O mau tempo é o novo vilão do mundo
Nestes tempos escorregadios, já não há maus como deve de ser.
A URSS implodiu, a China mudou, Pinochet morreu, Fidel está em estado terminal.
E mesmo na Coreia do Norte, o novo ditador não parece mais que um psicopata pateta, que não provoca o medo que outrora os ditadores provocavam.
Putin, por mais defeitos que tenha, não chega aos calcanhares dos antigos homens do Politburo, e nas Américas latinas e centrais já não há generais foleiros, nem comunistas criminosos, e os Maduros e Morales são uma versão light dos líderes do passado.
A verdade é que, na época que atravessamos, há cada vez mais maus políticos, mas cada vez menos "maus" históricos.
Assim sendo, temos de descobrir um novo vilão para as narrativas do dia a dia, especialmente as mediáticas.
Os principais candidatos a vilões são o mau tempo e as catástrofes naturais.
No inverno, há nevões, avalanches, tempestades, chuvas e cheias.
No verão, há vagas de calor, furacões, incêndios.
Uma vez por outra, há mesmo uma catástrofe natural de grandes dimensões, como terramotos ou tsunamis.
E óbviamente, há as vítimas de todas estas balbúrdias atmosféricas, pessoas ou estruturas, que sofrem, morrem, ou são destruídas.
Enquanto espectadores, ficamos espantados com tanta fúria, tanta maldade dos elementos.
O mais difícil é que neste caso não é fácil encontrar culpados.
As narrativas têm de ter sempre vítimas e culpados, mas enquanto nas guerras e nos conflitos políticos ou económicos é mais fácil encontrar culpados, nas narrativas sobre o mau tempo e as catástrofes é difícil.
Excepto nos incêndios, onde estão eles? De quem é a culpa das tempestades, dos nevões, das cheias?
De Deus, de Alá, do Buda?
Até há uns anos, era viável a explicação de que era o Homem o culpado, pois o aquecimento global era causado pelo Homem e era essa mutação climatérica que explicava todas as outras.
Porém, nos últimos anos era teoria perdeu força. Mesmo nos meios académicos, há cada vez menos defensores dela, o que nos deixa sem culpados.
Pelos vistos, os climas mudam porque mudam, porque foi sempre assim na história do planeta Terra, e sempre será.
Não havia homens na Idade do Gelo, e no entanto os glaciares derreteram, e o clima mudou.
No presente, o clima também parece estar a mudar, mas ninguém consegue prever em que sentido.
O espectáculo permanente das tempestades vai prosseguir, pois o mundo comunicacional em que vivemos alimenta-se dele.
O fascínio aterrador da fúria do planeta vai continuar, e nós vamos continuar a vê-o, sentados no sofá.