Sócrates, Passos Coelho, Rui Rio e os dramas da paróquia
Há coisa de dois anos e meio, antes das eleições de 2011, surpreendi muita gente quando defendi que era um bocado indiferente que quem mandasse no país fosse Sócrates ou Passos Coelho.
Com o país sob resgate, obrigado a adoptar um duro programa de austeridade, qualquer que fosse o primeiro-ministro, iria acabar odiado por toda a gente.
Nessa altura, escrevi que Passos Coelho não sabia onde se estava a meter, e que em dois anos seria tão ou mais odiado do que Sócrates já era.
E, como todos sabemos, Sócrates era muito odiado em 2011, e grande parte dos portugueses, à direita ou à esquerda, já não o podia ver à frente.
Apenas dois anos e meio passados sobre as eleições, o que se passa com Passos Coelho?
Pois, infelizmente para ele, é odiado por meio mundo, ou três quartos do mundo, melhor dizendo.
É odiado pela extrema-esquerda, pelos comunistas, pelos socialistas, e por uma parte importante do eleitorado de centro direita.
É odiado pelos jovens, porque não gera emprego; pelos pensionistas, porque lhes corta as pensões; pelos funcionários públicos, porque lhe tira salários, subsídios e ainda lhes aumenta as horas de trabalho; e por muitos trabalhadores privados, que foram parar ao desemprego.
Até já uma parte do seu PSD, começa a rosnar mais alto contra ele, porque conduziu o partido para uma amarga derrota, e não há grandes perspectivas de vitórias num futuro próximo.
Portanto, dois anos e meio depois, os ódios a Passos são tão ou mais fortes que os ódios a Sócrates, e já há quem, no PSD e não só, veja em Rui Rio o "senhor que se segue".
Mais uma vez, as pessoas cometem o mesmo erro, e julgam que mudando de primeiro-ministro, ou de líder do PSD, tudo será diferente e voltarão os dias gloriosos do passado.
Infelizmente, não é assim. O problema não está na paróquia, nem a paróquia tem qualquer capacidade para resolver o problema.
Desde que entrámos no euro, deixámos de ter nas nossas mãos muito poder económico, e passámos a estar integrados num "ecossistema" económico que é muito mais vasto do que nós, e onde não mandamos nada.
A capacidade que o Governo português tem para resolver os problemas económicos do país é muito pequena, e ainda por cima extremamente vulnerável ao que se passa no resto do "ecossistema".
A Alemanha, o BCE, a França, a Itália, a Espanha, ainda podem pensar que mandam um pouco, embora cada uma delas tenha cada vez menos força.
Mas, Portugal, e os outros países pequenos, quase nada podem fazer para mudar o seu destino.
A crise, ao contrário do que sempre nos tem sido dito, não é nacional mas sim europeia.
Como Vítor Gaspar teve a coragem de dizer, agora que já não é ministro, o euro tem falhas graves de construção, e se elas não forem remendadas de nada nos valem os sacrifícios.
Por isso, a capacidade de um governo português para determinar o nosso futuro é para aí 10 por cento.
Os restantes 90 por cento não dependem de Portugal, mas sim da Europa.
É claro que, mesmo nesses 10 por cento, há coisas que podiam ser melhores, tanto Sócrates como Passos cometeram erros graves, e podiam ter evitado tanto mal estar.
Mas, a verdade é que, decidindo a Europa este tipo de ajustamento brutal para os países, qualquer um que lá esteja iria ser odiado.
Rui Rio que se mantenha calmo, e deixe passar esta fase.
Pode ser que um dia a Europa tome juízo e alivie a pressão.
Nesse dia, talvez valha a pena ele pensar em liderar o PSD, mas antes disso não.
Seria apenas mais um cordeiro imolado pela Europa, como foi Sócrates, é Passos, e em breve será Seguro.
Tal como António Costa, Rui Rio tem de saber esperar.
Melhores dias virão...