Quanto mais Portugal paga, mais deve!

Já reparam que tanto Portugal, como a Grécia e a Irlanda, quando mais dívida pagam, mais devem? Eis, em todo o seu esplendor, a terrível ratoeira em que a Europa colocou os países com dívidas.

Em 2009, o peso da dívida no PIB da Grécia chegava aos 120%. Três anos depois, já ultrapassou os 150%. E quanto mais os gregos pagam, mais devem. O mesmo se passa com a Irlanda, que já pediu ontem para renegociar a dívida, pois assim não consegue pagá-la.

Portugal é caso idêntico, quanto mais paga, mais deve. Em 2011, o peso da dívida no PIB era de 109%, este ano vai acabar perigosamente perto dos 120%, informação oficial dada pelo Ministro das Finanças. Quanto mais pagamos em juro, e mais amortizamos a dívida, mais devemos. 

Chama-se a isto o "paradoxo da desalavancagem", e acontece quando os esforços feitos por um país endividado para reduzir a sua dívida criam um ambiente que agrava ainda mais o seu endividamento. O que acontece é que todos - pessoas, empresas, bancos, Estado - estão tão endividados que têm de cortar as despesas ao mesmo tempo, e isso provoca uma enorme contração económica, gera uma recessão e no final o peso do endividamento é cada vez maior. Quanto mais os devedores pagam, mais devem.

É terrível, mas é assim que está a Europa do Sul. A austeridade selvagem que nos foi imposta pela Sra. Merkel e pela "troika" revelou uma situação complexa: os devedores não podem gastar, e os credores não querem gastar. E como ninguém gasta, caímos todos numa espiral destrutiva de efeitos dantescos.

Mas, não é só este o único paradoxo em acção. Há mais dois de idêntico sentido. O segundo é o "paradoxo da poupança". Supostamente, é boa ideia poupar, ainda por cima em tempos difíceis como os que atravessamos. Contudo, se toda a gente poupar ao mesmo tempo, consome-se menos e a economia encolhe. Mais uma armadilha em que caímos todos, incluindo o ministro das Finanças, Vítor Gaspar, que declarou há tempos que, para sua surpresa, os "portugueses tinham poupado mais do que se previa, e por isso a recessão aumentara". Como se a culpa agora fosse nossa...

Por fim, existe o terceiro, o "paradoxo da flexibilidade". Para este Governo e para a "troika", parece ser necessária uma baixa geral de salários dos portugueses, para recuperarmos "competitividade" e baixar o desemprego, pois as pessoas assim trabalham por salários menores. Pois, mas se toda a gente baixa os salários, ficamos todos mais pobres e gastamos menos, contudo o endividamento continua exactamente o mesmo, e por isso é bem mais difícil pagar as dívidas, sejam as nossas, sejam as do país!

É por causa destes três paradoxos - o da desalavancagem, o da poupança e o da flexibilidade - que a austeridade não funciona nos países do Sul da Europa. Quando já se está dentro de um buraco, é um bocado estúpido continuar a cavar esse mesmo buraco cada vez mais fundo, mas há gente que não quer perceber isto...

Como dizia  Scolari: "e o burro sou eu?"

publicado por Domingos Amaral às 11:22 | link do post | comentar