Terça-feira, 19.03.13

O PSD e o memorando da troika: a mentira

Nos últimos dias, muitas pessoas próximas do PSD e do Governo têm procurado passar a ideia de que o "memorando da troika" estava mal desenhado desde o princípio (Maio de 2011), e que é por isso que as medidas do Governo estão a falhar, e não por culpa do próprio Governo. Há poucas ideias mais falsas do que esta, e convém que os portugueses não se deixem manipular assim.

Vamos por partes. Em primeiro lugar, quem quiser ler o memorando original que foi assinado entre o Governo de Sócrates e a "troika", em Maio de 2011, pode ir lê-lo, o link está no final deste post. Relembro apenas que o documento teve o apoio expresso não só do PS, mas também do PSD e do CDS.

Se o lerem com atenção, vão verificar que não existem em lado nenhum as quatro medidas mais emblemáticas do Governo de Passos Coelho. Não está lá escrito que é necessária uma sobretaxa no IRS (aplicada no Natal em 2011); nem que é necessário cortar os subsídios de férias e de Natal aos funcionários públicos e pensionistas (aplicada em 2012); nem que é necessária uma alteração na TSU (tentada sem sucesso em Setembro de 2012); nem está lá dito que é necessário um "enorme aumento" do IRS (aplicado em 2013).

Ou seja, no memorando original, a estratégia escolhida era muito mais de cortes no lado da despesa, e não de aumentos de impostos ou de cortes salarias ou de subsídios. Foi Vítor Gaspar que, mal se viu ministro das Finanças, decidiu escolher uma via diferente, e optar pelas escolhas que optou. 

Pode mesmo dizer-se que, não fossem as invenções graves de Gaspar, e a sua mudança abrupta de estratégia relativamente ao que estava acordado com a "troika", e certamente a recessão não teria sido tão grave como está a ser.

Vítor Gaspar, bem como um grupo de pessoas em seu redor (António Borges, Carlos Moedas, Braga de Macedo) é que conseguiram impor a sua via ao Governo, convencendo um inábil e pouco preparado Passos Coelho de que o ajustamento na sua versão PSD, ultra-rápida e à bruta, iria resultar muito melhor do que o ajustamento "light" que estava previsto no memorando original. 

O PSD é pois responsável por este ajustamento e pelos seus resultados cruéis, e não pode agora vir dizer que era o memorando que estava mal desenhado. Isso é absolutamente falso. Foi Gaspar quem adulterou o memorando, e seguiu outro caminho. A culpa não é da "troika", a culpa é de Vítor Gaspar e do Governo.

Contudo, não se pense que a culpa é só deles, porque não é. Há muita gente inteligente e poderosa que apoiou de uma forma acéfala e acrítica a estratégia "hard line" de Vítor Gaspar, que falhou rotundamente. Infelizmente, o PSD contou com o apoio expresso de muita luminária, em todos os sectores.

Nem vale a pena falar de António Borges, mas há mais gente. Na banca, Fernando Ulrich foi o grande campeão do apoio ao Governo, chegando a falar em "ditadura do Tribunal Constitucional" (!!!!) e a dizer, com um certo gozo, que o país "aguentava" mais austeridade!

Na sociedade civil, Isabel Jonet também foi uma grande apoiante desta estratégia, e na maior parte da comunicação social escrita, houve muita gente que deve andar agora envergonhada do que escreveu há dois anos! Nem vou falar em Camilo Lourenço, pois esse está para além da salvação possível...

Era bom que toda esta gente levasse a mão à consciência e a sentisse pesada, pois foi com o apoio de muitos deles que chegámos onde chegámos. Mas, é esperar demais. A humildade não é uma característica dos iluminados... 

 

Para ler o memorando original vá a:
(http://www.portugal.gov.pt/media/371372/mou_pt_20110517.pdf).

publicado por Domingos Amaral às 10:42 | link do post | comentar | ver comentários (14)
Segunda-feira, 04.02.13

Ulrich é a Pepa Xavier da nossa banca

Fernando Ulrich está a candidatar-se a grande provocador do ano. Primeiro foi o célebre "aguenta", e agora, não satisfeito com a primeira calinada, lá veio a segunda, comparando os portugueses a "sem-abrigos"! Isto de ser banqueiro e rico, ao que parece estraga a cabeça de uma pessoa. 

Eu tenho um problema com os provocadores. Quando oiço Arménio Carlos, o líder da CGTP, a falar em "roubos", "greves" ou "direitos adquiridos", apetece-me logo ser de direita liberal, e mandá-lo bugiar.

Mas, quando oiço Fernando Ulrich, a dizer que o país "aguenta" mais austeridade, e que se os "sem-abrigo aguentam os portugueses também aguentam", apetece-me logo ser do MRPP e desatar a pintar paredes contra o grande capital.

Os provocadores despertam em mim instintos destes, opostos, e Ulrich, que parece um homem inteligente, não resiste a falar demais, e não teve o bom senso para sequer lamentar a sua primeira declaração.

Ele podia lamentar-se, dizer que o primeiro "aguenta" não lhe saiu bem. Um pouco de humildade não lhe fazia mal. Nada disso. Em vez de recuar, insiste e espalha-se ao comprido. Então agora os portugueses são tipo "sem-abrigos"? Sim, senhor, muito bem visto, muito fino o raciocínio do nosso Ulrich.

Um pouco antes da Revolução Francesa, a rainha Maria Antonieta ficou célebre também pela sua falta de lucidez. Quando lhe vieram dizer que o povo, nas ruas, estava faminto e pedia pão, ela arqueou a sobrancelha e perguntou: "E porque é que não comem brioches?"

Ulrich, obviamente, não é nenhuma Maria Antonieta, nem vai acabar guilhotinado, mas lá que entrou para o Top 2013 do ridículo, ai isso entrou. Com a sua declaração sobre o povo e os "sem-abrigo", Ulrich esteve à altura de uma verdadeira Pepa Xavier da banca nacional. Só faltou o tom de voz queque... 

publicado por Domingos Amaral às 11:41 | link do post | comentar | ver comentários (6)
Quarta-feira, 31.10.12

O Banqueiro Laranjinha (Aguenta lá esta!)

Ontem, Fernando Ulrich lembrou-me aquele alentejano da anedota, a quem perguntam se o burro aguenta a correr atrelado ao combóio, e ele responde: "entã nã há-de aguentar! Claro que aguenta! Ele até se está a rir, de língua de fora!" 

Foi desse alentejano que me recordei ao ouvir Fernando Ulrich dizer que "o país aguenta mais austeridade, claro que aguenta"! Que interessa que o burro já esteja de língua de fora, extenuado? Que interessa que o país esteja carregado de desempregados, que as empresas não consigam vender, que as lojas fechem, que as famílias estejam aflitas? 

Infelizmente, até as pessoas mais inteligentes têm péssimas ideias. É o caso de Fernando Ulrich. A fidelidade perfeitamente canina com que Ulrich defende o Governo só se percebe porque ele é um laranjinha fanático. Daqueles que, se não estivesse a gerir um banco, estava a colar cartazes, numa distrital qualquer. É por isso que, quando já quase ninguém acredita nas políticas deste Governo, lá aparece Fernando Ulrich para dar uma ajudinha aos seus amigos laranjas.

Vítor Gaspar enganou-se nas suas previsões? Fernando Ulrich louva-o, diz que "é um grande ministro das Finanças!" O Tribunal Constitucional examina as leis e obriga a mudanças? Fernando Ulrich ataca-o e chama a atenção para uma tenebrosa e sinistra "ditadura do Tribunal Constitucional"! O país está cansado e massacrado com a austeridade e com os "enormes aumentos" de impostos? Pois lá vem Fernando Ulrich declarar, em grande estilo, que "o país aguenta mais austeridade, claro que aguenta"!

Esta última afirmação caiu mal. Pode não ter sido essa a intenção, mas a verdade é que faz alguma impressão que alguém que ganha tão bem, e que por isso quase nada vai sofrer com a austeridade, venha dizer desta forma que o país "aguenta mais, claro que aguenta", quando para muitos portugueses essa é uma visão terrível do futuro. Para os desempregados, para as famílias que têm cada vez mais dificuldades, essa gozação do "aguenta" soa mal, muito mal, principalmente vindo de banqueiros, que não são propriamente inocentes nesta grave crise que atravessamos.

É que, convém lembrar, foram bancos como o BPI que passaram mais de uma década a emprestar dinheiro às pessoas, às empresas e ao Estado, contribuindo alegremente para este excesso de endividamento em que nos encontramos. E, no auge da explosão da crise financeira, foi com o dinheiro dos nossos impostos que o Estado salvou bancos como o BPI de uma situação bem mais grave. Não fossem as ajudas do Estado, e portanto o nosso dinheiro como contribuintes, e onde estaria agora o BPI?

O "aguenta" de Fernando Ulrich é pois duplamente desagradável, para dizer o mínimo. Ele não se devia esquecer que somos nós, portugueses, que estamos todos a "aguentar" uma vida cada vez pior para o poder ajudar a ele, Fernando Ulrich, a salvar o seu banco de um desastre. Quem devia "aguentar" mais eram os bancos e os banqueiros, não o resto do país. Mas pronto, desta vez Fernando Ulrich foi mesmo o "alentejano" da anedota...

 

 

publicado por Domingos Amaral às 11:10 | link do post | comentar | ver comentários (9)
 

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