É preciso perdoar a dívida do Sporting!
Na últimas semanas, muito se tem falado da necessidade da banca "perdoar" a dívida do Sporting. O BCP, um dos bancos em causa, anunciou igualmente que vai "desistir" do negócio do futebol, supostamente porque perdeu muito dinheiro.
E o presidente do Benfica, Luís Filipe Vieira, reagiu de imediato, dizendo que isso era "concorrência desleal", e se o Sporting tivesse um "perdão de dívida", então o Benfica também devia ter.
Antes de dar uma opinião final sobre a questão concreta, convém relembrar todos que, em mais de 100 anos de futebol europeu, o habitual é os clubes de futebol, em quase todos os casos, serem um negócio que gera prejuízos e dívidas, e não lucros.
Já houve centenas de casos por essa Europa fora de clubes que viram as suas dívidas à banca "perdoadas", e muitos mais haverá no futuro. Aliás, em Portugal, também já vários clubes no passado tiveram de "reestruturar" as suas dívidas, e foram realizados vários perdões de dívidas mais ou menos encapotados.
O caso do Sporting não é pois nem único, nem original. Aos meus alunos de Economia do Desporto, é isso que irei explicar quando falar desses temas em breve. A verdade é que o futebol, todo ele, seja na Europa, seja no resto do mundo, tem uma tendência muito forte para os prejuízos, e isso só se conseguirá evitar no dia em que se criarem certas regras (o Fair Play da FIFA vai nesse sentido), e se modificarem certas práticas gerais, que afectam todos os clubes do mundo.
Sem certo tipo de medidas, como por exemplo uma restrição à subida dos salários dos jogadores (que a Premier League vai implementar em breve), será completamente impossível evitar que muitos clubes tenham prejuízos crónicos, e acabem como o Sporting, a necessitar de um perdão de dívida para poderem continuar a sua actividade.
Não vale de nada sermos contra o "perdão da dívida" do Sporting. Qual a alternativa? Aplicar "medidas de austeridade" e obrigar o clube a jogar para o 6ª lugar durante os próximos dez anos? É evidente que isso não funciona, além de ser contraproducente.
Se o Sporting cortar demasiado nas despesas, de uma forma draconiana "tipo-troika", nunca mais vai gerar receitas suficientes, e entrará numa espiral depressiva que o irá destruir num prazo curto. Não me parece que esse seja um cenário desejável, nem para o Sporting, nem para o futebol português, que perderá muitas receitas com essa situação.
É evidente que um perdão parcial da dívida é inevitável. E, o Benfica e o FC Porto que não protestem muito, pois o mais certo é também eles, daqui a algum tempo, virem a precisar de um expediente semelhante.
Segundo os seus relatórios de contas, o Benfica tem 175 milhões de dívida de curto prazo, e o FC Porto tem cerca de 90 milhões de euros de dívida bancária. É muito difícil que estes volumes de dívida sejam sustentáveis, e portanto é provável que se tenha de reestruturar essa dívida, embora de uma forma mais discreta e menos dramática do que no caso do Sporting. Mas, é provável que tenha também de existir algum perdão.
Por fim, uma palavra para o BCP. É evidente que, nestes casos, se diz sempre que a irresponsabilidade está do lado do devedor, que pediu demasiado dinheiro emprestado. No entanto, onde há um devedor irresponsável, há um credor irresponsável, e o ajustamento deve ser partilhado por ambos. O Sporting tem de se sacrificar, mas o BCP também, pois ambos contribuíram para a situação chegar onde chegou.
Que o BCP, amuado, diga agora que vai sair do negócio do futebol, não deixa de surpreender. E dos outros negócios, onde perdeu tanto dinheiro, também vai sair? Vai deixar de emprestar à hotelaria, aos grupos de contrução civil, aos fundos financeiros que compram empresas, etc, etc?
Se o BCP amuasse com todos os sectores onde perdeu dinheiro, provavelmente teria de emprestar em Marte...