Segunda-feira, 08.04.13

As crises da dívida são como o teatro: aí está o 3º acto!

Aqui há uns meses, escrevi neste blog um post em que comparava as crises da dívida ao teatro ou à ópera, pois têm sempre uma estrutura em 3 actos, como esses espectáculos culturais. 

O primeiro acto é o "incidente inicial", que em Portugal foi o pedido de resgate, feito precisamente há dois anos. É o pico inicial da crise, com os seus culpados e os seus defensores, com muita trapalhada e eleições, normalmente com um novo governo que diz muito mal do anterior, e promete fazer tudo bem para o futuro.

Em 2011, Passos Coelho não só derrubou Sócrates prometendo acabar com a austeridade, como prometeu ir muito para além do memorando da troika, inventando um novo país, bem gerido e cumpridor!

O segundo acto, tal como no teatro, é passado em enormes dificuldades, de mini-crise em mini-crise, mas com a situação económica sempre a piorar.

O Governo vai aplicando mais e mais austeridade, a economia vai definhando, a dívida e o desemprego crescem, e o país vai-se cansando cada vez mais desta crise e deste governo.

Por cá, foram óbvias as mini-crises. Primeiro, foi o primeiro veto do Tribunal Constitucional, em 2012, seguiu-se a crise da TSU, e agora viveu-se mais uma mini-crise, com o segundo chumbo do Tribunal Constitucional.

O ambiente está de cortar à faca, e a situação piora a olhos vistos, tanto cá dentro como lá fora. Como era esperado, o "mau da fita", o sr. Schauble, já veio dizer que Portugal tem é de cortar mais e que não espere simpatia dos credores!

Estamos pois a entrar em pleno 3º acto da crise. Tal como no teatro é aqui que se vai viver o climax desta história. Com a situação económica sempre a piorar, o Governo vai implementar mais austeridade, vai cortar mais na despesa, os credores vão endurecer a posição, e Portugal vai passar de "bom aluno" a "mau aluno".

A situação de crise económica e social ameaça tornar-se insustentável, e a crise política vai ser permanente, com um Governo cada vez mais incapaz de resolver o que quer que seja, e com a população enfurecida com ele.

E, um dia destes, a coisa estoira. E estoira à séria. É evidente que ainda ninguém sabe qual será o final, mas prevejo que vai dar-se uma mega-crise política, e também uma mega-crise económica, que pode passar ou por um segundo resgate, ou mesmo por uma saída do euro no espaço de um ou dois anos.

Infelizmente para todos nós, o guião desta peça de teatro já estava escrito há muito tempo e nós não nos afastámos muito do que tem acontecido por esse mundo fora nos países a quem é imposto um ajustamento deste tipo. É sempre o mesmo filme: a violência da austeridade violenta as sociedades e eles revoltam-se!

Em 120 ajustamentos feitos pelo FMI nos últimos 50 anos, apenas 19 tiveram resultados mais ou menos safisfatórios, e sempre em casos que era possível desvalorizar a moeda do país, como se passou em Portugal em 1983. 

Ao contrário do que dizem os "falcões da austeridade", como a Sra Merkel e o sr. Schauble, o sr. Rehn ou o sr. Barroso, os senhores Passos e Gaspar, bastava olhar para a história económica do último século para saber que esta "onda austeritária" que varre a Europa ia acabar mal, muito mal.

Um a um, a austeridade está a empurrar os países para uma catástrofe, e se não parar depressa vai levar com ela a Europa e o euro.

Nós portugueses, somos apenas mais uma vítima desta decisão europeia de castigar os devedores com austeridade e proteger os ricos credores de qualquer perda. O que se está hoje a passar em Portugal, é mais um episódio da saga "Como Destruir o Euro com a Austeridade", que pode ver num teatro grátis perto de si, ou seja, todas as noites ao vivo na televisão.  

Como somos um país inculto em economia, passamos o tempo a discutir os draminhas da paróquia, quem tem culpa do quê e outras coisas do género. A culpa é do Sócrates, do Cavaco, do Gaspar e dos Passos, do Estado que é grande demais, dos portugueses que viveram acima das suas possibilidades, dos bancos que emprestaram demais, etc, etc, etc. E todos têm razão, e têm as suas razões e as suas culpas.

Porém, há uma coisa que os portugueses deviam perceber. Portugal, e muitos outros países da Europa, têm dois problemas pela frente. O primeiro chama-se Alemanha, pelas condições que impôs desde o início ao funcionamento do euro. E o segundo chama-se Alemanha, pelas regras draconianas que impôs aos "programas de resgate", obrigando a que o ajustamento fosse feito só pelos devedores e não também pelos credores. 

Portanto, podemos ir zangando-nos todos uns com os outros cá na paróquia que não mudamos o essencial. Enquanto a Alemanha impuser aos outros país as suas regras de austeridade, não há saída para o problema.

Esta peça de teatro só tem dois fins: ou a Alemanha muda a sua orientação e aceita um perdão geral e substancial das dívidas dos países pequenos, ou vários países terão de sair do euro. O resto é conversa para entreter...

 

 

publicado por Domingos Amaral às 11:39 | link do post | comentar | ver comentários (3)
Terça-feira, 26.03.13

Chipre: como rebentar com um pequeno país

Se, há coisa de cinco anos, algum europeu tivesse dito que um dia se iriam lançar confiscos sobre os depósitos bancários de outros europeus, todos lhe teríamos chamado maluco! Mas, a verdade é que o impensável acontece todos os meses nesta Europa.

A forma como a Europa está a dar cabo de um pequeno país como Chipre é um manual cínico da brutalidade. Depois de ter deixado o país nove meses na expectativa (sim, o pedido de resgate de Chipre foi feito há nove meses!), eis que a Europa inteira se lança numa fúria castigadora contra uma pequena ilhota do Mediterrânio.

Ora tomem lá com confisco de depósitos e os accionistas e depositantes que salvem os bancos, que a Europa não vos vai salvar porque vocês são um paraíso fiscal cheio de russos mafiosos! Sim senhor, e viva a solidariedade europeia. Com amigos destes, quem é que precisa de inimigos?

Havia várias maneiras diferentes de salvar os bancos cipriotas, basta ler qualquer Financial Times ou The Economist para saber que há muitas maneiras de esfolar um coelho, mas a Europa, sempre liderada pela Alemanha, quer dar um "castigo exemplar" ao Chipre.

É este o grave problema europeu. Em vez de admitirem que estamos todos no mesmo barco (o euro), e que foi esse barco que estava mal construído e a meter água desde o primeiro dia, e que por isso era necessário remodelar o barco todo, de cima a baixo; em vez disso, certos europeus preferem o castigo para aqueles que eles elegem como prevaricadores!

A mensagem da Alemanha é sempre a mesma: vocês portaram-se mal e agora têm de pagar por isso! Foi assim com a Grécia, com a Irlanda, com Portugal, com a Espanha, com a Itália e agora também com Chipre.

Para os alemães, todos estes países e povos viveram "acima das suas possibilidades", atolaram-se em "dívidas" e agora têm de fazer "sacrifícios" para se reabilitarem! Há que penar, sofrer o castigo, para depois ressuscitar, já puro e bom!

Esta mensagem moral é de um cinismo atroz. É como se fosse o traficante de droga a dizer ao consumidor que ele agora tem de se sacrificar e muito para ficar saudável. Quem é que nos emprestou o dinheiro para nos endividarmos? Foi a Alemanha! Mas, quem oiça os alemães falar decerto pensará que eles não tiveram nada a ver com isso! 

Veja-se o caso de Chipre. A Alemanha, há um ano, decidiu que os credores privados da Grécia deviam perder dinheiro. Com isso, afundou os bancos cipriotas, que tinham imensa dívida grega. Mas, agora que é preciso ajudar os bancos de Chipre, a Alemanha faz de conta que não teve nada a ver com o assunto, e que nem foi ela que causou a falência dos bancos cipriotas. É tudo culpa do off-shore e dos russos! 

Assim se destrói a Europa, passo a passo. Aquilo que irá acontecer em Chipre nos próximos meses não vai ser bonito de se ver, mas os ricos alemães não querem saber do sofrimento dos outros povos. Desde que eles continuem ricos...

Os pequenos países da Europa que se preparem, pois o futuro vai ser muito difícil. O egoísmo alemão, a fúria moralista cega da senhora Merkel e dos seus ajudantes locais, vai destruir um a um os pequenos países.

Um dia, daqui a uns anos, a Alemanha vai olhar à sua volta e descobrir um círculo de países na miséria, carregados de ódios e ressentimentos contra os alemães. Depois queixem-se...

publicado por Domingos Amaral às 11:43 | link do post | comentar | ver comentários (8)
Sexta-feira, 01.03.13

A culpa é da crise na Europa: o novo lema do Governo

Nos últimos dias, o Governo encontrou uma nova explicação para os nossos azares e más fortunas económicas. A culpa é da Europa, da crise europeia e da recessão europeia. Se não fosse isso, Portugal estava safo, é essa a ideia que o Governo quer transmitir.

A ideia não deixa de ser verdadeira. É evidente que a culpa é da Europa, pois se a Europa - as troikas, a Sra Merkel, e muitos outros - não tivessem imposto enorme austeridade aos países do Sul da Europa, a crise não seria tão grande nem tão profunda. A culpa é pois da Europa.

Contudo, é preciso lembrar duas coisas ao nosso Governo. Em primeiro lugar, e que eu saiba, este Governo sempre apoiou a Europa, nomeadamente a Sra Merkel, e sempre disse que as políticas impostas pela Europa eram as melhores, e eram boas, e não havia alternativas.

Nunca, que eu me lembre, este Governo esteve contra as orientações europeias de austeridade. A culpa é da Europa, sim, mas como este governo sempre apoiou a Europa, e sobretudo a Sra Merkel, a culpa também é dele.

Em segundo lugar, convém lembrar ao Governo que foi ele que escolheu massacrar os portugueses com mais austeridade do que aquela que estava prevista no memorando original, assinado em Maio de 2011.

Foram Passos Coelho e Vítor Gaspar que impuseram as sobretaxas no IRS em 2011, que decidiram cortar nos subsídios aos funcionários públicos e pensionistas em 2012, e que decidiram um "enorme aumento de impostos" para 2013.

Nenhuma destas decisões, profundamente recessivas da economia, estava escrita no memorando original assinado com a troika. Foi este Governo, na ânsia e na pressa de fazer um ajustamento rápido e exemplar, que se excedeu de forma tremenda na dose de austeridade a aplicar ao país, o que nos levou ao desastre em que estamos. É claro que a troika aplaudiu, mas quem decidiu foi o Governo.

Vir agora dizer que a culpa da crise portuguesa é da da crise europeia, é uma enorme e apressada mistificação. A Europa tem culpas e muitas, mas no que toca ao caso específico de Portugal, este Governo tem muito mais culpa do que a Europa. 

publicado por Domingos Amaral às 12:55 | link do post | comentar
Sexta-feira, 22.02.13

Vítor Gaspar devia demitir-se e já!

As notícias desta última semana são arrasadoras para o Governo, mas sobretudo para Vítor Gaspar, o grande mentor da estratégia da austeridade que este Governo seguiu desde que tomou posse, há quase dois anos.

A recessão agravou-se, o desemprego subiu para níveis espantosos, a economia está em coma, a dívida pública não pára de subir, e o deficit do Estado não atinge as metas a que Gaspar se propôs.

Ou seja, o Governo falhou, e falhou em praticamente tudo, não apenas em alguns indicadores. Gaspar parece um daqueles malabaristas que lança bolas ao ar, e depois as deixa cair todas, sem conseguir apanhar nenhuma.

Como aqui muitas vezes escrevi ao longo do último ano, a estratégia da austeridade era brutal e não iria resultar. Para quem conheça um pouco de história económica, de Portugal e do Mundo, sabe que a grande maioria destes "ajustamentos" falharam sempre, e tiveram péssimas consequências para os países que os colocaram em prática.

Quando um país se vê numa situação de excesso de dívida pública, a forma de resolver esse problema não é praticar austeridade à bruta e o mais depressa possível, como Gaspar decidiu. Sobrecarregar um país com excesso de impostos e cortes nas despesas, nos salários e nas pensões, provoca uma enorme recessão, envia centenas de milhares de pessoas para o desemprego, e não resolve o problema da dívida.

Pelo contrário. Como muitos já estão agora a perceber, quanto mais Portugal paga em juros, mais deve, pois a dívida pública não pára de subir em percentagem do PIB! O país foi colocado numa situação terrível, numa espiral depressiva, e entrou na chamada "armadilha da deflação e da dívida", quando existe em simultâneo uma recessão profunda e um aumento da dívida. 

Há responsáveis por isto. É claro que, em grande parte, a responsabilidade é sobretudo da Europa e da Alemanha. Foram os alemães da nefasta sra Merkel que impuseram esta estratégia suicida de "austeridade" aos países do Sul da Europa. Mas, não foram só eles.

Em Portugal, o principal responsável por esta estratégia "kamikaze" foi o ministro Vítor Gaspar. Foi ele que convenceu Passos Coelho (que obviamente não percebe patavina de economia) mas também o resto do Governo, que esta ideia iria funcionar.

Ora, quase dois anos depois, os resultados do fanatismo de Gaspar estão à vista. O país está de rastos, a economia está aniquilada em muitas actividades, e ninguém vê uma saída para este enorme buraco negro em que nos encontramos. Gaspar meteu-nos na Boca do Inferno!

É por isso que ele tem de se ir embora. Passos Coelho, se quiser continuar mais tempo, tem de dispensar o actual ministro das Finanças, e chamar outro para o seu lugar, que possa inverter a situação. Gaspar falhou, e falhou rotundamente. É talvez o pior ministro das Finanças que Portugal teve desde o 25 de Abril, aquele que mais se enganou na sua estratégia.

O seu tempo chegou ao fim. Se Passos Coelho se vir livre de Gaspar, talvez consiga sobreviver até 2015. Eu não sou dos que acham que o Governo se deve demitir. Foi eleito, tem legitimidade, e deve prosseguir. Mas, deve mudar de ministro das Finanças, e já!

 

publicado por Domingos Amaral às 12:07 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Segunda-feira, 28.01.13

A "austeridade estruturalista" falhou ou está a resultar?

O título deste post é um bocado estranho, mas é mesmo necessário. Será que a mistura de austeridade com reformas estruturais está a resultar ou, pelo contrário, como dizem os críticos, está a falhar?

Bem, em primeiro lugar, explique-se o que é a "austeridade estruturalista". Este duplo palavrão pretende definir a crença que existe em muitos, europeus e portugueses, que uma mistura entre "austeridade" e "reformas estruturais" era o único caminho para sairmos da crise, europeia e portuguesa.

Como sempre defenderam Merkel, Schauble, Passos Coelho e Gaspar, só com a "austeridade" se recuperava a confiança perdida pelos investidores, e só com "reformas estruturais" se recuperava a competitividade das economias, como Portugal, Grécia e outras.

Mas, será que isto funcionou? Agora que a crise europeia parece ter amainado, e que Portugal já regressou aos mercados para uma primeira emissão de dívida, pode-se mesmo afirmar que a "austeridade estruturalista" deu bons resultados?

Comecemos pela crise do euro, ou crise das dívidas soberanas. Parece já evidente para todos que não foi a "austeridade estruturalista" que acabou com a crise de confiança no euro. Durante três anos, entre 2009 e 2012, a "austeridade estruturalista" não deu resultados, pelo contrário, só agravou a crise do euro. Os problemas começaram na Grécia, mas rapidamente alastraram a Portugal, Irlanda, Espanha e Itália.

Só quando o Banco Central Europeu disse que comprava dívida dos países, é que a crise amansou. E só quando a dívida grega foi perdoada em parte e reestruturada na outra parte, é que a crise do euro chegou ao fim.

Ou seja, e ao contrário da opinião da Alemanha e da Sra Merkel, só quando foi possível a intervenção do BCE e se aceitou o princípio do perdão ou da reestruturação se conseguiram bons resultados. A "austeridade estruturalista" perdeu claramente este combate.

E, na segunda frente de guerra, será que a "austeridade estruturalista" conseguiu vencer o combate? A resposta é não. Todos os países da periferia do euro estão em recessão. Portugal, Grécia, Espanha, Itália, Irlanda, e mesmo França e Alemanha, criaram desemprego e perderam crescimento económico.

Sobretudo na periferia, não há qualquer sinal de que a crise económica esteja a abrandar. A crise financeira de desconfiança pode ter sido ultrapassada, mas a crise económica, o desemprego e a recessão, não acabaram.  

Por um lado, a "austeridade" foi forte demais, por outro as reformas estruturais demoram muito tempo a produzir resultados. Assim, as economias amargam numa anemia desagradável, e o desemprego não pára de crescer.

Por mais que os defensores de Merkel e Passos Coelho queiram cantar vitória, a verdade é que a "austeridade estruturalista" não mostra resultados muito animadores. O que não é novidade. Quem conheça a história económica dos últimos 40 anos, sabe que estes programas de "austeridade estruturalista" deram quase sempre maus resultados. Em 107 intervenções do FMI desde 1970, só 19 correram bem...Pena que ninguém tenha aprendido com a história.

 

publicado por Domingos Amaral às 14:33 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Quinta-feira, 24.01.13

Será que os alemães também não gostam dela?

Pouco se falou em Portugal esta semana da estrondosa e inesperada derrota de Angela Merkel e da CDU, este domingo, no estado da Baixa Saxónia. Os admiradores de Merkel estão calados, talvez perplexos, sem perceberem que pelos vistos não é só fora da Alemanha que não gostam da Sra Merkel. 

Infelizmente para todos nós, a sra Merkel esteve três anos a cometer graves erros, e isso prejudicou fortemente a Europa, o euro, e também os pequenos países, como Portugal.

Durante três longos anos, entre 2009 e 2012, a Sra Merkel boicotou sistematicamente, e obrigou a adiar, as soluções da crise do Euro. Não queria um resgate à Grécia, e só o aceitou com condições severas.

Três anos mais tarde, foi obrigada a reconhecer que a Grécia só podia aguentar-se no euro se a sua dívida fosse perdoada. E ainda dizem que ela é inteligente...

E só perante um ultimato dos dois Mários italianos, Draghi e Monti, é que foi obrigada a ceder, e aceitou a possibilidade do Banco Central Europeu comprar dívida dos estados diretamente. Foram precisos três anos para a senhora ver o óbvio. Mal o BCE teve esse poder, a crise do euro acabou.

Por último, Merkel obrigou a que os programas de resgate das "troikas" fossem duríssimos e profundos, e o resultado foi o óbvio: recessões cavadas nos países da periferia, que depois se expandiram a toda a zona euro. Só quando viu a recessão a chegar à Alemanha é que Merkel começou a compreender o mal que tinha feito à Europa. 

Pelos vistos, na Alemanha já há muita gente a perceber que Merkel não resolveu nada, e só piorou a crise. Quem sabe em Setembro os eleitores alemães façam à Europa o grande serviço de a despacharem definitivamente...

Mas, por cá ainda há quem a adore e ache que Merkel foi boa para Portugal e para a Europa. Não se percebe como. Não fossem os Mários italianos, o Monti e o Draghi, e talvez o euro já não existisse. 

publicado por Domingos Amaral às 17:28 | link do post | comentar | ver comentários (6)
Terça-feira, 18.12.12

O precipício orçamental da América é trágico? E o nosso?

Desde a reeleição de Obama que na América não se fala noutra coisa que não seja o "precipício orçamental", ou em inglês "fiscal cliff". A expressão feliz é da autoria do governador do banco central americano, o FED, que é o senhor Ben Bernanke. 

E o que é o precipício orçamental da América? Pois bem, se Obama e os Republicanos não chegarem a um acordo, a partir de Janeiro próximo entram em acção uma enorme quantidade de cortes de despesa do Estado, e sobem de forma drástica os impostos.

Ou seja, para os americanos o "precipício orçamental" é a austeridade enorme, e as suas consequências graves. Se os impostos subirem e ao mesmo tempo se executarem cortes profundos na despesa do Estado federal, isso vai provocar uma contração muito forte na economia americana, impedindo a recuperação económica em curso, e provavelmente provocará uma forte recessão, coisa que ninguém, no seu juízo perfeito, deseja.

Portanto, para os americanos, "o precipício orçamental" é uma tragédia a evitar a todo o custo, e nem republicanos nem democratas querem lançar o país para a crise, e rejeitam fortemente uma solução que passe pelo aumento drástico da austeridade.

Como tudo é diferente na América e na Europa! Lá, têm juízo, percebem de economia, e sabem que não é com crises, falências, recessões e desemprego que se conseguem pagar as dívidas, por mais elevadas que sejam. Porém, na Europa, o caminho é o oposto, e a Sra Merkel e os seus seguidores não pensam noutra coisa que não seja massacrar os países com austeridade, com cortes na despesa do Estado e aumentos "enormes" de impostos.

"Precipício orçamental" na América? Nós, em Portugal, é que estamos a cair no precipício orçamental! Há um abismo a abrir-se debaixo dos nossos pés, com os aumentos de impostos que aí vêm, e que ainda será mais agravado com os cortes de 4 mil milhões de que fala o Governo. É um precipício orçamental e não é nada pequeno, e infelizmente temo que todos iremos cair nele. 

publicado por Domingos Amaral às 12:52 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Quarta-feira, 05.12.12

Uma Alemanha fortíssima numa Europa fraquíssima

Angela Merkel é adorada na Alemanha, mas poucos gostam dela no resto da Europa. Não admira. Enquanto a Alemanha se encontra forte e em grande forma, à sua volta espalha-se uma crise gravíssima. Merkel foi ontem reeleita líder pela sua CDU, que a aplaudiu de pé durante oito minutos, mas fora das suas fronteiras a apreciação é diferente.

É o que acontece a quem se especializou em dizer "Não" a tudo. Desde 2009, ano em que foi reeleita para chanceler da Alemanha, Merkel esteve sempre contra as mudanças necessárias para a Europa sair da crise. Não, não e não, foi a sua resposta inicial a qualquer ideia que pudesse ajudar a Europa. Foi essa a política da Alemanha: dizer Não, mesmo que uns meses depois fosse quase sempre obrigada a aceitar mudanças.

É importante recordar o seu primeiro Não. Foi em 2009, quando disse que a Alemanha não garantia a dívida dos outros países. Esta declaração, talvez a mais grave de todas, gerou uma crise de confiança nos mercados da dívida soberana. Se a Alemanha, o país mais rico e mais poderoso do euro, não ajudava, então quem ajudava? As taxas de juro de países como Grécia, Portugal, Irlanda, Espanha, Chipre, Itália, e mesmo França e Bélgica, desataram a subir. A crise rebentou.

No início de 2010, Merkel disse o seu segundo Não: não queria um resgate europeu à Grécia. A Grécia afundou cada vez mais, e em meados desse ano, a Europa inteira e o FMI lá acabaram por reconhecer que não havia outra solução, e a Grécia foi mesmo resgatada, embora em condições terríveis e com juros altíssimos, o preço imposto pela Alemanha para aceitar esta contrariedade.

Com a Irlanda e com Portugal, o mesmo filme: primeiro Não, depois lá teve de ser o Sim, com imensa relutância e ferozes cláusulas. E o mesmo se passou com os mecanismos europeus de financiamento aos países, o FEEF e o MEE. Primeiro, a Alemanha disse Não, mas lá acabou por dizer que sim, sempre contrariada.

Situação semelhante se aplicou ao Banco Central Europeu. Quando Mario Monti falou na possibilidade do BCE comprar dívida soberana nos mercados secundários, logo a Alemanha disse Não! Meses mais tarde, aceitaria o sim. Para a união bancária, a mesma reação. Primeiro um rotundo Não, depois um lento e complexo sim, sempre cheio de travões e condicionantes.

Ao longo de três penosos anos, a Alemanha nunca teve uma visão política para a Europa, que pudesse corrigir as deficiências da união monetária e ultrapassar a crise. Manteve-se obstinada nos seus Nãos, limitando-se depois a fazer o mínimo necessário para que o euro não implodisse. Com isso, perdeu-se tempo, e a crise assentou arraiais na Europa do Sul, ameaçando agora a chegar à França e à Alemanha.

Esta postura de Merkel teve naturalmente o aplauso dos alemães. Na verdade, ela colocou sempre o interesse da Alemanha à frente de tudo e de todos. E o seu interesse pessoal também, pois como todos os políticos ela quer ser reeleita em Setembro de 2013. O único problema é que, para ser amada na Alemanha, ela irá pagar um alto preço, pois a crise na Europa não tem fim à vista.

É pena que Merkel não seja, como Kohl ou Adenauer, seus heróis da CDU, uma chanceler alemã que olhe para a Europa não como um bando de países irresponsáveis que a Alemanha tem de meter na ordem, e de aturar a contragosto, mas como uma união essencial para o mundo e, sobretudo, para todos os europeus.

publicado por Domingos Amaral às 12:02 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Terça-feira, 27.11.12

A falência da Grécia salvou a Grécia!

A Grécia faliu, mas felizmente nada de muito grave aconteceu, pelo contrário, a falência da Grécia salvou o país. Ontem à noite, a Europa decidiu finalmente reconhecer o óbvio, e ajudar a Grécia a sair do caos onde se encontra. A dívida grega, insustentável, vai agora poder ser paga em muito mais tempo, e as taxas de juro exigidas vão baixar. Além disso, é muito provável que seja necessário que a "troika" perdoe cerca de 50 por cento do dinheiro que emprestou à Grécia, libertando o país desse fardo.

Era a única hipótese, a Grécia falir dentro do euro, a Europa ser solidária, os credores públicos e europeus aceitarem as perdas, e todos perceberem finalmente que a austeridade exagerada que se exigiu à economia grega não resolveu nada, pelo contrário, só piorou a situação.

Os grandes derrotados de ontem são a Alemanha da Sra Merkel e do Sr. Schauble, que tudo fizeram em três anos para impor a austeridade, e que agora foram obrigados a engolir a derrota da sua estratégia e das suas políticas. Com a austeridade, perderam todos, devedores e credores. Os devedores ficaram com a economia de rastos, e os credores nunca viram o seu dinheiro devolvido. A falta de solidariedade alemã, a austeridade fanática que impuseram aos gregos, levou ao caos e à quase destruição da Grécia, mas três anos depois os restantes europeus obrigaram a Alemanha a tomar juízo. 

Agora, chegou o tempo da solidariedade, da partilha de perdas entre credores e devedores. Finalmente, reconheceu-se que existe muita responsabilidade também dos credores, e que não se resolve nada atirando com os devedores para uma crise económica, pois isso ainda os impossibilita mais de pagar as suas dívidas. Finalmente, a Europa tomou juízo, e deu passos importantes para resolver esta armadilha que criou a si própria.

Infelizmente para Portugal, os efeitos positivos das decisões de ontem chegaram tarde demais. Em 2013, à conta das ideias do ministro Gaspar, a recessão vai continuar por cá, com cada vez mais desemprego e cada vez mais deficits. Será infelizmente uma austeridade totalmente inútil, pois se Portugal em vez de esmagar a economia começasse já amanhã a renegociar a dívida, sairia muito mais depressa deste inferno em que está.

Assim, o ministro Gaspar é adorado pelos alemães, e nós lixamo-nos, e daqui a um ano o país estará a fazer o mesmo que a Grécia, e a "troika" vai dizer que os credores serão obrigados a perdoar-nos as dívidas, e a pergunta que fica é: para quê perder um ano? O melhor economista europeu, Paul de Grauwe, esteve ontem em Portugal, e aconselhou o seu amigo Vítor Gaspar a "não exagerar na austeridade". Infelizmente, Vítor Gaspar não ouve ninguém, nem os seus amigos, e com ele a situação do país não vai melhorar.

 

 

publicado por Domingos Amaral às 12:34 | link do post | comentar
Segunda-feira, 26.11.12

A Europa comparada com a América

No presente, a Europa discute mais um orçamento de austeridade geral, imposta pelos países do Norte aos países do Sul. Enquanto isso, na América, Obama vai tentar negociar com os republicanos um novo acordo que evite a austeridade, ou o chamado "fiscal cliff", um precipício de cortes na despesa e aumentos de impostos, que poderia lançar o país numa nova recessão.

Com o Atlântico pelo meio, os dois caminhos não podiam estar mais afastados um do outro, e os resultados, naturalmente, são bem diferentes. Depois de tanto América como Europa terem reagido à crise financeira de 2008 ajudando os bancos e prevenindo um colapso, os caminhos começaram a divergir. A partir de 2009, Obama escolheu aumentar a despesa do Estado, usar o investimento público, e tentar sair da crise assim, aumentando o emprego e evitando o desemprego. Também o banco central americano, o FED, usou políticas monetárias expansivas, e além das descidas da taxa de juro, praticou o chamado "quantitative easing", aumentando a oferta de moeda. 

Já a Europa, com Merkel à cabeça a tocar as cornetas, lançou-se numa cruzada austeritária, impondo grandes sacrifícios, aumentos de impostos e cortes na despesa, para diminuir as dívidas dos países do Sul. Além disso, a Europa impôs a si mesma um novo tratado orçamental, proibindo terminantemente os deficits, através da regra dourada da disciplina orçamental. E embora o Banco Central Europeu tenha mantido as taxas de juro baixas, nunca os alemães permitiram que houvesse mais expansão monetária, com receio de uma inflação que é uma ameaça fantasma, pois não existe em lado nenhum.

Os resultados estão à vista: a América já saiu da recessão, o crescimento existe, e o desemprego desceu. Na Europa, a recessão espalha-se e a crise afunda as economias, e o desemprego, em quase todos os países, não para de aumentar. Os fanáticos da austeridade deviam pensar nisto, mas pelos vistos a ideologia cega as pessoas.

publicado por Domingos Amaral às 12:00 | link do post | comentar
 

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