Passos devia fazer como Merkel fez, um governo com o PS

Pedro Passos Coelho é um admirador da senhora Merkel, e nos últimos quatro anos seguiu as ideias dela com muito empenho. 

Agora, devia também pensar no que ela fez em 2013, quando a Alemanha passou por uma situação parecida com a que Portugal está a viver.

 

Em Outubro desse ano, a CDU venceu as eleições, aliada à CSU da Baviera, mas os dois juntos não conseguiram maioria absoluta.

O Partido Liberal, com que Merkel tinha formado governo entre 2009 e 2013, caiu em votos, e portanto não era possível repetir a fórmula governativa. 

 

O que fez Merkel? Contra muitas vozes do seu partido, e contra muitas vozes do SPD (o equivalente ao nosso PS), Merkel propôs conversações entre os três partidos, com vista à formação de um governo.

As negociações demoraram quase três meses, e não foram nada fáceis, mas de um lado e de outro houve cedências, e em Janeiro de 2014 a Alemanha teve um novo governo, um bloco central formado por Merkel e Sigmar Gabriel, que a tem governado sem solavancos.  

 

Não será isso que Passos e Costa devem fazer agora? Perante um parlamento onde a única possibilidade real de maioria absoluta duradoura e estável é um acordo entre PSD/CDS e PS, não seria isso que eles deviam procurar?

Eu sei que existe muita acrimónia de parte a parte, as feridas ainda estão abertas e a sangrar, e há desconfianças profundas. Porém, campanha eleitoral é campanha eleitoral. Há ataques, rasteiras, caneladas, e tudo é feito para tentar vencer. Só que isso já passou, e agora trata-se de governar o país.

 

Do lado da coligação, é evidente que haverá a tentação de tentar imitar Cavaco em 85/87, quando ele governou com minoria, e governou bem, vencendo depois com uma maioria absoluta.

E, do lado do PS, é evidente que existe a tentação da vingança, fazer a Passos o que ele fez a Sócrates, entre 2009 e 2011. Cozê-lo em lume brando, até lhe dar a estocada final, deitando-o abaixo, como Passos fez ao rejeitar o famoso PEC IV.

 

Contudo, essas duas estratégias antagónicas esbarram contra as circunstâncias actuais, que são muito diferentes. Entre 85 e 87, Cavaco tinha folga financeira para ir dando uns bónus ao país, além de ter batido o pé nas negociações europeias, o que cai sempre bem.

Mas, em 2015, não há folga financeira, o caminho é muito curto, e o país não aguenta a instabilidade de guerrilhas permanentes.

Quanto à tentação do PS, também esbarra numa evidência: Passos não é Sócrates, não tem os problemas de credibilidade pessoal que o seu antecessor tinha.

 

A mim parece-me que não estamos em tempo de brincadeiras, e Passos e Costa, em vez de passarem um ou dois anos a tentar tramar-se um ao outro, deviam ser responsáveis, e pôr os olhos na Alemanha. Se Merkel e Sigmar Gabriel conseguiram ir para o governo juntos, porque é que em Portugal isso é impossível?

Num país que está numa situação de risco ainda elevado, era importante ambos mostrarem sentido de responsabilidades, e admitirem um governo conjunto.

 

E, para quem, seja de que lado for, prefere um acordo parlamentar, um "deixa lá passar o orçamento", em vez do PS no governo, a minha resposta é simples.

Com o PS também no governo, Portugal e os mercados tinham a garantia de que a solução era estável e duradoura, pelo menos para quatro anos.

Com apenas um "acordo parlamentar", ou a abstenção nos orçamentos, já sabemos que isso só duraria um ano ou dois, como aconteceu no passado com outros governos minoritários, e lá teríamos de ir outra vez para eleições prematuras, sem certeza de resultados inequívocos.   

 

Eu prefiro a instabilidade à dúvida permanente, a calma à tentação dos abismos.

Talvez hoje ainda poucos pensem assim, mas a função dos líderes é também andarem à frente da opinião pública e publicada, e pensarem mais no interesse nacional do que nos seus egos e nos interesses de curto prazo dos seus partidos.

 

PS: Para os leitores preocupados com o CDS, repito o que disse em cima: um governo entre PSD/CDS e PS. Deixar o CDS de fora, depois de tanto tempo junto ao PSD, seria um bocado injusto.

 

publicado por Domingos Amaral às 10:33 | link do post | comentar