Quarta-feira, 10.10.12

Pequeno Dicionário do Governo

Como já devem ter reparado, este Governo é muito original na forma como comunica as suas medidas. Nas últimas semanas, ouvimos expressões como "mitigar", "modelar", "afinar", "rebalancear", "calibrar" ou "regressar aos mercados". É um léxico novo e rico, aquele que o Governo nos tem oferecido. No entanto, é preciso ter alguma atenção, pois a maior parte destas expressões não têm apenas um significado literal, mas também um significado escondido, e é preciso decifrá-lo. Aqui deixo pois um curto dicionário do Governo.

 

Afinar - usado na expressão "vamos afinar essa situação". Significa que é preciso aperfeiçoar uma medida para ela ser mais eficaz. Na prática, o que isto quer dizer é que o Governo vai tentar tramar-nos o mais possível da forma mais eficaz possível. Ex: "Ó Sr. Rudolfo, vou afinar a sua retenção na fonte, que ainda está abaixo do que deve ser".


Afinco - usado na expressão "vamos trabalhar com afinco". À primeira vista significa esforço, dedicação, e soa bem.  Contudo, o que o Governo quer mesmo dizer é que vai trabalhar entusiasticamente para encontrar mais formas de nos esmifrar. Ex: "Ó Zé, no próximo 5 de Outubro, vens para a oficina com afinco!"


Ajustamento - usado em "Portugal está a conseguir fazer o seu ajustamento". Significa que estamos a deixar de ter déficit externo, a consumir menos importações, e deveria significar que o Estado está a baixar o seu déficit. Contudo, o que verdadeiramente significa a palavra ajustamento é que estamos a viver cada vez pior, e são os portugueses que estão a fazer o esforço todo, enquanto o Estado continua na mesma cepa torta. Ex: "Ó menina Carla, com o ajustamento acaba-se o carro de empresa e passa a vir trabalhar de metro!".


Balancear - usado na expressão "vamos balancear essa medida". Significa que o Governo admite alterar uma determinada taxa, por exemplo a TSU, em relação ao que tinha inicialmente anunciado. Contudo, o verdadeiro significado da expressão é que o Governo começou finalmente a perceber que foi longe demais, mas é teimoso, e ainda só admite pequenas mudanças e não deixar cair a medida. (ver também Rebalancear). Ex: "Ó filho, parece-me que temos de balancear a tua marmita, é pequena para lá caber o almoço todo!"


Calibrar - É semelhante às expressões "afinar" ou "modelar", mas é menos grave do que "balancear" ou "rebalancear", pois aí já se percebeu que a medida vai mesmo cair. Ex: "Ó dona Adelaide, como seu patrão, já calibrei a sua TSU com a minha, e isto é um sarilho, não me parece boa ideia..."


Consolidar - usado na expressão "Portugal tem de consolidar as suas finanças públicas". Significa que temos de diminuir o déficit, mas na prática o que isto quer dizer é que vamos todos pagar mais impostos, e as despesas do Estado vão continuar sem serem cortadas. Ex: "Ó Chico, vou consolidar a tua sobretaxa extraordinária todos os meses, ok?"


Cortar - usado em "cortar na despesa". Significa que o Governo quer diminuir a despesa do Estado, mas como não tem coragem para cortar em muitas áreas, o verdadeiro significado da expressão é "cortar nos subsídios dos funcionários públicos e dos pensionistas". Ex: "Ó Cátia, preferes que eu te feche o instituto ou te corte o subsídio da Natal?"

 

Mitigar - usada em "vamos procurar mitigar o aumento de impostos". Significa que o Governo pretende encontrar soluções alternativas que permitam que os impostos não subam tanto. Na realidade, o que isto significa é que algum qualquer sector de actividade se vai tramar para que uma qualquer taxa do IRS não suba um qualquer meio ponto percentual. Ex: "Ó Vanessa, mitigas aí a falta de chouriço no caldo verde com mais couves?" 


Modelar - ninguém sabe o que significa, mas parece bem. Mexe-se numas taxas e já ninguém protestará tanto. Na verdade, quando se fala em modelar uma medida, ela já está com os pés para a cova e vai ser abandonada em breve, como se passou com a TSU. Ex: "Ó meu amor, vamos ter de modelar essa ida às Caraíbas, em vez de oito dias só vamos três ou quatro..."


Rebalancear - usado em "vamos rebalancear essa medida". Significa que o Governo já percebeu que tem mesmo de alterar uma medida, mas ainda não está preparado psicologicamente para o dizer. (ver Balancear). Ex: "Ó meu amor, vamos ter de rebalancear essa ida às Caraíbas, em vez de quatro dias só vamos dois..."


Remodelar - usado em "remodelar o Governo". Significa trocar de ministros, o que é algo que para este Governo está fora de questão, e portanto vamos ter de continuar a gramar com o Relvas e o seu sorrisinho. Ex: "Ó Sr. Padre, em bem queria, mas não posso remodelar o Manel, ele é meu marido, sabe todos os segredos da minha vida."


Recuar - expressão que o Governo desconhece. Mesmo quando recua, o Governo não recua, apenas avança noutra direção. Ex: "Ó Joana, se não levas por trás, levas pela frente..."

 

Regressar ao mercado - usado na expressão "Portugal conseguiu regressar aos mercados". Significa que Portugal já conseguiu convencer os credores a comprarem mais dívida pública. Na verdade o que isto quer dizer é que os políticos portugueses vão voltar a poder contrair mais dívida e com isso voltar a arruinar o país só para ter mais autoestradas e submarinos. Ex: "Ó Aninhas, estou farto de fazer dieta, temos de regressar ao mercado para que eu possa comer como mereço". 

publicado por Domingos Amaral às 11:29 | link do post | comentar
Quinta-feira, 27.09.12

Gasparzinho na Boca do Inferno Já!

O Ministério das Finanças confirmou esta semana oficialmente que o rácio da dívida sobre o PNB está nos 119%. Em 2010, o mesmo rácio era cerca de 100%, ou seja a divida pública, ou "dívida soberana", era idêntica ao PNB de Portugal num ano. Em 2011, com a aceleração da austeridade, o rácio subiu para cerca de 107%. E em 2012 pulou para 119%, o que cada vez mais torna impraticável o pagamento da dívida. Devemos portanto levantarmo-nos e dar um grande e geral aplauso ao Ministro das Finanças, que apenas num ano conseguiu agravar uma recessão, aumentar o desemprego, diminuir a receita fiscal, aumentar o deficit orçamental e, cereja em cima do bolo, tornar a dívida pública cada vez mais pesada e praticamente impossível de pagar! Parabéns Gasparzinho! Acho que mereces uma estátua de bronze! E sugiro que a coloquemos ali em Cascais, na Boca do Inferno. É um local muito apropriado para o Gasparzinho, pois é para onde ele conduziu o país, direitinho para a Boca do Inferno!

publicado por Domingos Amaral às 14:12 | link do post | comentar | ver comentários (2)
Quarta-feira, 12.09.12

Os "modelos" do Gaspar

Ontem, o ministro das Finanças, durante a conferência de imprensa que deu, falou por várias vezes nos "modelos" que tinham sido usados e que previam bons resultados com as alterações na TSU e na contribuição para a segurança social dos trabalhadores. Segundo ele, os "modelos" apontavam para melhorias económicas significativas no próximo ano e ainda mais significativas no ano seguinte. Ao ouvi-lo, assaltou-me uma terrível dúvida. Será que estes "modelos" são os mesmos "modelos" que previam para este ano uma melhoria das receitas fiscais que nunca se verificou, bem pelo contrário; os mesmos "modelos" que previam para 2012 quebras no PNB muito menores do que aquelas que se verificaram; os mesmos "modelos" que nunca previram um agravamento tão forte do desemprego? É que são os mesmos "modelos" estamos bem tramados, e o ministro Vítor Gaspar também. 

publicado por Domingos Amaral às 17:48 | link do post | comentar | ver comentários (1)
 

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