Quarta-feira, 27.11.13

A Alemanha acabou de virar à esquerda, e ainda bem para nós!

Com o acordo hoje anunciado na Alemanha, entre o SPD e a Sra Merkel, o país vai virar um pouco à esquerda.

Merkel, apesar de contrariada, aceitou a imposição de um salário mínimo mais elevado, e também o crescimento da despesa pública alemã, nomeadamente com mais investimentos públicos em estradas.

De repente, Merkel é obrigada a fazer o que não fez, aumentar a despesa pública!

Essas são boas notícias para a Europa, para o euro e para Portugal.

A Alemanha, país mais rico, é um rebocador das outras economias europeias, e gastando mais pode puxar pelas outras, que exportarão mais.

É o contrário do que Merkel fez durante os últimos quatro anos, e que tanto mal provocou na Europa.

Desde 2009 que muitos vinham pedindo que ela estimulasse a economia alemã, mas ela resistiu teimosamente, sempre defendendo a austeridade, sem perceber que assim agravava a crise europeia.

Quem me lê, sabe bem que não admiro em nada a Sra Merkel. Acho-a lenta a raciocinar, pouco inteligente e com um grave preconceito contra certos países do Sul.

Nos últimos quatro anos, à frente de um Governo com os liberais, Merkel foi tudo o que uma líder europeia não devia ser.

Foi ela que gerou uma enorme crise de confiança no euro, ao dizer em finais de 2009 que a Alemanha não pagava a dívida dos outros países.

A partir daí, a eurozona andou à deriva, e só estabilizaria em 2012, quando Mário Draghi prometeu fazer tudo para "salvar o euro".

Mas, a desastrosa influência de Merkel não se viu só nessas frases assassinas.

Durante vários anos, tentou sabotar qualquer solução europeia da crise.

Tentou evitar os mecanismos de estabilidade europeia, tentou sabotar a intervenção do BCE, e ainda continua a tentar evitar a união bancária.

Em vez de liderar a Europa, na procura de uma solução europeia integrada, que fizesse a zona euro sair da crise, Merkel manteve o discurso obstinado em defesa da austeridade, obrigando os países da Europa do Sul a suportarem sozinhos um ajustamento duro e rápido.

O resultado está à vista de todos: o desemprego aumentou muito na Europa, os países do Sul estão numa recessão dura, a deflação é agora o maior perigo que a zona enfrenta, e por fim, prova dos nove de como as políticas de austeridade falharam, as dívidas soberanas, em vez de terem descido, subiram!

Veja-se o caso de Portugal, por exemplo.

Há quatro anos, em Janeiro de 2009, a taxa de juro da dívida pública rondava os 6%, e o stock total de dívida ia nos 150 mil milhões de euros.

Quatro anos de dura austeridade depois, a taxa de juro continua a rondar os 6%, mas o stock de dívida é agora de 230 mil milhões de euros!

Com mais desemprego, mais impostos e mais recessão. Pior era difícil.

Porém, na Europa, todos já perceberam que a austeridade germânica não leva a lado nenhum.

Finalmente, a partir de agora, será a própria Alemanha a ter de mudar. A viragem à esquerda da Alemanha, contra a vontade da Sra Merkel, é pois uma boa notícia para nós. E para o euro também. 

publicado por Domingos Amaral às 12:17 | link do post | comentar
Terça-feira, 26.11.13

E se, de repente, o Tribunal Constitucional fosse uma surpresa?

A grande maioria das pessoas espera que o Tribunal Constitucional chumbe as duas medidas mais emblemáticas deste governo para 2014, a convergência das pensões e a descida dos salários dos funcionários públicos.

Esperam as pessoas, espera o Governo, espera a oposição, esperam as agências de rating e até a "troika".

Todos, sem excepção, parecem dar como adquirido os chumbos, e todos já trabalham nesse cenário.

Os comentadores pró-Governo alarmam o país, dizendo que vem aí o 2ª resgate.

O PSD mete medo a todos, dizendo que podemos cair num monumental sarilho!

Do outro lado, a oposição agarra-se com unhas e dentes ao TC, esperando que o tribunal faça o que tem feito, chumbando as medidas do Governo.

Porém, se pensarmos um pouco, talvez não seja tão líquido assim que o TC vá chumbar as medidas.

Por exemplo, falemos nas pensões.

Um dos princípios invocados pelo TC para chumbar o corte dos subsídios dos funcionários públicos foi o da igualdade, pois a medida diferenciava os funcionários públicos de todos os trabalhadores do sector privado, numa falha claríssima de equidade.

No entanto, a convergência das pensões é apresentada exactamente para tornar semelhantes os regimes de pensões entre públicos e privados, eliminando uma "vantagem" que beneficiava os funcionários públicos.

Ora, se o TC vetou a desigualdade, pode perfeitamente aprovar um movimento no sentido da igualdade.

E quanto ao corte dos salários, será que o TC o vai chumbar?

É evidente que se trata de um corte forte, mas é também apresentado como transitório, e fortemente dependente das circunstâncias difíceis em que estão as finanças públicas.

Ora, o TC pode aceitar que, sendo transitório, o corte é necessário e portanto deixá-lo passar, ou pelo menos não o chumbar na sua totalidade.

Embora eu não seja formado em Direito, e muito menos especialista em direito Constitucional, não me parece nada impossível que o TC, ao contrário do que todos esperam, seja menos restritivo nestes dois casos.

E até pode dar-se o caso de vetar apenas uma das medidas, o corte dos salários, por ser excessivo, mas deixar passar a outra, a convergência das pensões.

Talvez seja prematuro dar como adquirido que o TC vai chumbar tudo.

Da última vez, também se esperava que o tribunal chumbasse a Contribuição Extraordinária, porém o TC aceitou-a.

 

publicado por Domingos Amaral às 12:21 | link do post | comentar
Sexta-feira, 22.11.13

Soares sempre foi assim: no poder um cordeiro, na oposição um Che Guevara!

Mário Soares sempre foi assim.

Aqueles que agora se espantam com as suas frases, deviam lembrar-se do que ele tantas vezes disse noutras circunstâncias.

Soares, sempre que estava na oposição, insultava tudo e todos, atacava tudo e todos, e não descansava enquanto não atirava abaixo quem estava no poder.

Era, sempre foi, um Che Guevara sem mota e sem boina, mas sempre ao ataque.

Foi assim contra Salazar, contra Marcello Caetano, contra Cunhal, contra Eanes, contra Sá Carneiro, contra o meu pai nas eleições presidenciais, contra Cavaco, contra Guterres, contra tudo e contra todos.

Ninguém se deve pois espantar que ele esteja contra Passos Coelho e, mais uma vez, contra Cavaco.

Como muitos outros políticos de esquerda, antes e depois dele, é um fanático na oposição, mas torna-se um cordeiro no poder.

Lula, por exemplo, seguiu-lhe as pisadas. 

Antes de ser presidente, era um sindicalista perigoso, um metalúrgico radical, o terror da direita e dos mercados.

Quando se viu em Brasília amansou, como Soares amansou sempre, fosse em São Bento, como primeiro-ministro, fosse em Belém como presidente.

Portanto, ninguém se deve espantar com as diatribes do nosso "avôzinho Che", ele sempre foi assim.

É um coelinho Duracell de esquerda, só se cala quando as pilhas oposicionistas se gastam, e lhe metem as pilhas do poder.

A mim, a única coisa que me espanta é que Soares diga agora tão mal da "troika" e do Governo, quando foi ele que convenceu Sócrates a pedir a vinda da "troika".

Ainda se lembrará o nosso "avôzinho Che" do telefonema que fez a Sócrates, obrigando-o a pedir o resgate de Portugal?

Pois é, nessa altura e como muitos portugueses, Soares não percebeu nada e não percebeu o que implicava a chegada da "troika" e das políticas de austeridade, não é verdade?

Eu compreendo o seu arrependimento posterior, mas a verdade é que, quando tudo isto começou, onde estava o "avôzinho Che"?

Pois é, estava do lado errado, e quis a "troika" em Portugal...

É por essas, e por outras, que eu há muito que já não ligo ao que ele diz. 

publicado por Domingos Amaral às 10:33 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Terça-feira, 19.11.13

E 2014, será melhor ou pior que 2013?

Ontem, escrevi aqui quais penso serem as principais razões, nacionais e internacionais, para que 2013 tenha sido melhor do que 2012.

A economia, embora ainda recessiva, já cresceu um pouco, o desemprego caiu ligeiramente, e as taxas de juro da dívida aliviaram.

2013 foi melhor que 2012 também porque a estratégia orçamental do Governo, subindo o IRS, foi mais eficaz do que a seguida em 2012, com os cortes de subsídios e despesas.

Mas, e para 2014, o que é que se pode esperar?

Aquilo que já se sabe, faz-me pensar que 2014 será mais um ano complicado para a economia portuguesa.

Lá fora, o desanuviamento financeiro deverá continuar.

O FED americano já deu a entender que continuará a sua política monetária expansionista, e o mesmo sucede com o Banco do Japão.

Na Europa, o BCE também manterá as taxas baixas, mas infelizmente não será mais expansionista, pois os alemães não deixam.

De qualquer forma, 2014 deverá ser um ano em que as taxas de juro da dívida se mantém estáveis e até baixas.

A não ser que exista algum grave imponderável, por exemplo com uma decisão do Tribunal Constitucional alemão contrária ao euro, nada de muito catastrófico deverá surgir nessa frente.

Já na economia, as coisas são menos positivas. Embora América e Japão devam continuar a crescer, bem como o Reino Unido, e embora a China possa também dar uma ajuda, o resto da zona euro deverá manter-se bastante anémico, e por isso as nossas exportações terão dificuldade em crescer mais do que já conseguiram em 2013.

Em resumo, para a economia portuguesa, os efeitos externos serão ligeiramente positivos, mas não espectaculares.

E o que é que se passará por cá?

O risco de 2014 é muito mais interno do que externo.

Se o Tribunal Constitucional chumbar o orçamento, o Governo terá de procurar medidas alternativas, para evitar que a percepção internacional do país se agrave, impedindo o fim do programa de ajustamento em Junho.

Nesse caso, é provável que seja inventado mais um imposto, e que suba o IVA, coisas assim. 

Haverá efeitos recessivos, mas provavelmente menores do que existirão caso os cortes do Governo fossem implementados.

Assim, se o TC chumbar o orçamento, teremos menos recessão interna, mas arriscamos o segundo resgate, o que é muito mau.

Caso o TC deixe passar as medidas do Governo, teremos menos riscos de ir parar a um segundo resgate, mas a recessão será maior.

Provavelmente, será o caso em que Portugal sofrerá uma recessão em W, sendo que depois da melhoria em 2013, piorávamos de novo em 2014.

 

Em conclusão: a economia em 2014 ou estará pior, ou estará mais ou menos na mesma que em 2013. 

Não acredito em milagres económicos, nem em grandes expansões.

A única hipótese de isso acontecer era a Europa perceber finalmente que estas políticas austeritárias estão muito erradas, e corrigir a rota, aumentando a despesa pública dos países, e mutualizando as dívidas.

Mas, no estado em que vejo a Europa, não me parece que isso vá acontecer, e portanto ficaremos mais um ano nesta terrível crise, com pequenas melhorias que animam o doentinho mas não lhe curam a doença.

publicado por Domingos Amaral às 09:50 | link do post | comentar
Segunda-feira, 18.11.13

As 7 razões porque 2013 está a ser melhor que 2012

Parece evidente a todos que a economia portuguesa está melhor em 2013 do que esteve em 2012.

O desemprego baixou um pouco, e a recessão não foi tão forte, com dois trimestres seguidos de algum crescimento.

O déficit orçamental não baixou muito, mas também não piorou, e as taxas de juro da dívida estão agora abaixo de 6%.

Mas, o que é que mudou entre 2012 e 2013?

Muita coisa, e convém perceber o quê.

 

1) Lá fora, mudou o ambiente financeiro.

Em 2012, as taxas de juro da dívida portuguesa, e de quase todos os países europeus, foram vítimas de enorme instabilidade, com crescimentos muito acentuados.

Porém, a partir de Setembro, quando o BCE anunciou o programa OMT, as coisas desanuviaram, e esse diminuir das tensões prolongou-se por 2013.

Tanto o BCE, como sobretudo o FED americano e o Banco do Japão, aplicaram uma política monetária expansiva em 2013, com quedas das taxas de juro ou "quantitative easing".

É sobretudo por isso que se verifica uma calmaria nos mercados das dívidas públicas, pois os investidores, "os mercados", têm mais garantias de liquidez e portanto não estão tão desconfiados.

E foi sobretudo isso que permitiu à Irlanda voltar "aos mercados", e poderá auxiliar Portugal nesse objectivo em 2014.

 

2) Lá fora, as bolsas internacionais têm estado a subir.

Uma das consequências da política monetária expansiva que tem sido seguida nos EUA, no Japão e um pouco na Europa, foi a subida das bolsas internacionais.

Em 2013, as bolsas de Nova Iorque batem recordes, e as europeias e japonesas também têm estado sempre a subir.

Além do que isso significa em termos psicológicos, há também um "efeito riqueza" que se vai espalhando à economia.

Como as suas carteiras de ações se valorizam, os consumidores podem aproveitar para consumir mais, e as empresas para investir. 

 

3) Lá fora, houve várias economias que melhoraram os seus crescimentos económicos.

A América continuou a crescer, o Japão começou a crescer, a na Europa, a Alemanha e o Reino Unido também conseguiram algum crescimento.

Até a própria Espanha, tão deprimida em 2012, melhorou a sua situação!

Embora a China tenha estado abaixo do esperado, há indicadores que os chineses irão estimular mais o seu mercado interno, e isso já se sentiu um pouco em 2013.

Os rebocadores da economia mundial, embora tenham crescido pouco, estão pois em terreno positivo, e isso possibilitou a que os países mais pequenos, como Portugal, tenham conseguido exportar mais em 2013 do que em 2012.

 

4) Cá dentro, sentiu-se a melhoria do cenário internacional.

As exportações portuguesas beneficiaram com os crescimentos de vários países, e bateram vários recordes.

Além do mérito nacional, isso só foi possível porque as "economias rebocadoras" aumentaram a procura dos nossos bens.

No teatro financeiro, Portugal também beneficiou muito das descidas das taxas de juro da dívida que a actuação dos bancos centrais europeu e americano possibilitaram. 

Por fim, também a nossa bolsa de Lisboa esteve bem, sobretudo no segundo semestre de 2013, o que valorizou muito as carteiras dos que têm valores mobiliários, e produziu um efeito positivo extra, que pode ter tido algum efeito positivo no consumo.

 

5) Cá dentro, o turismo português teve um ano excelente.

Seja por mérito próprio, seja devido à instabilidade no Norte de África, que desviou para Portugal muitos turistas, a verdade é que o ano foi muito bom, o que permitiu uma entrada de receitas adicional que muito jeito nos deu. 

Esta crescimento adicional foi importante para compensar os efeitos negativos da recessão interna.

Foram os estrangeiros que nos ajudaram, e o mesmo aconteceu à Grécia.

 

6) A economia portuguesa adaptou-se melhor ao aumento do IRS do que aos cortes na despesa.

Em 2012, os cortes nos subsídios de férias e Natal, e os muitos cortes em despesas intermédias do Estado, provocaram uma recessão interna muito cavada. O desemprego disparou, e o PIB caiu muito mais do que se esperava, tendo por isso também diminuído muito as receitas fiscais.

A brutal austeridade provocou uma brutal recessão.

No entanto, em 2013 a política orçamental mudou.

Em vez de cortar à bruta na despesa, o Governo subiu o fortemente IRS.

O que se verificou, em 2013, foi que a economia absorveu muito melhor o aumento do IRS, e a recessão foi muito menos forte.

Aumentar os impostos provocou menos danos do que cortar na despesa, é essa a lição a retirar.

 

7) O Tribunal Constitucional deu, mais uma vez, uma boa ajuda à economia.

O veto do TC ao corte de um dos subsídios em 2013 ajudou a economia portuguesa.

Ao impedir que o Governo aplicasse esse corte, o TC permitiu que esse dinheiro fosse parar ao bolso das pessoas, ajudando a economia pela via do consumo.

Em vez de criticar TC, o Governo devia agradecer ao TC por ter ajudado ao crescimento da economia.

Embora não exista ainda qualquer "milagre económico", algum do crescimento económico que existiu em 2013 deve-se ao TC e não ao Governo.  

 

Em resumo: 2013 foi melhor do que 2012, mas era bom perceber que, se o Governo tivesse feito o que queria, cortar os 2 subsídios a funcionários e pensionistas, provavelmente não estaria agora a festejar o regresso ao crescimento económico, pois a recessão teria sido bem mais forte, como foi em 2012.

A estranha conclusão é esta: este Governo beneficiou, não das suas políticas desejadas, mas daquilo que foi obrigado a fazer contrariado.

E é pena que ainda não tenha aprendido a lição, e que anuncie para 2014 mais cortes na despesa.

Já devia ter percebido que isso é pior para a economia do país, e no limite para o próprio Governo.

 

 

publicado por Domingos Amaral às 10:49 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Quarta-feira, 13.11.13

Dr. Passos, isto não é uma questão de pessimismo!

Com um triunfalismo um pouco excessivo, Passos Ceolho afirmou que "o tempo do pessimismo está a acabar"!

Por vezes, tenho a sensação que está na moda este uso de explicações psicológicas e sentimentais para explicar as flutuações da economia.

É como se tudo se reduzisse a "estados de alma", "emoções", "comportamentos desviantes", coisas assim.

É evidente que a psicologia e as expectativas dos povos têm efeitos sobre a economia, mas convinha não exagerar.

A nossa crise não foi uma crise de pessimismo, nem de pessimistas.

A crise portuguesa existiu por muitas e variadas razões, e nenhuma delas foi psicológica.

Existiu porque houve uma terrível crise financeira internacional, em 2008.

Existiu porque essa crise gerou outra, uma crise do euro, a partir de 2009.

Existiu porque a crise do euro gerou a crise das dívidas soberanas, lançando muitas dúvidas sobre a capacidade de certos países conseguirem pagar as suas dívidas, e as taxas de juro subiram.

E existiu porque a linha que as troikas escolheram, e que Passos aplicou como aluno empenhado, provocou uma recessão brutal!

Reduzir tudo isso a "pessimismo" é um doce engano.

As pessoas não deixaram de consumir apenas porque estivessem "apreensivas" ou "pessimistas"!

As pessoas deixaram de consumir sobretudo porque pura e simplesmente têm muito menos dinheiro disponível agora, ou porque foram parar ao desemprego, o que é bem diferente de pessimismo...

Quem pensar que é com excitações psicológicas que tira o país da crise, está a alimentar uma estranha ilusão.

A melhoria recente da economia portuguesa não se deve a uma diminuição do pessimismo, ou a um súbito aumento de optimismo.

A verdade é que houve mais turismo, mais exportações, e taxas de juro um pouco mais baixas.

Ou seja, quem está optimista são os estrangeiros, os turistas que nos vêm visitar, os países que nos compram as exportações, e os investidores que compram a nossa dívida pública nos mercados internacionais.

Esses sim, já não estão pessimistas!

E isso melhora um pouco a nossa vida, mas não muito.

A verdade é que os portugueses, em geral, ainda não sentem grandes melhorias na sua vida.

Optimistas ou pessimistas, o pilim no final do mês continua curto.

E enquanto for assim, não há psicologia que nos valha...  

publicado por Domingos Amaral às 12:23 | link do post | comentar | ver comentários (4)
Sexta-feira, 08.11.13

Europa: a armadilha da dívida e da deflação

Ontem, o sr. Mario Draghi, governador do Banco Central Europeu, admitiu pela primeira vez que a Europa pode estar confrontada com um novo e grave problema, a deflação!

A deflação é o oposto da inflação, é um processo continuado de descida de preços, e é tão perigosa ou mais que a inflação.

Numa deflação, as pessoas esperam que os preços desçam, e por isso não consomem, pois amanhã poderão comprar mais barato do que hoje.

Portanto, em vez de consumirem, poupam.

Assim, o crescimento económico é mais difícil, e é isso que se está a passar na zona euro, e por isso Draghi desceu as taxas de juro do BCE.

Mas, a deflação traz outro grave problema: embora os preços dos bens e dos ativos desçam, as dívidas não descem de valor, pelo contrário, há um aumento real do seu valor!

Com deflação, é muito mais difícil pagar dívidas, e é esse também o drama da zona euro, sobretudo dos países que estão muito endividados, como Portugal, Grécia, Irlanda, Espanha, Itália ou Chipre.

Porém, ninguém se deve espantar que isto esteja a acontecer.

Já nos anos 30, o economista Irving Fischer tinha escrito sobre esta situação, a chamada "armadilha da dívida e da deflação". 

Nessa armadilha, quando os países caem nela, quanto mais dívida pagam, mais devem!

Os esforços para reduzir a dívida, se forem muito pronunciados, se a austeridade for muito forte, provocam recessão, e isso leva à subida da dívida em percentagem do PIB!

É o chamado "paradoxo da desalavancagem": quando todos cortam as despesas ao mesmo tempo, isso gera uma tal contração, que todos ficam pior no fim, ainda com mais dívida.

Ao mesmo tempo, a deflação faz com que as pessoas poupem mais, e nasce o segundo paradoxo, o "paradoxo da poupança"!

Supostamente, é boa ideia poupar, ainda por cima em tempos difíceis como os que atravessamos. Contudo, se toda a gente poupar ao mesmo tempo, consome-se menos e a economia encolhe.

Lembram-se de Passos Coelho ter dito recentemente que os portugueses "tinham poupado demais"?

Pois é, tanto os assustaram, e tanto lhes cortaram o rendimento disponível, que eles se assustaram e pouparam muito, o que retraiu ainda mais a nossa economia!

São esses mecanismos que geram o sarilho em que a Europa está hoje metida.

A cruzada austeritária liderada pela Sra Merkel deu nisto: uma Europa sem crescimento económico, cheia de desempregados, e confrontada com o drama da deflação!

As fúrias contra a despesa do Estado, os ajustamentos austeritários, os programas das "troikas", conduziram a Europa a este terrível cenário.

E, pelo meio, os únicos que estão bem são os alemães, que batem recordes de excedentes comerciais, enquanto os outros se afundam em déficits.

O caminho da austeridade está a dar cabo da Europa, de Portugal e de vários outros países, e mais tarde ou mais cedo vai gerar-se um abismo entre os alemães e todos os outros. 

Ou as políticas europeias mudam, e se volta a apostar no crescimento e na despesa dos Estados, ou todo o edifíico do euro e da união monetária ficará em risco, e a divisão entre um Norte rico e um Sul pobre vai provocar um cisma poderoso!

 

publicado por Domingos Amaral às 12:36 | link do post | comentar
Quarta-feira, 06.11.13

A Alemanha anda a lixar o euro?

Nas últimas semanas, a Alemanha tem sido muito criticada, seja pelos americanos, seja pelo FMI, seja até subtilmente pela Comissão Europeia.

A causa das críticas é simples: a Alemanha tem um enorme excedente comercial, exporta muito mais do que importa, e isso tem desequilibrado muito a situação na zona euro.

Os outros países, sobretudo os países do Sul, têm grandes déficits comerciais e de capitais com a Alemanha, e apesar de os estarem a tentar corrigir, com tremendos esforços e profundas recessões, o equilíbrio não volta, pois a Alemanha não faz nenhum esforço para corrigir o seu excedente.

A economia é assim, cada moeda tem sempre duas faces.

Se nós temos um déficit na balança comercial ou de transações correntes, alguém tem de ter um excedente. Para que este desequilíbrio se consiga corrigir, ambas as partes têm de alterar as suas políticas.

Contudo, os alemães não aceitam este princípio.

Eles acham que os déficits dos países do Sul existem porque eles são pouco produtivos, pouco competitivos, e consomem demais, importanto mais do que deviam.

Mas, acham que o seu excedente é virtuoso, sinónimo de competitividade alemã e de vitalidade económica, e não querem deixar de o ter.

Portanto, não querem saber nem de conselhos nem de críticas.

Não querem subir salários na Alemanha, não querem mais inflação, nem querem ter de importar mais.

Ou seja, querem continuar como são, porque se julgam melhores que os outros.

Porém, assim não há equilíbrio.

Por mais que os países do Sul tentem corrigir, gastando e importando menos, se a Alemanha não puxar pela sua economia, os países do Sul não conseguem exportar para lá, e por isso não conseguem crescer.

É pois, ou devia ser, evidente para todos que o euro não está a funcionar bem.

Não é possível aceitar que só a Alemanha ganhe com o euro, como tem ganho.

Foram 10 anos de grandes excedentes para a Alemanha, e grandes déficits para os países do Sul!

Para muitos países, começa a não fazer sentido estar numa união monetária em que só a Alemanha ganha, e quase todos os outros perdem.

Se os alemães não perceberem isto depressa, e continuarem cegos, o que é o mais provável porque eles se acham superiores a todos os outros, em breve será impossível sustentar um euro que provoca estes graves desequilíbrios.

Antes do euro, a única forma que os outros países tinham de impedir esta supremacia da Alemanha, era desvalorizarem as suas moedas.

Agora, não têm essa arma, e por isso estão reféns da Alemanha, que os despreza e humilha constantemente.

Ou isto muda depressa e a Europa se transforma nuns Estados Unidos da Europa, ou a coisa, mais cedo ou mais tarde, fica insustentável.

Que sentido faz termos uma moeda que nos prejudica e empobrece?

 

publicado por Domingos Amaral às 13:06 | link do post | comentar
Terça-feira, 05.11.13

Última opinião do ministro Crato: Portugal um ano sem comer!

Este Governo, quase todos os dias, dá-nos razões para nos divertir. 

Pode ser um Governo muito duro, muito austero, muito dado a chatear a população com os seus cortes, mas ao mesmo tempo é um Governo com uma capacidade criativa inesgotável, e com um sentido de humor apuradíssimo.

Nas últimas semanas, tivemos por exemplo o "milagre económico" do Dr. Pires de Lima, e o "1640 financeiro do Dr. Portas".

Agora, temos mais uma pérola produzida pelo ministro da Educação, o Dr. Crato.

O que disse ele? Algo muito simples: "só é possível Portugal pagar a sua dívida se ficássemos todos um ano sem comer!" 

É uma frase brilhante, digna de um manual de ciência política, ou mesmo de macroeconomia.

Que digo eu? Que mania que as pessoas têm de levar estas coisas à séria. Eu próprio, às vezes deixo-me contaminar pelos vírus da seriedade!

É evidente que o Dr. Crato estava a dizer uma graçola! 

Dizer que, só ficando um ano sem comer é que se paga a dívida só pode ser piada, pois o Dr. Crato sabe muito bem que ninguém sobrevive um ano sem comer!

O Dr. Crato não quer matar ninguém à fome, como é evidente. E também não quer que ninguém deixe de comer, ou coma menos, para pagar as dívidas.

O que o Dr. Crato quer é ter graça, ser divertido! Quer aliviar a crise com piadas, para que as pessoas se riam, e se sintam um pouco melhor a rir.

Na verdade, o que o Dr. Crato quis dizer foi que é impossível pagar a nossa dívida!

Ao explicar que, só ficando um ano sem comer, (uma impossibilidade biológica que conduziria à morte), é que pagamos a dívida, o Dr. Crato está a dizer que é impossível pagá-la, e portanto temos de procurar outras soluções.

Ou terei sido eu a perceber mal?

Bom, na verdade o que me encanta nisto tudo é que até nas piadas o Governo é mal coordenado.

Então numa semana o Dr. Pires de Lima diz que está a acontecer em Portugal um "milagre económico" e na semana seguinte o Dr. Crato diz que, para pagar a dívida, só ficando sem comer um ano?

Não haverá aqui, por assim dizer, uma certa incoerência nas graçolas? 

Se está a acontecer um "milagre económico" para quê ficarmos todos um ano sem comer?

Ou será esse o "milagre económico", salvar o país conseguindo que ele não coma um ano inteiro?

Vou telefonar ao Ricardo Araújo Pereira, para o avisar para ele se pôr a pau, que este Governo é concorrência forte para ele...

 

publicado por Domingos Amaral às 12:36 | link do post | comentar | ver comentários (2)
Segunda-feira, 04.11.13

O 1640 do Dr. Portas é um divertido delírio!

Na semana passada, Paulo Portas teve um dos seus momentos de delírio, e comparou a saída da "troika" à libertação de Portugal do jugo dos Felipes de Espanha.

2014 seria assim um 1640 financeiro, um momento épico da história do país, onde voltaríamos a ser gloriosamente independentes! 

Estas comparações históricas não deixam de ser divertidas, mas são normalmente um bocado superficiais, e não resistem a um confronto mais pormenorizado com a realidade.

Convém lembrar ao Dr. Portas que, em 1640, Portugal era um reino cujo rei era espanhol.

Depois de umas escaramuças, e de um vazio de liderança por cá, os reis espanhóis tomaram conta disto, e mandavam em nós.

A "ocupação" durou 60 longos anos, e só quando se encontrou um candidato à altura de ser rei de Portugal, é a que a coisa se resolveu, com mais uma guerra pelo caminho.

1640 foi pois um momento de libertação de uma ocupação política, militar e económica.

Ora, que eu saiba, não é isso que se passa em 2013.

Que eu saiba, Portugal não foi invadido pela "troika", contra a sua vontade.

Pelo contrário, foi o país que pediu ajuda, candidatando-se a uma resgate internacional.

E quem é que nos ajudou? 

Bem, que eu saiba, foram países que, como Portugal, fazem parte de uma entidade política comum, a União Europeia.

Que eu saiba, ninguém nos obrigou, pelas armas, a pertencer à União Europeia e ao euro.

Foi uma coisa voluntária, e bastante consensual, por cá.

Não fomos invadidos, nem ocupados, cedemos a soberania porque quisemos, e porque achámos que isso era bom para nós.

Portanto, que eu saiba, a "troika" não representa potências ocupantes, pelo contrário, representa-nos a nós mesmos, e aos nossos aliados e amigos, que responderam ao nosso pedido de ajuda.

É claro que podemos dizer que esses nossos amigos não são muito generosos, e nos obrigam a fazer coisas que nós não gostamos.

Mas dizer que isso é uma "ocupação" semelhante à dos espanhóis, é capaz de ser um pouco exagerado, não é verdade?

Acrescente-se ainda que não tenho notado que este Governo seja contra a "troika".

Bem pelo contrário, desde o primeiro dia disse que queria ir além da "troika"!

O que nos deixa um pouco perplexos, pois se a troika é uma potência ocupante, e queremos libertar-nos dela, talvez seja um pouco complicado de perceber porque é o Governo cumpre rigoramente o que a "troika" manda, e até faz mais do que o mandam.

O estranho é que, se admitirmos o raciocínio de Portas, de que estamos ocupados, então a conclusão lógica é de que Passos e Portas não passam dos meros executores da política de ocupação, e portanto são umas "marionetas espanholas", como foram muitos durante os 60 anos da ocupação dos Felipes...

Mas, a coisa é ainda mais estranha, se pensarmos que, depois de 2014, da famosa "hora da libertação", do Dia da Independência do Dr. Portas, nós vamos continuar exactamente na mesma, a pertencer à União Europeia, no euro, e a ter de fazer tudo o que eles nos mandam!

Não se consegue perceber bem onde é que estará a independência nesse dia, mas se calhar o burro sou eu!

Portanto, o 1640 do Dr. Portas vai ser o dia em que vamos...continuar exactamente na mesma, a receber ordens de Bruxelas!

Os Filipes, caro Dr. Portas, foram-se embora, corridos daqui numa guerra.

Os europeus vão continuar por cá, e a mandar cada vez mais.

Não se iluda, Dr. Portas, o dia da Independência é uma fantasia da sua cabeça.

Os senhores da "troika" podem deixar de cá vir ter reuniões, mas o senhor continuará a andar às ordens da Sra Merkel...  

publicado por Domingos Amaral às 11:30 | link do post | comentar | ver comentários (11)
 

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