro e punitivo.

As soluções nacionais, de sacrifício e "troikas", estão esgotadas.

Não há soluções solitárias, só de conjunto. 

Talvez Passos tenha mesmo de ir lá falar com ela, pedir-lhe compreensão e ajuda. Mas só isso, é insuficiente.

Mais Europa, é o que é preciso.

Caso contrário, irá prolongar-se este ciclo de agonias, com pequenos interlúdios de alívio, como foi este Verão. 



 

publicado por Domingos Amaral às 10:03 | link do post | comentar | ver comentários (2)
Terça-feira, 17.09.13

Portas é muito mais hábil do que Passos Coelho

Ontem, e pela primeira vez em mais de dois anos, a reunião do Governo com os parceiros sociais correu bem.

No final, com a excepção da CGTP, todos os parceiros sociais alhinharam a uma só voz com o Governo.

UGT, patrões, confederações, num consenso raro, pediram o mesmo que o Governo: a troika deve aceitar um deficit maior para 2014.

A isto chama-se "consenso nacional", e foi isto que muita gente criticou o Governo por não fazer.

Nem Passos, nem Gaspar, nem o pobre Santos Pereira, conseguiram gerar esses consensos, e foram criticados por isso.

Ora, logo na primeira reunião a que presidiu, já com as suas novas funções depois da remodelação de Julho, Paulo Portas conseguiu "o consenso" de forma natural.

E conseguiu-o porque trabalhou para isso acontecer.

Para chegar a um "consenso" é preciso trabalho, cedências, paciência. 

O "consenso nacional" não nasce de geração espontânea, como as ervas ou o sol todos os dias. Dá muito trabalho chegar a um consenso, e é por isso que ele é sempre tão raro e valioso.

Mas, há uma coisa que eu sei: é que para chegar a um consenso não se pode ficar na nossa trincheira ideológica, não se pode ser radical nas posições.

Infelizmente, foi isso que o Governo de Passos e Gaspar sempre foi, radical e inflexível. O resultado foi péssimo, para todos.

Paulo Portas, está visto, tem uma habilidade diferente. 

Não está tão preocupado com ideologia radical liberal, nem com princípios vagos e modelos de Excel. Sabe que, para uma política ser aceite pelas populações, é necessária a participação dos parceiros sociais, o seu envolvimento nas decisões.

E, para isso, contrói unidade, em vez de semear discórdia. 

Como eu sempre aqui disse, Portas pagou um preço alto por ter dado um murro na mesa, mas no fim ganhou, e tem hoje mais poder para influenciar a governação do país.

Pelo que já podemos ver, Portugal só ficou a ganhar com isso.

Pelo menos consenso económico e social já voltámos a ter, e isso a Portas se deve.

publicado por Domingos Amaral às 11:19 | link do post | comentar | ver comentários (4)
 

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