Terça-feira, 26.11.13

E se, de repente, o Tribunal Constitucional fosse uma surpresa?

A grande maioria das pessoas espera que o Tribunal Constitucional chumbe as duas medidas mais emblemáticas deste governo para 2014, a convergência das pensões e a descida dos salários dos funcionários públicos.

Esperam as pessoas, espera o Governo, espera a oposição, esperam as agências de rating e até a "troika".

Todos, sem excepção, parecem dar como adquirido os chumbos, e todos já trabalham nesse cenário.

Os comentadores pró-Governo alarmam o país, dizendo que vem aí o 2ª resgate.

O PSD mete medo a todos, dizendo que podemos cair num monumental sarilho!

Do outro lado, a oposição agarra-se com unhas e dentes ao TC, esperando que o tribunal faça o que tem feito, chumbando as medidas do Governo.

Porém, se pensarmos um pouco, talvez não seja tão líquido assim que o TC vá chumbar as medidas.

Por exemplo, falemos nas pensões.

Um dos princípios invocados pelo TC para chumbar o corte dos subsídios dos funcionários públicos foi o da igualdade, pois a medida diferenciava os funcionários públicos de todos os trabalhadores do sector privado, numa falha claríssima de equidade.

No entanto, a convergência das pensões é apresentada exactamente para tornar semelhantes os regimes de pensões entre públicos e privados, eliminando uma "vantagem" que beneficiava os funcionários públicos.

Ora, se o TC vetou a desigualdade, pode perfeitamente aprovar um movimento no sentido da igualdade.

E quanto ao corte dos salários, será que o TC o vai chumbar?

É evidente que se trata de um corte forte, mas é também apresentado como transitório, e fortemente dependente das circunstâncias difíceis em que estão as finanças públicas.

Ora, o TC pode aceitar que, sendo transitório, o corte é necessário e portanto deixá-lo passar, ou pelo menos não o chumbar na sua totalidade.

Embora eu não seja formado em Direito, e muito menos especialista em direito Constitucional, não me parece nada impossível que o TC, ao contrário do que todos esperam, seja menos restritivo nestes dois casos.

E até pode dar-se o caso de vetar apenas uma das medidas, o corte dos salários, por ser excessivo, mas deixar passar a outra, a convergência das pensões.

Talvez seja prematuro dar como adquirido que o TC vai chumbar tudo.

Da última vez, também se esperava que o tribunal chumbasse a Contribuição Extraordinária, porém o TC aceitou-a.

 

publicado por Domingos Amaral às 12:21 | link do post | comentar
Sexta-feira, 11.10.13

Portugal tem a direita mais casmurra do mundo ou é só impressão minha?

A direita portuguesa, do PSD e do CDS, é provavelmente uma das direitas mais casmurras e teimosas do mundo.

Pior do que a nossa, só a americana!

A nossa direita anda absolutamente apaixonada pela ideia de que é preciso diminuir a despesa do Estado, e que não há mais nenhuma forma de cumprir as nossas obrigações.

A lógica é simples e límpida.

Se Portugal cortar a despesa, o deficit desce, ganhamos credibilidade, os juros descem, e podemos voltar aos mercados.

Tudo muito limpinho, certinho, tudo a parecer muito verdade, mas...tudo muito duvidoso.

Ora, será que a direita portuguesa não vê o que ela própria fez nos últimos dois anos?

Será que não tira daí algumas lições?

Convém recordar o que se passou, não vá alguém ter-se esquecido.

Em 2012, o Governo cortou drasticamente a despesa do Estado e retirou subsídios aos funcionários públicos.

Qual foi o resultado?

Portugal afocinhou numa recessão gravíssima, o desemprego cresceu vertiginosamente, as receitas fiscais caíram a pique, e o deficit, que era suposto ter diminuído, não diminuiu quase nada! 

O corte na despesa em 2012, de tão recessivo que foi, provocou efeitos bem mais graves do que aqueles que se esperavam.

Embora o Governo se preparasse para repetir a dose, o Tribunal Constitucional disse que esse caminho era ilegal, e então o Governo escolheu outro.

Para 2013, houve o famoso "enorme aumento de impostos", e cortou-se menos na despesa.

Qual foi o resultado?

Bem, o ano ainda não terminou mas parece já evidente que a recessão é muito menos grave do que em 2013, o desemprego até baixou um pouco, e as receitas fiscais subiram muito, fechando mais o deficit do que em 2012.

Ou seja, o aumento de impostos em 2013 foi bem mais eficaz e menos gravoso do que os cortes na despesa em 2012.

É isso que a realidade nos diz, mas o Governo nem pensa.

Alguém tira algumas conclusões inteligentes destes resultados?

Nada disso.

As indicações que temos é de que o Orçamento para 2014 vai trazer mais doses cavalares de austeridade, com muitos "cortes na despesa".

O Governo volta a escolher o caminho mais duro e mais penoso, e prepara-se para provocar mais uma recessão ao país.

Porque é que a nossa direita é tão casmurra?

Será que ainda ninguém percebeu que os cortes na despesas são muito recessivos e contraproducentes, e que mais vale subir um pouco mais os impostos?

Sim, meus amigos, subir os impostos, que parece que em Portugal é um crime, e que qualquer pessoa de direita espuma pela boca de raiva ao ouvir!

É exactamente porque estamos em tempos excepcionais que se devem usar medidas excepcionais.

Eu também gostava de descer impostos, mas se subi-los é a forma mais eficaz e menos dolorosa de sair de um sarilho, talvez se deva escolher essa hipótese, e não os cortes violentos na despesa.

Reformar o Estado não é cortar cegamente e à bruta na despesa.

Isso é casmurrice e cegueira.

Depois não digam que ninguém vos avisou...

 

publicado por Domingos Amaral às 10:22 | link do post | comentar | ver comentários (17)
Quarta-feira, 17.10.12

Já leram o memorando da troika?

Sim, é a minha pergunta de hoje: já leram o memorando de entendimento com a troika, assinado por Portugal em Maio de 2011? Eu li, e em pé de página deixo o link para quem o quiser consultar, na sua tradução oficial. São 35 páginas, escritas num português desagradável e tecnocrático, que têm servido a este governo para justificar tudo.

Ainda ontem, com descaramento, um dirigente do PSD dizia que "este não era o Orçamento do PSD, mas sim da troika"! Ai sim? Então eu proponho a todos um breve exercício de leitura. Tentem descobrir, lendo o memorando, onde é que lá estão escritas as 4 medidas fundamentais pelas quais este governo vai entrar para história de Portugal!

Sim, tentem descobrir onde é que lá está escrito que se deve lançar uma sobretaxa no subsídio de Natal de todos os portugueses (decidida e executada em 2011); cortar os subsídios aos funcionários públicos e pensionistas (decidido e executado em 2012); alterar as contribuições para a TSU (anunciada e depois retirada em Setembro); ou mexer nas taxas e nos escalões do IRS, incluindo nova sobretaxa (anunciados no Orçamento para 2013), e definidos pelo próprio ministro das Finanças como "um aumento enorme de impostos"?

Sim, tentem descobrir onde estão escritas estas 4 nefastas medidas e verão que não estão lá, em lado nenhum. Ao contrário do que este Governo proclama, estas 4 medidas, as mais graves que o Governo tomou, não estão escritas no "memorando com a troika"! Portugal nunca se comprometeu com os seus credores a tomar estas 4 medidas! Elas foram, única e exclusivamente, "iniciativas" do Governo de Passos Coelho, que julgava atingir com elas certos objectivos, esses sim acordados com a "troika".

Porém, com as suas disparatadas soluções em 2011 e 2012, o Governo em vez de melhorar a situação piorou-a. Além de subir o IVA para vários sectores chave, ao lançar a sobretaxa e ao retirar os subsídios, o Governo expandiu a crise económica, e acabou com menos receita fiscal e um deficit maior do que tinha. Isto foi pura incompetência, e não o corolário de um "memorando de entendimento" onde não havia uma única linha que impusesse estes caminhos específicos! 

Mais grave ainda, o Governo de Passos e Gaspar, sem querer admitir a sua incúria, quer agora obrigar o país a engolir goela abaixo "um enorme aumento de impostos", dizendo que ele foi imposto pela "troika". Importa-se de repetir, senhor Gaspar? É capaz de me dizer onde é que está escrito no "memorando de entendimento" que em 2013 o IRS tem de subir 30 por cento, em média, para pagar a sua inépcia e a sua incompetência? 

Era bom que os portugueses aprendessem a não se deixar manipular desta forma primária. Foram as decisões erradas deste Governo que, por mais bem intencionadas que fossem, cavaram ainda mais o buraco onde já estávamos metidos. E estes senhores agora, para 2013, ainda querem cavar mais fundo o buraco, tentando de caminho deitar as culpas para a "troika"?

Só me lembro da célebre frase de Luís Filipe Scolari: "e o burro sou eu?"

 

Para ler o memorando vá a:

(http://www.portugal.gov.pt/media/371372/mou_pt_20110517.pdf).

publicado por Domingos Amaral às 14:24 | link do post | comentar | ver comentários (44)
 

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