A vitória das esquerdas e a armadilha de Passos Coelho
Ontem, aconteceu o que muitos esperavam. As esquerdas voltaram a crescer, o PSD foi derrotado fortemente, e o CDS aguentou-se bem.
As esquerdas, do PS e da CDU, são quem pode cantar vitória, e pelos vistos a Grândola que se foi ouvindo no último ano, um pouco por todo o país, era um indicador que a CDU estava a renascer.
Se há alguém que pode cantar vitória, são os comunistas, ganharam muitas câmaras e ganharam bem, embora em Lisboa tenham descido.
Também o PS e Seguro são vencedores, muitas câmaras ganhas, maior partido autárquico, essas coisas.
O CDS aguentou-se, fez o "penta" de câmaras, e quem esperava ver Portas como um derrotado, enganou-se redondamente.
A tal crise "Portas", que tanta gente dizia que o iria penalizar, não passou de um mito.
Portas resiste, e até vence no Porto.
Quanto ao PSD, só não foi uma hecatombe pior porque o PS perdeu câmaras para a CDU, caso contrário teria sido uma catástrofe para Passos.
No entanto, ele é cada vez mais um líder preso nas próprias armadilhas que criou, para si e para o país.
Há pouco mais de dois anos, Passos vencera as eleições, derrotando Sócrates, e vinha cheio de confiança que ia construir um país novo, liberal e eficiente.
Disse, com convição, que iria para além da "troika", no seu programa de Governo.
Pelos vistos, a cegueira era total.
Passos nunca chegou a perceber o sarilho em se meteu, pois governar nestas condições seria sempre terrível, uma vez que o país iria ser obrigado a brutais sacrifícios por uma Europa de fanáticos da austeridade.
Dois anos e alguns meses depois, o resultado está à vista.
Passos gerou uma brutal crise económica, com um desemprego altíssimo e uma recessão fortísissima, os alimentos para o crescimento das esquerdas e sobretudo da CDU.
Além disso, alienou durante dois anos o PS, ignorando-o e hostilizando-o.
Pelos vistos, quem ganhou com isso foi Seguro, que todos subestimavam, mas está cada vez mais líder do PS.
No meio desta trapalhada toda, Passos desprezou também o CDS de Portas, não o ouvindo, não o amansando, o que levou Portas a deitar a toalha ao chão em Julho.
Os bem pensantes quiseram dar cabo dele, mas o que diz o povo? Portas cresce, é o que diz o povo, ouviram?
Portanto, temos hoje um primeiro-ministro cada vez mais pequenino e frágil.
Passos está na armadilha que criou a si próprio.
A sua estratégia política, de afrontamento permanente, falhou; e a sua estratégia financeira de austeridade, também falhou.
Resta apenas saber se o falhanço será brutal, com a necessidade de um segundo resgate, ou será menos mau, com o tal programa cautelar.
Isto tinha se ser assim, não havia outro caminho a não ser a austeridade e o afrontamento?
Claro que havia, mas Passos quis ser "liberal" e "firme", e acabou assim, cada vez mais frágil, cada vez mais pequeno, cada vez mais solitário.
E o país, como se safa desta?
Ninguém tem certezas. Ainda há uma pequena margem para evitar o segundo resgate, mas ontem ficou ainda mais estreita.
Como sempre aqui escrevi, a brutal austeridade iria colocar o país numa terrível armadilha, a armadilha da dívida, donde não se consegue sair, e onde há crises e ranger de dentes permanentes.
Esta crise é mais uma, e mais haverão nos próximos tempos...