Quinta-feira, 07.08.14

O ebola da bolsa

Não há nada que os mercados financeiros temam tanto como a desconfiança.

A desconfiança enche as pessoas de receios, temores de perda do seu dinheiro.

Daí ao medo é um pulo, e ao pânico um saltinho.

A desconfiança é o ebola das bolsas, um vírus que parece incontrolável e para o qual ainda não há remédio.

É esse ebola que parece pairar sobre a bolsa portuguesa.

Ontem caiu tudo, aos trambolhões, e até os juros da dívida subiram.

A bolsa ficou vermelha. E nos bancos e no Governo, o sinal voltou ao laranja.

 

Talvez seja um exagero o que se está a passar.

Roosevelt disse um dia que a única coisa de que devíamos ter medo era do próprio medo.

Estava a falar de guerra, mas podia estar a falar dos mercados financeiros.

Ou de Portugal, nos dias que correm.

Há medo, e esse medo, a sua existência, dá-nos mais medo, e andamos ali às voltas, presos numa espiral de aflição.

 

Mas convém respirar fundo, contar até dez, acreditar que há nisto uma dose de exagero.

As bolsas, muitas vezes, comportam-se como rebanhos de carneirada.

Para onde vai um, vão todos, e ninguém sabe bem porquê, nem quem é o líder.

E quando assim é, é difícil encontrar uma explicação racional para o que está a acontecer.

 

A solução "banco bom" e "banco mau" tem virtualidades.

Protege os depositantes, os clientes normais, os activos bons do BES.

Porém, tem dois pontos fracos.

Primeiro, penaliza muito os accionistas, e isso gera desconfiança na bolsa portuguesa.

Se os accionistas podem perder tudo, para quê ser accionista, sobretudo de bancos com problemas?

Este medo gera uma pressão de venda, pois quando o risco de perda sobe, todos querem evitá-lo.

É verdade, mas também é verdade que, na sexta-feira passada, as acções do BES já só valiam 12 cêntimos, quase nada.

A maior perda já tinha acontecido.

 

O segundo ponto fraco da decisão é a ideia de que serão os outros bancos a ter de resolver o problema do Novo Banco.

Se não for bem privatizado, a um bom preço, são os outros bancos que se chegam à frente e pagam a factura.

Parece injusto, e até um bocado absurdo.

Então são os bancos que nada tiveram a ver com o caso a ter de suportar o imbróglio?

Como, se também eles estão a sair da situação difícil em que estiveram nos últimos anos?

Foi isso que ontem penalizou, e muito, o BCP, o BPI e o Banif.

 

Também aqui, há que colocar um pouco de gelo na ferida.

Em primeiro lugar, esses não são os únicos bancos a actuar em Portugal.

Existem a Caixa, o Santander, o BBVA, o Deustche, o BIG, e muitas outras instituições financeiras.

O fundo de Resolução inclui todos os bancos, não apenas o BCP, o BPI e o Banif.

E pode até dar-se o caso de os futuros compradores nem serem bancos que hoje actuam em Portugal.

 

Além disso, é apressado concluir que isto se vai passar depressa.

O mais provável é a reprivatização do Novo Banco demorar algum tempo.

Poderá ser feita em parcelas, mas ninguém acredita que seja rápida.

Dois anos, menos que isso?

Talvez sim, talvez não.

Seja como for, é cedo para penalizar os outros por algo que não se sabe quando, ou como, vai acontecer. 

 

publicado por Domingos Amaral às 10:25 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Terça-feira, 22.01.13

Já está tudo bem com os bancos?

Uma pessoa ouve as notícias e até tem dificuldade em perceber. Aparentemente, os bancos estão em grande, e as suas acções sobem vertiginosamente nas bolsas. Ao contrário de quase todos os outros negócios, parece que a alta finança não está a passar por crise nenhuma, o que não deixa de ser curioso.

Enquanto o PIB cai, o desemprego aumenta, os impostos sobem em flecha, as empresas têm quebras de faturação, e as despesas do Estado levam um corte, a banca funciona noutro mundo, e floresce, gloriosa e espetacular. Não tem crédito para dar a ninguém, mas está feliz.

Não é de estranhar. A banca apanhou um susto de morte, primeiro em 2009, e depois em 2011. Já poucos se devem lembrar, mas há cerca de dois anos, ou um ano e meio, os bancos privados portugueses estavam todos praticamente falidos. O BPN tinha implodido, o BPP também, o BCP estava um caco, a Caixa um farrapo, o Banif aos soluços e o BPI de joelhos. Por junto, safavam-se o BES e o Santander, que obviamente não é português e por isso tem uma segurança diferente.

O que aconteceu então? Bem, a Europa ajudou, através dos empréstimos do BCE, e a "troika" também. Podia não haver dinheiro para muita coisa, nem para pagar salários e pensões, mas para ajudar a banca havia sempre dinheiro.

Foram mais de 11 mil milhões de euros que o Estado português, financiado pela troika e pelo BCE, meteu na banca. Ajudas ao BPN, à Caixa, ao BCP, ao BPI e mais recentemente ao Banif. 

Com a mãozinha do Estado a segurá-la por baixo, confortavelmente à mama, a banca aguentou-se, e claro, começou a sair do buraco. Depois, mal a situação europeia desanuviou, não só saiu do buraco como se expandiu e já cresce, com alegria e pujança. Crise, qual crise? Na banca não há crise, nunca houve crise, e a crise dos outros que se lixe, que a nossa já passou!

Cortes na despesa do Estado? Isso é para os outros, para as escolas, os hospitais, as pensões, os subsídios, os funcionários públicos que têm de ser despedidos! Esses que aguentem a austeridade, como dizia o outro!

Agora, para a banca não há cá austeridade, nada disso! A banca é especial, precisa de ser protegida pelo Estado em formol, precisa de ser tratada com carinho e ternura, e ter muitas ajudinhas do Estado não vá algum banquinho aleijar-se, coitadinho. 

publicado por Domingos Amaral às 12:38 | link do post | comentar
 

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