As estatísticas são como os biquinis, mostram muito, mas não mostram tudo...
Nas últimas semanas, várias têm sido as estatísticas positivas divulgadas sobre a economia portuguesa.
O PIB cresceu, sobretudo no último trimestre de 2013.
O desemprego diminuiu, tendência que se notou ao longo do segundo semestre do ano passado.
A receita fiscal subiu muito, em especial a do IRS e do IRC, embora a do IVA tenha crescido pouco.
O deficit vai ficar abaixo dos 5,5% do PIB, combinados com a troika, o que revela capacidade de contenção e cumprimento de objectivos.
As exportações continuam a subir, embora as importações tenham também subido um pouco.
Este somatório de estatísticas positivas não deve ser ignorado, mas também é preciso perceber um pouco melhor porque isto acontece, e qual o verdadeiro impacto na vida dos portugueses.
As estatísticas são como os biquinis, mostram muito, mas não mostram tudo...
É verdade que o PIB cresceu, e isso é bom, mas o crescimento é ainda muito pequeno, frágil e há dúvidas se está bem sustentado.
Crescemos porque houve mais turismo, mais exportações, mais consumo, mas não porque tenha existido mais investimento durante 2013.
O modelo económico português continua o mesmo, e se os estrangeiros não puxarem por nós, é sempre difícil crescer.
Além disso, os cortes orçamentais previstos para 2014, como avisou ontem a Universidade Católica, vão travar o crescimento e podem mesmo contraí-lo.
É evidente que a queda do desemprego é o número mais relevante, pela importância social e indivdual que tem, mas há dúvidas sobre se ele cai porque há mais emigração, ou se há mesmo mais emprego a ser criado.
De qualquer forma, uma taxa de desemprego nos 15% é ainda muito alta, e muito maior do que era hábito.
O grande desafio é perceber se, daqui para o futuro, a economia portuguesa tem capacidade para absorver este desemprego, ou se vamos passar uma década com números desta dimensão, o que será sempre um drama social.
Quanto à parte fiscal, o deficit desce sobretudo porque os impostos cresceram, e isso é positivo.
Na verdade, e embora o Governo não o deseje reconhecer, a economia portuguesa adaptou-se muito melhor à subida de impostos de 2013 do que aos cortes brutais na despesa de 2012.
Como a recessão não foi tão funda, as receitas fiscais subiram, e o deficit desceu.
Porém, o governo para 2014 decidiu regressar aos cortes, e por isso é incerto qual será esse impacto em 2014.
É evidente que, com este panorama de sinais positivos, e com as taxas de juro da dívida pública em baixa, muito próximas dos 5 por cento, há condições para Portugal sair do programa de ajustamento em Maio, e até para não necessitar de um programa cautelar.
Mas, cuidado, pois até Maio ainda faltam cinco meses, e as condições económicas têm mudado muito depressa.
O BCE já avisou que a crise não acabou, que os bancos europeus têm graves problemas, e a deflação espreita ao fundo do corredor.
Estar bem em Janeiro não significa que em Maio se vai estar melhor...
Por fim, há algo que este Governo parece esquecer.
O povo não se alimenta de boas estatísticas, e embora do ponto de vista psicológico se sintam melhorias em relação ao ano anterior, os benefícios ainda não começaram a chegar ao bolso dos portugueses.
Crescimento económico nem sempre significa crescimento dos rendimentos das pessoas, sobretudo se são valores pequenos.
E há ainda muitos portugueses para quem 2014 vai ser um calvário de sacrifícios, como os funcionários públicos e os pensionistas.
Se contarmos as suas respectivas famílias, são muitos milhões de pessoas que não sentem qualquer melhoria na sua vida.
Tentar criar expectativas positivas com as estatísticas não muda o essencial: o que o biquini esconde não é, neste caso, nada bonito de se ver.