Quinta-feira, 30.01.14

Os "mercados" são mares nunca dantes navegados!

Quando se discute se Portugal deve ou não ter um programa cautelar ou uma "saída limpa", costuma-se sempre pensar que essa decisão depende da vontade do Governo.

É uma doce ilusão. 

Na verdade, o regresso aos mercados ou o programa cautelar, dependem muito mais das condições dos próprios mercados do que de nós.

É evidente que, se o Governo conseguir manter os números do déficit e da economia dentro ou até acima dos objectivos, isso ajuda e é importante, mas não chega.

Se usarmos uma analogia marítima, podemos dizer que é essencial ter um bom barco, e uma boa tripulação, mas isso não significa que se controle o estado do mar, as tempestades ou as calmarias.

É assim também com o regresso aos mercados: o barco Portugal pode estar em melhores condições, e a tripulação preparada, mas não sabemos como estarão as correntes, se vai haver borrasca ou se as ondas sobem muito até Maio.

Ou seja, essa parte não depende de nós, e nem sequer é possível fazer grandes previsões.

Na passada semana, por exemplo, no mesmo dia que o Governo anunciava um número muito bom para o déficit, as taxas de juro da dívida, em vez de subirem, desciam, por causa da Argentina e dos mercados emergentes!

De um dia para o outro, a turbulência dos mercados logo criou um contexto mais difícil para Portugal.

Ora, até Maio, ninguém sabe o que se vai passar nos mercados financeiros. 

O FED pode cortar os estímulos monetários, a Turquia pode entrar em crise, a Ucrânia pode ir para uma guerra civil, o BCE pode mudar de ideias e subir taxas, etc, etc. 

Os mercados financeiros são sempre mares nunca dantes navegados, e por isso mais vale esperar para ver o que acontece, em vez de decidir à pressa.

publicado por Domingos Amaral às 11:28 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Sexta-feira, 13.12.13

O erro do FMI e o erro de Passos Coelho

Às vezes, é preciso olhar para os números para percebermos a gravidade do que se passou em Portugal.

Eis os números da austeridade, quatro anos depois.

 

Em 2010, o PIB português era de 172,8 mil milhões de euros.

Em 2013, deverá rondar os 164 mil milhões de euros.

Ou seja, a austeridade anulou-nos mais de 8 mil milhões de euros de riqueza produzida em Portugal! 

 

Em 2010, a taxa de desemprego portuguesa foi de 10,8.

Em 2013, a taxa de desemprego portugesa deverá ficar pelos 15,8, um aumento de quase 50%.

Quatro anos de austeridade criaram mais 300 mil desempregados do que havia antes.

 

Em 2010, a dívida pública portuguesa rondava os 160 mil milhões de euros, já incluindo aqui muita coisa que na altura não estava contabilizado.

Em 2013, quatro anos depois, a dívida pública portuguesa está em cerca de 230 mil milhões de euros, um aumento de 70 mil milhões de euros!

É este o resultado de quatro anos de austeridade, Portugal tem mais 70 mil milhões de dívida do que tinha!

 

Em 2010, a taxa de juro da dívida portuguesa no mercado secundário era no início do ano de 5,5%.

Em 2013, a taxa de juro da dívida pública portuguesa é no final do ano de 5,8%.

Ou seja, para curar o trágico perigo das dívidas soberanas, estivemos quatro anos em austeridade, e a taxa de juro é agora mais alta do que quando começámos!

 

A directora do FMI, a sra Lagarde, já admitiu o óbvio, que as políticas de ajustamento cometeram muitos erros, e que os resultados foram muito piores do que se esperava, especialmente em Portugal e na Grécia.

No entanto, por cá temos um primeiro-ministro que continua apaixonado pela ideia da "austeridade expansionista", e que fica muito irritado quando ouve o FMI reconhecer os erros.

Infelizmente, Passos Coelho jamais terá a humildade do FMI, e jamais reconhecerá que as suas políticas, que ele implementou e implementa com entusiasmo, não produziram bons resultados, bem pelo contrário.

Os fanáticos de uma ideia não querem saber da realidade, querem é ter razão!

 

 

 

 

publicado por Domingos Amaral às 11:14 | link do post | comentar | ver comentários (5)
Segunda-feira, 11.11.13

Governo: há as boas notícias...e há o Rui Machete!

O Governo só pode andar contente com as últimas notícias.

O desemprego baixou um pouco, o que é bom.

Pode ser por más razões (emigração), pode ser passageiro (sazonalidade), ou por boas razões (mais turismo).

Mas, ninguém no seu juízo perfeito pode considerar isso mau para Portugal.

As exportações também continuam a crescer bem, o que é bom.

Pode ser porque há uma nova fábrica da Galp, ou porque China está a aumentar a procura, mas ninguém no seu juízo perfeito pode dizer que isso é mau, para Portugal.

As taxas de juro da dívida pública também estão a descer, o que é muito relevante.

Pode ser porque o Banco Central Europeu desceu as taxas, pode ser porque algumas agências de rating mudaram um pouco a sua opinião sobre o nosso país, ou porque o Governo é visto como mais credível.

Mas, ninguém no seu juízo perfeito pode dizer que isso é mau para Portugal.

Embora estes sinais positivos não sejam, nem de perto nem de longe, um "milagre económico", são positivos.

Porém, e infelizmente, o Governo não parece perceber três coisas.

A primeira é que a estratégia para 2013, aumentar o IRS cortando menos da despesa, parece ter sido bem menos negativa do que a estratégia de 2012, onde se cortou salários e pensões.

Ou seja, a austeridade do lado dos impostos é menos gravosa para a economia.

A segunda coisa que o Governo não percebe, é que repetir para 2014 a mesma estratégia de 2012 (cortes fortes nos salários e nas pensões), será um risco muito forte, pois pode gerar uma nova recessão.

Para quê provocar nova recessão quando os sinais de recuperação são relevantes?

Não será, digo eu, pouco inteligente voltar a cometer o mesmo erro que se cometeu em 2012?

Por fim, a terceira coisa que este Governo não parece perceber é que Rui Machete é uma tragédia de relações públicas permanentes!

Este Governo, pelos vistos, precisa de ter sempre uma maçã podre, que vai degradando a sua imagem, sem pressa, mas também sem pausas.

Na primeira fase, foi o inimitável Miguel Relvas.

Agora, é o sempre incompreensível Machete. O pobre ministro não acerta uma!

Agora até se aventurou a falar em taxas de juro, como se fosse ministro da economia ou das finanças! 

É um marreta, que só diz inconveniências, como se fosse uma tia velha que já não tem a noção das coisas...

E curiosamente, Passos parece aturá-lo exactamente como se atura uma tia velha.

Por mera caridade, não o expulsa da sala e não o mete num lar de idosos.

publicado por Domingos Amaral às 14:20 | link do post | comentar
Sexta-feira, 06.09.13

Será que vamos mesmo regressar aos mercados?

Uma das crenças sempre muito promovida nos últimos tempos, foi a ideia de que, se o Governo cortasse na despesa e mostrasse convicção reformista, os juros da dívida pública portuguesa iriam descer.

É evidente que existe uma ligação, mas não é assim tão forte, e não explica a maior parte das subidas ou descidas das taxas.

Veja-se por exemplo o que tem estado a acontecer nas últimas semanas.

Apesar dos resultados económicos portugueses terem melhorado, com algum crescimento no segundo trimestre; apesar da queda, embora ligeira ainda, do desemprego; apesar da melhoria constante das exportações; apesar do excelente ano do turismo; apesar disso tudo, as taxas de juro da dívida pública continuam a subir, e tocam já nos 7%.

Mesmo com um esforço do Governo em mostar "credibilidade", mesmo passados os efeitos da crise política de Julho, que apesar de tudo teve uma resolução de estabilidade e continuidade, os mercados financeiros continuam a exigir juros altos a Portugal.

E, o fenómeno não se dá só connosco.

Também outros paíes sentem essa subida, como a Irlanda ou a Grécia, e até um pouco a Alemanha.

Então o que faz subir as taxas, se não é comportamento dos Governos, o que é?

Os mercados financeiros sabem que, a partir do final do ano, e no próximo, vão ser retiradas as compras de obrigações americanas por parte do FED, e sabem que isso vai diminuir a liquidez geral.

Com menos dinheiro nos mercados financeiros, as taxas começam a subir, seja na América, seja em qualquer lado do mundo.

Sobem nos mercados emergentes, provocando crises cambiais na Índia ou no Brasil; e sobem também na Europa, seja em Portugal, seja na Alemanha.

Uma decisão americana importante, embora apenas anunciada e ainda não praticada, provoca logo estes efeitos todos.

E nem as palavras de Mario Draghi, que promete manter as taxas do BCE baixas o tempo que for preciso, tiveram um efeito calmante.

Na Europa, o BCE não compra dívida pública como o FED faz na América, e só pode mexer nas taxas.

No entanto, elas estão próximo de zero, e a eficácia de mais descidas é quase nula.

Assim, com receios de um futuro menos líquido, as taxas da dívida pública sobem, e Portugal fica na embaraçosa situação de não conseguir emitir mais dívida.

Culpa nossa?

Não, nunca foi só culpa nossa, desde 2009 que estes fenómenos sistémicos são mais fortes que os nacionais.

Mas, quem passou anos a dizer que era mérito de Passos o regresso aos mercados, como se fosse apenas o trabalho do Governo que explicasse a descida das taxas, terá dificuldades agora em explicar porque não podemos emitir.

Aqui, no pátio da nossa paróquia, temos a mania de achar que o que fazemos é que é importante.

Os cortes na despesa, os vetos do Tribunal Constitucional; a demissão de Portas; tudo serviu para se construir uma narrativa "nacional" da subida, ou descida, dos juros, colocando o mérito no Governo e o demérito nos juízes ou no imprevisível Portas.

Contudo, essa narrativa peca por defeituosa.

Os juros da nação sobem mais com as acções do FED do que com os amuos de Portas!

Um veto do TC, por mais impacto que tenha, não vale nada ao pé das palavras de um Bernbanke ou de um Draghi.

Os portugueses vivem numa moeda que não controlam e a sua capacidade para influenciar os juros é diminuta.

Mas, ninguém quer aceitar esta evidência.

Para Passos, se não conseguirmos voltar aos mercados, a culpa será sempre do TC ou de outro português qualquer.  

publicado por Domingos Amaral às 11:36 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Terça-feira, 07.05.13

A estranha ligação entre os juros da dívida e o Tribunal Constitucional

Aqui há um mês, quando o Tribunal Constitucional vetou algumas das decisões do Governo para 2013, caiu o Carmo e a Trindade.

Que era uma ditadura do TC, que era inadmissível que o Governo não pudesse governar, que a imagem de Portugal ia ficar em risco, sei lá que mais.

Passos Coelho, numa comunicação televisiva ao país, chegou a culpar o TC por um eventual segundo resgate, alegando que a sacrossanta credibilidade de Portugal estava em causa, e que os mercados iam de novo desconfiar de nós. Ainda se lembram disto?

Pois, passado um mês, o que aconteceu às taxas de juro da dívida portuguesa, de curto, médio ou longo prazo? Seria de esperar que subissem! Mas, bem pelo contrário, desceram e muito! 

Em que ficamos? Os mercados são malucos? Então um Tribunal Constitucional abre um rombo de 1,3 mil milhões de euros no orçamento e os mercados acham bem? Então e o melodrama que Passos Coelho fez, o que é que lhe aconteceu? 

A relação entre as políticas orçamentais e os juros da dívida pública parece um bocado esquizofrénica. Quando há decisões de austeridade, a gente espera que as taxas desçam, e as sacanas sobem! E quando há decisões anti-austeridade, a gente espera que as taxas subam, e as sacanitas descem! É preciso descaramento! 

Querem exemplos concretos? Nos últimos três orçamentos austeritários de Estado - 2011, 2012, 2013 - na mesma semana em que Portugal aprovava no seu parlamento esses orçamentos, as taxas de juro da dívida em vez de descerem, como deveria ser, pois o país estava a provar que ia fazer cortes, subiram!

E agora isto: o TC abre um buraco orçamental, e as taxas em vez de subirem, desconfiando das capacidades do país de cumprir as suas metas, toca de desatarem a descer. Mas os mercados acham que somos a Alemanha, ou piraram de vez?

Na verdade, tudo não passa de um enorme equívoco. No caso de países pequenos, como Portugal, as taxas de juro da dívida pouco têm a ver com a actuação dos respectivos Governos. Façam eles mal ou bem, as taxas não lhes ligam patavina. Só querem saber o que faz o Banco Central Europeu, o resto é conversa.

O mundo da alta finança, e bem, dá muito mais importância ao senhor Draghi, do que ao errático Vítor Gaspar.   

publicado por Domingos Amaral às 11:08 | link do post | comentar
 

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