Será que vamos mesmo regressar aos mercados?
Uma das crenças sempre muito promovida nos últimos tempos, foi a ideia de que, se o Governo cortasse na despesa e mostrasse convicção reformista, os juros da dívida pública portuguesa iriam descer.
É evidente que existe uma ligação, mas não é assim tão forte, e não explica a maior parte das subidas ou descidas das taxas.
Veja-se por exemplo o que tem estado a acontecer nas últimas semanas.
Apesar dos resultados económicos portugueses terem melhorado, com algum crescimento no segundo trimestre; apesar da queda, embora ligeira ainda, do desemprego; apesar da melhoria constante das exportações; apesar do excelente ano do turismo; apesar disso tudo, as taxas de juro da dívida pública continuam a subir, e tocam já nos 7%.
Mesmo com um esforço do Governo em mostar "credibilidade", mesmo passados os efeitos da crise política de Julho, que apesar de tudo teve uma resolução de estabilidade e continuidade, os mercados financeiros continuam a exigir juros altos a Portugal.
E, o fenómeno não se dá só connosco.
Também outros paíes sentem essa subida, como a Irlanda ou a Grécia, e até um pouco a Alemanha.
Então o que faz subir as taxas, se não é comportamento dos Governos, o que é?
Os mercados financeiros sabem que, a partir do final do ano, e no próximo, vão ser retiradas as compras de obrigações americanas por parte do FED, e sabem que isso vai diminuir a liquidez geral.
Com menos dinheiro nos mercados financeiros, as taxas começam a subir, seja na América, seja em qualquer lado do mundo.
Sobem nos mercados emergentes, provocando crises cambiais na Índia ou no Brasil; e sobem também na Europa, seja em Portugal, seja na Alemanha.
Uma decisão americana importante, embora apenas anunciada e ainda não praticada, provoca logo estes efeitos todos.
E nem as palavras de Mario Draghi, que promete manter as taxas do BCE baixas o tempo que for preciso, tiveram um efeito calmante.
Na Europa, o BCE não compra dívida pública como o FED faz na América, e só pode mexer nas taxas.
No entanto, elas estão próximo de zero, e a eficácia de mais descidas é quase nula.
Assim, com receios de um futuro menos líquido, as taxas da dívida pública sobem, e Portugal fica na embaraçosa situação de não conseguir emitir mais dívida.
Culpa nossa?
Não, nunca foi só culpa nossa, desde 2009 que estes fenómenos sistémicos são mais fortes que os nacionais.
Mas, quem passou anos a dizer que era mérito de Passos o regresso aos mercados, como se fosse apenas o trabalho do Governo que explicasse a descida das taxas, terá dificuldades agora em explicar porque não podemos emitir.
Aqui, no pátio da nossa paróquia, temos a mania de achar que o que fazemos é que é importante.
Os cortes na despesa, os vetos do Tribunal Constitucional; a demissão de Portas; tudo serviu para se construir uma narrativa "nacional" da subida, ou descida, dos juros, colocando o mérito no Governo e o demérito nos juízes ou no imprevisível Portas.
Contudo, essa narrativa peca por defeituosa.
Os juros da nação sobem mais com as acções do FED do que com os amuos de Portas!
Um veto do TC, por mais impacto que tenha, não vale nada ao pé das palavras de um Bernbanke ou de um Draghi.
Os portugueses vivem numa moeda que não controlam e a sua capacidade para influenciar os juros é diminuta.
Mas, ninguém quer aceitar esta evidência.
Para Passos, se não conseguirmos voltar aos mercados, a culpa será sempre do TC ou de outro português qualquer.