Pensões: a Viúva Pobre, a Viúva Rica e outras histórias...
Anda para aí muito indignação porque o Governo anunciou que um dos próximos cortes será nas chamadas "pensões de sobrevivência".
Ou, numa linguagem mais terra a terra, nas "pensões de viuvez".
À primeira vista, parece moralmente errado cortar uma pensão a uma pessoa que perdeu o marido e herdou uma parte da pensão dele.
Normalmente, são pessoas com baixos rendimentos que vivem nestas condições, e é quase desumano não deixar que a pensão do falecido marido seja transferida para a viúva.
É a história da Viúva Pobre.
Uma mulher, com setenta anos, cujo marido morre aos 72, vai sobreviver como, a não ser com a pensão que o marido recebia?
Mesmo no caso em que ela própria receba uma pensão, normalmente baixa, é difícil aceitar que vai ter meios de sobrevivência.
Portanto, parece-me evidente que a Viúva Pobre deve ser protegida, pois é uma pessoa numa situação de fragilidade.
Mas, e a Viúva Rica, também deve ser protegida?
Imaginem um caso em que temos um antigo administrador, que tem 70 anos, e recebe uma pensão de 3500 euros.
A sua mulher, que tem 65 anos, nunca trabalhou.
Se o marido morrer de repente, ela deve passar a receber a pensão dele?
Bem, como não tem outros meios de sobrevivência ou de rendimento, é aceitável que deva continuar a receber uma pensão.
Mas, deverá receber 60% dos 3500 euros? Se calhar, é possível ser menos.
E agora passemos à seguinte situação: e se a mulher também tiver trabalhado a vida toda, e já na reforma, estiver ela a receber a sua pensão de 2000 euros?
Quando o marido morrer, ela deve ter direito a acumular as duas pensões, a dela e a do falecido, recebendo assim do Estado cerca mais de 4000 euros por mês?
A mim, parece-me que neste caso, se trata de uma Viúva Rica, e não é muito justo, se ela já recebe de pensão 2500 euros, ainda receber 60% da do marido falecido!
E vamos a um novo caso. Imaginem que este administrador, aos 65 anos e com uma pensão de 3500 euros, se decidiu divorciar da primeira mulher, e aos 67 casou com uma mulher bem mais nova, com 38 anos.
Esta giraça e vivaça deixou de trabalhar, pois agora tem um homem que a sustenta, com uma pensão alta.
Ora, se aos 70 anos o senhor bate as botas, 60% da sua pensão de 3500 euros deve ir para a segunda mulher, a Viúva Rica e Nova, que terá apenas 41 anos à data da morte do marido?
A Viúva Rica e Nova, poderá ficar, até ao fim da sua vida, aos 85 por exemplo, a receber por mês 2100 euros?
E se por acaso, ela até trabalhar, ganhando um salário de 2000 euros mensais, é justo que acumule essa salário com mais 2100 euros da pensão do falecido?
Podem explicar-me que esta é uma situação rara e minoritária, e até pode ser, mas que me parece manifestamente injusta, ai isso parece.
E, para quem pensa que eu estou a inventar situações, posso contar que no Brasil este é um caso muito habitual.
Os brasileiros, com a graça do costume, chamam-lhe até a "Pensão Viagra".
O homem, já perto dos 70 anos, arranja uma moça mais nova para lhe dar mimos, e quando morre ela herda uma choruda pensão vitalícia!
É justo, ou é exagerado?
Julgo que é necessário olhar para todos estes casos e ver onde está o equilíbrio e onde está o exagero.
Mas, lá que temos de rever o sistema de alto a baixo, isso parece-me evidente.
Na Holanda, que é um país bem mais rico do que nós, não é possível acumular salários com pensões, ou outros rendimentos importantes.
Se, por exemplo, uma pessoa se reforma aos 65 anos, e passa a receber pensão, e um ano depois tem um convite para trabalhar numa empresa, com um salário relevante, a pensão é imediatamente suspensa.
Em Portugal, isto não se passa, e muita gente recebe a pensão e ao mesmo tempo tem salário, ou outros rendimentos permanentes.
Há até administradores de bancos muito conhecidos, que dizem isso com orgulho, e sem um pingo de vergonha na cara.
Ora, a pensão não foi inventada para isso.
As pensões existem para impedir que, no fim da vida, as pessoas caiam na miséria.
Não existem para manter o nível de vida do passado, ou permitir os luxos de antigamente.
Há que rever o sistema todo, caso a caso, para que não estejamos, a coberto dos chamados "direitos adquiridos", a sobrecarregar o Estado com pensões que não são para ajudar a sobreviver, mas sim para manter um padrão elevado da vida.
Excesso de generosidade também é uma forma de injustiça.