Segunda-feira, 08.07.13

A segunda grande utopia do euro

O euro não é uma união monetária, mas sim uma ilusão monetária.

Ou melhor, o euro são duas grandes utopias, duas ilusões monetárias.

A primeira ilusão, a primeira utopia, foi a de que os países, ao entrarem no euro, iriam ser prósperos, o seu crescimento económico ia aumentar e sobretudo, as suas finanças públicas iriam ser disciplinadas.

Como se viu, nem dez anos foram precisos para destruir esse monumental mito.

O euro não espalhou a prosperidade na Europa, não provocou grande crescimento económico na maioria dos países, e quanto à disciplina das finanças públicas dos orçamentos dos 17, estamos conversados.

O que o euro permitiu a todos foi uma ilusão monetária, a de que com baixas taxas de juro podíamos ser todos ricos.

O resultado está à vista, em quase todos os países da Europa o sistema financeiro desequilibrou, e a partir de 2008 descobriu-se um precipício de dívidas.

Todos - pessoas, empresas, bancos, Estados - se endividaram demais na zona euro, e todos acabaram em pânico.

Os monstros das dívidas públicas, ou soberanas, são apenas a ponta visível do iceberg da dívida, porque se olharmos mais fundo descobrimos que a dívida privada é bastante mais alta que a pública.

Mas, mal a crise rebentou, e principalmente a partir de 2010, uma nova ilusão, uma nova utopia, poderosa e intensa, se instalou na zona euro.

De um dia para o outro, todos quiseram acreditar na ilusão de que, com muito sacrifício, era possível pagar a colossal dívida. 

Oficialmente, a Europa mantém viva essa ilusão, e continua a tentar que os povos europeus acreditem que, com "ajustamentos" e "austeridade", é possível aos países pagarem as suas dívidas.

Grécia, Portugal, Irlanda, Chipre, até a Espanha e a Itália, são agora as principais vítimas dessa tremenda ilusão do euro.

Na verdade, as dívidas desses países não são pagáveis pelos próprios. Portugal, Irlanda, Grécia e Chipre, pelo menos estes quatro, não têm qualquer hipótese de pagar as suas dívidas.

Nem 100 anos de austeridade tornariam possível tal objectivo, e no entanto a Europa não quer deixar cair a ilusão.

O estado de negação europeu é preocupante, pois há muito que quem estuda a história destes "ajustamentos" sabe que eles raramente funcionam, e quando funcionam é porque os países têm uma moeda para desvalorizar, o que não é o caso.

Assim sendo, a austeridade deprime os países, aumenta o desemprego, e no fim eles ainda têm dívidas maiores do que tinham no início!

É o "paradoxo da dívida" em todo o seu esplendor. Quanto mais sacrifícios fazemos, mais cresce a dívida em percentagem do PIB! 

Além disso, e como já aqui escrevi muitas vezes, além da violência económica destes programas, há os desequilíbrios sociais e políticos que geram.

A maior parte dos programas de "ajustamento" dos últimos 50 anos falhou porque os sistemas políticos não aguentaram, e entraram em convulsão.

Nós portugueses, temos a tendência para olhar apenas para o pátio da nossa paróquia, e achar que tudo isto não passam de incompetências dos Passos, erros dos Sócrates, birras dos Portas, ou fanatismos dos Gaspares.

Até certo ponto, a dimensão nacional de cada crise é verdadeira, mas só é compreensível se percebermos o contexto, e esse chama-se "armadilha da dívida". 

É essa armadilha que sabota os sistemas políticos nacionais, e os desequilibra, e é por causa dela que nascem as crises. Que se vão repetindo, com maior ou menor gravidade, mas sem fim à vista. 

A segunda grande utopia do euro, a utopia redentora e sacrifical, que nos dizia que os "ajustamentos" iam resolver o problema, está a começar a estilhaçar-se à nossa frente com violência.

Na verdade, os ajustamentos não nos fazem sair da armadilha da dívida, pelo contrário, ainda nos atam mais os pés.

Para sair desta armadilha, só há duas formas. A primeira é não pagarmos a dívida, o que é desastroso e humilhante, mas já aconteceu muitas vezes em muitos países europeus, que beneficiaram de enormes perdões.

A segunda forma possível é a Europa "mutualizar" a dívida, libertando os pequenos países dessa carga. 

Uma dessas alternativas terá de existir nos próximos tempos, ou o perdão ou a mutualização.

Quem pensar o contrário, e acreditar que a austeridade nos vai permitir pagar a dívida, continua a não viver na realidade.

O melodrama da semana passada teve uma única virtude. Com novas funções, Paulo Portas passará a coordenar as negociações com a "troika", o que abre um importante oportunidade.

É essencial que a Europa perceba que tem de mudar o paradigma, passando do "ajustamento" para a resolução da "dívida". 

Talvez Portas consiga explicar à Europa que esmifrar mais Portugal e outros países não leva a lado nenhum. 

publicado por Domingos Amaral às 11:38 | link do post | comentar
Sexta-feira, 05.07.13

Os ataques furiosos a Paulo Portas dão-me vontade de rir

Churchill dizia que na guerra só se pode morrer uma vez, mas na política pode morrer-se várias vezes, e por isso ele preferia ser político.

Ao ler a imprensa neste dias, e ao ouvir muitos comentadores na televisão, parece que Portas já morreu, politicamente.

Mais, parece-me mesmo que há muita gente com vontade de o matar, tal é a fúria e a raiva contra a sua demissão. 

Curiosamente, formou-se nos últimos dias uma enorme "aliança anti-Portas", que consegue o inesperado feito de ser muito mais convicta do que era a aliança pró-governo, que também existia.

De repente, mesmo os que, no centro-direita, diziam mal deste Governo, agora já o desejam em funções, e urram contra Portas, chamando-lhe todos os nomes.

Quem compõe esta inesperada aliança anti-Portas?

Bem, em primeiro lugar, o PSD, com as suas múltiplas cabeças falantes.

Marcelo, Jardim, Marques Mendes, até Santana, já vieram esta semana atacar violentamente o líder do CDS, eles que em certos casos, passaram dois anos a criticar o governo...Mas pronto, o PSD é assim, os seus líderes são maus, mas a culpa é sempre de Portas e do seu carácter!

Em segundo lugar, aparece a direita dos interesses, a direita da finança, furiosa e assustadissima com as consequências. Então não é que o malfadado Portas vai pôr em causa o nosso dinheirinho? Ai jesus, olhem para as taxas de juro! 

Esta direita está obviamente a borrifar-se para o facto de existirem mais de 1 milhão de desempregados, o país estar em recessão profunda, o deficit estar nos 10,6%, a carga fiscal estar a esmagar os portugueses, e a dívida já ir nos 127% do PIB. Que interessa isso? Desde que o nosso dinheirito não esteja em causa...

Segue-se a direita da "Lei e da Ordem", formada por pessoas muito sérias e responsáveis, que quer dar boa imagem do país, e sempre achou Portas um líder imprevisível e amalucado.

Para esta direita, não se podem admitir "birras" destas. As pessoas sérias não se portam assim, isso é coisa de maluquinhos. Pois...

A acrescentar a toda esta tropa, há ainda uma espécie nova, recém-nascida, que é a dos "comentadores de direita". É aqui que se encontra a maior ferocidade anti-Portas, e têm-se escrito nos jornais insultos como eu nunca tinha visto sobre ninguém.

Os Camilos, os Tavares, os Raposos, os Guerreiros, pegam nas suas augustas penas (ou teclados) e desatam a insultar: "idiota", "fedelho", "traidor", e por aí fora, a ver quem vence o campeonato do insulto fácil. E ainda dizem que a net é só insultos...Pelos vistos, o estilo rasquinha da net chegou à imprensa "mainstream" e respeitável.

Contudo, esta estranha aliança, este estranho unanimismo "politicamente correcto da direita", tem sido bem fraquinho nos argumentos. Quase só ataca o carácter de Portas, nesta coisa muito tuga que é discutir o acessório e o teatral para não ter de discutir o essencial.

A todos escapa um ponto importante: é que as divergências entre Portas e Passos são profundas e tocam em quatro áreas fundamentais.

Portas está contra a política económica deste Governo, e quer que ela mude. Já percebeu que a austeridade não funciona, e que só mudando a política se salva o país.

Portas está contra o alinhemento internacional de Portugal com a linha dura da Alemanha e da austeridade, e quer uma postura negocial diferente com "esses senhores" da troika, como ele lhes chama.

Portas está contra a relação de poder absloutamente desquilibrada que Passos estabeleceu entre o PSD e o CDS, que é insultuosa e humilhante.

Por fim, Portas está contra o "estilo de liderança" de Passos, arrogante e unilateral.

É evidente que, para que todos percebessem que chegou a hora da verdade, era preciso tomar uma atitude drástica. Passos Coelho, em dois anos, nunca quis saber desses "detalhes".

Porém, quem não percebe a bem, percebe a mal.

É por isso que estes furiosos ataques a Portas me dão vontade de rir. Todos, de uma forma ou de outra, têm passado o último ano a criticar Passos. Mas quando alguém quer mudar verdadeiramente as coisas, toca de o insultar e matar em público.

O que vale é que, como dizia Churchill, em política se pode morrer muitas vezes.  

publicado por Domingos Amaral às 10:11 | link do post | comentar | ver comentários (12)
Segunda-feira, 29.04.13

Portas e Gaspar: chegou ao fim o casamento de conveniência?

Segundo li no Expresso, o último conselho de ministros, de sexta-feira passada, foi um sarilho de Estado. De um lado, Vítor Gaspar, sempre fiel ao seu fanatismo austeritário; do outro um novo grupo, formado por vários ministros do PSD e encabeçado por Portas.

Rezam as crónicas que este último terá ameaçado demitir-se, se os cortes propostos por Gaspar fossem avante. E, no braço de ferro que aconteceu na reunião, Portas tinha com ele, não só os ministros do CDS, mas também quatro ministros do PSD, porque afinal ainda há gente lúcida naquele partido.

Paulo Macedo, Paula Teixeira da Cruz, Aguiar Branco e Álvaro Santos Pereira, todos defenderam que a austeridade louca com que Gaspar se prepara mais uma vez para brindar o país, é uma tragédia e não trará nada de bom, nem a Portugal, nem ao Governo.

Cortes e mais cortes, nos salários e nas pensões, como propõe o fanático Gaspar, só trarão mais recessão e desemprego, e afundarão na desgraça e na miséria o povo. 

É bom saber que há gente no Governo que tem a noção das coisas, mas parece-me que isso, sendo boa notícia para o país, não augura nada de bom para este Governo.

É que Passos Coelho está ainda demasiado inclinado para apoiar Gaspar. Ambos têm sido paladinos intensos da austeridade "à la Merkel". Quase que se pode dizer que a Alemanha tem em Passos e Gaspar os seus mais fiéis escudeiros.

Quando, por essa Europa fora, se vão multiplicando as vozes que gritam contra a loucura da austeridade, desde Barroso a Schultz, desde a Grécia à Irlanda, desde a França à Itália, é espantoso de ver como só Passos e Gaspar ainda defendem a via germânica.

Cada vez mais isolados, Passos e Gaspar são completamente subservientes perante a Alemanha de Merkel e Schauble, e fazem tudo o que eles defendem ou mandam.

Contudo, são eles que nos governam. Passos é o número 1 e Gaspar o número 2, o restante Governo terá de se submeter às suas vontades, e portanto à visão germânica que postula a continuação de uma austeridade feroz.

Os ministros Macedo, Cruz, Branco e Pereira bem podem espernear e guinchar contra Gaspar, mas não conseguem alterar a sua determinação. Ou se submetem ou são substituídos, essa é que é essa.

Quanto a Paulo Portas, já vimos este filme umas vezes. Se lhe perguntarem se está de acordo, dirá que não está. Se lhe perguntarem se tentou alterar o rumo das coisas, dirá que tentou. Se lhe perguntarem se no final acabou por aprovar tudo, acabou por aprovar tudo.

Por mais murros na mesa que Portas dê, por mais ameaças que faça, já sabemos que, no final, lá acabará por ir a reboque de Passos e Gaspar, e marcará mais umas viagens pelo mundo para promover os nossos azeites, chouriços e produtos afins.

A vida é o que é, e as pessoas são o que são, e não há ainda em Portas a força para traçar uma linha vermelha e dizer: daqui não passam.

Era melhor para Portugal que Portas acabasse com esta farsa de uma vez por todas e esclarecesse o país que, ou Gaspar saía do Governo e as políticas mudavam, ou saía ele.

Porém, não creio que Portas seja capaz de tal acto de coragem histórica. O casamento de conveniência entre este PSD e este CDS, embora já degradado e triste, infelizmente para todos nós, deverá continuar.

Um dia, muita gente se irá arrepender de não ter tido a coragem de dizer não a este desastre que se abateu sobre Portugal. Mas, parece-me que esse dia ainda não será amanhã, data de um novo conselho de ministros onde se afundará, mais uma vez, o país. 

publicado por Domingos Amaral às 10:28 | link do post | comentar
Segunda-feira, 15.04.13

Portas: a sua vitamina E(de economia) não está a funcionar!

Tenho lido por aí que a verdadeira razão pela qual Paulo Portas não foi no sábado à tomada de posse dos novos ministros, não foi por estar longe de Lisboa, mas sim por estar "amuado".

Como a remodelação do Governo não foi mais profunda, e o CDS não foi bem tratado por Passos, Portas fez uma pequena birra.

É bem possível que assim seja. Quem tenha seguido com alguma atenção os últimos meses de Portas, descobriu certamente uma tendência florescente na sua actividade ministrial: a sua enorme vocação para a Economia.

A maior parte das aparições de Portas pelo mundo, do Brasil ao Dubai passando pela Índia e pela Comporta, incluem intervenções de política económica.

Ele gaba as exportações nacionais, a sua vitalidade e o quanto são essenciais; e ele exorta os estrangeiros a investir, declarando que este é o melhor momento para isso.

Lá fora e cá dentro, há mais de um ano, Portas pratica um permanente discurso económico positivo, tentando apontar a luz ao fundo do túnel.

Na verdade, ele apresenta-se como um farol da esperança económica, usando uma espécie de kriptonite verbal para estimular os desanimados indígenas, ou administrando-lhes doses de Vitamina E (de economia), que revitalizem e relancem o país. 

Dessa forma, Portas procura ser o contraponto de Vítor Gaspar. Enquanto Gaspar lança impostos, Portas lança investimentos; quando Gaspar deprime, Portas anima; sempre que Gaspar massacra os portugueses com mais austeridade, Portas tenta aliviá-los dessa canga. Se Gaspar é o pólo negativo das pilhas do Governo, Portas tenta ser o positivo.

Em termos de imagem isto tem funcionado, e Portas tem subido nas sondagens, mas na realidade as coisas são menos eficazes. Por mais que Portas tente espevitar a economia com infusões de optimismo e exportações para o resto do mundo, a verdade é que na terra natal o efeito Vitamina E pouco se sente, tal é a enxurrada de austeridade que Gaspar promove, com a benção e o apoio de Passos.

Além disso, os discursos de Portas tornaram evidente o seu oculto desejo: ser Ministro de Estado e da Economia. Era uma espécie de brinde 2 em 1. Por um lado, Portas era promovido na hierarquia do Governo, por outro e com a ajuda do seu talento, rapidamente se transformaria num "ministro do Bom Estado da Economia", dando agradáveis notícias a todos, baixando IRC´s, semeando investimentos e colhendo exportações, aplicando um choque vitamínico E Super Plus ao nosso tão mal-tratado país.

Contudo, é melhor Portas tirar esse cavalinho da chuva, pois tal nunca irá acontecer. Passos Coelho não é ingénuo e não vai entregar o ouro, não ao bandido, mas ao parceiro da coligação. Dar ao CDS a pasta da Economia seria convocar a tragédia para o PSD e para o Governo, e é fácil perceber porquê.

Desde Setembro de 2012, com a questão da TSU, que se tornou clara a guerrilha de Portas às ideias de Gaspar, que o "enorme aumento de impostos" que se seguiu só serviu para amplificar. Portas está contra a estratégia "hard line" de Gaspar na austeridade, e tudo tem feito para a minar.

Dar-lhe a pasta da Economia seria transformar uma guerrilha de atrito numa guerra aberta. Ministro de Estado e da Economia, Portas teria um poder de fogo enorme para afrontar Gaspar e tentar, a prazo, correr com ele.

Ora, Passos não vai cair nessa armadilha. O primeiro-ministro, mal ou bem, confia em Gaspar e nada fará para o afrontar ou incomodar. Dar a Portas a Economia seria transformar cada conselho de ministros numa arena semanal de luta entre a Vitamina E, de Portas, e a Quimioterapia Financeira, de Gaspar. Tal batalha de gigantes só causaria desgaste interno e cisões profundas no Governo, podendo acelerar o seu prematuro fim.

Assim sendo, Portas terá de se contentar com minúsculas retaliações cirurgícas, enquanto incentiva os queixumes públicos do leal escudeiro Pires de Lima, e viaja pelas Arábias a vender azeites, vinhos ou chouriços.

A Vitamina E de Portas tem os limites que Passos deixa, não os que Portas quer...

 

publicado por Domingos Amaral às 11:19 | link do post | comentar | ver comentários (4)
Sábado, 06.04.13

As quatro opções de Passos Coelho

Perante a decisão do Tribunal Constitucional, ontem conhecida e que foi na direção esperada, o primeiro-ministro Passos Coelho tem quatro opções. A saber:

 

1 - Desdramatizar e continuar no mesmo rumo.

É a opção defendida por Eduardo Catroga. O Governo aceita a decisão, embora não esteja de acordo, e procura novas medidas, sobretudo para 2014, para cortar no deficit. Pelo caminho, Passos pode substituir algumas peças do Governo, remodelando um ou dois ministros, mas mantém o rumo da política económica, ou seja, mantém Vítor Gaspar. Esta é a opção preferida pela "troika" e sobretudo pela Alemanha, que não quer mais crises na Europa até Setembro, data das eleições alemãs. Para Portugal, há óbvias vantagens de credibilidade internacional nesta opção, embora internamente seja mais do mesmo: mais impostos em 2014, mais cortes, mais recessão. 

 

2 - Desdramatizar, mas mudar o rumo.

É a estratégia defendida por Marcelo Rebelo de Sousa. O Governo aceita a decisão do TC mas aproveita-a para uma alteração fundamental da sua estratégia política e económica. Muda-se o discurso da austeridade a todo o custo, e passa-se a defender o crescimento económico com medidas que o apoiem. Há uma remodelação profunda do Governo, com a saída de Vítor Gaspar o mais depressa possível, e a chegada de outro ministro das Finanças com ideias menos radicais. Era a melhor solução para Portugal, mas ninguém acredita que Passos a implemente, pois ele olha ainda para Gaspar como se ele fosse um deus na Terra.

 

3 - Dramatizar, demitir, e ir para eleições em AD

É uma estratégia radical, que passaria pelo discurso da impossibilidade de governar nestas condições e pela necessidade de uma nova legitimidade eleitoral. Passos demitia-se e pedia ao Presidente da República para convocar eleições para Junho, e pelo caminho fazia uma coligação pré-eleitoral com o CDS-PP. Essa nova AD apresentava-se a eleições com Gaspar como o seu homem forte das Finanças, e fazia campanha contra tudo e contra todos, contra o PS e contra Sócrates, contra a esquerda e contra o Tribunal Constitucional. É obviamente uma estratégia de alto risco, mas podia funcionar. É provável que, em AD pré-eleitoral, Passos e Portas conseguissem ficar à frente de António José Seguro e do PS. No dia seguinte às eleições, ou a AD tinha maioria absoluta e continuava a governar mas com muito mais força e legitimidade; ou a AD não tinha maioria absoluta e então teria de governar com o PS, que por essa altura já teria outro líder...

 

4 - Dramatizar, demitir e ir para eleições cada um por si

É também uma estratégia radical, com a demissão e convocação de eleições, mas sem uma AD entre Passos e Portas. Neste caso, parece-me que isso seria entregar o ouro ao bandido, ou seja, nesse caso o mais provável é o PS de Seguro ficar à frente do PSD, embora sem maioria absoluta. Seria o fim de Passos, e o PSD teria de encontrar um novo líder que conseguisse ir governar com Seguro e Portas, numa grande coligação a três. É pouco provável que este caminho suicida seja escolhido pelo PSD, mas nunca se sabe...

publicado por Domingos Amaral às 12:51 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Quarta-feira, 03.04.13

Se parece um nabo, normalmente é um nabo!

Os americanos têm um excelente provérbio: quando algo se parece com um pato, anda como um pato e grasna como um pato, é porque é um pato!

É isso que eu sinto nos últimos tempos em relação a António José Seguro: se parece um nabo, se age como um nabo e se fala como um nabo, então se calhar é porque António José Seguro é mesmo um nabo!

Depois de um Outono razoável, Seguro perdeu-se durante o Inverno e está a evidenciar uma nabice pura com a chegada da Primavera. Não sei se terá sido a pressão de António Costa ou a do regresso de Sócrates que o desequilibrou, mas a verdade é que ele todos os dias me parece menos capaz.

Seguro anda atarantado. Num dia lança uma moção de censura, sem dizer quando, e pede eleições antecipadas, sem dizer para quando. No outro, grita que quer renegociar o memorando com a troika. Mas, no entretanto, escreve cartas à mesma troika, para que ela não se assuste com a "instabilidade", dando garantias de ferro sobre a sua fidelidade aos compromissos internacionais. 

Por um lado, grita contra a austeridade, mas por outro, desestabiliza o país, falando em eleições antecipadas. Com que propósito? Estará o PS de Seguro convencido de que ganhava as eleições agora, se elas fossem convocadas por Cavaco, por exemplo para Junho?

Se assim é, convém alguém dizer a Seguro que, com ele à frente do PS, essa garantia não existe, bem pelo contrário. A julgar pelas sondagens, o país não tem grande crença no António José. 

Por outro lado, e embora Passos sempre tenha dito que ia governar sem pensar nas eleições, essa é uma declaração datada. Se a decisão do Tribunal Constitucional for muito dolorosa para o Governo, obrigando-o a alterar de cima a baixo o orçamento, Passos pode bem despoletar uma crise, e alegar que assim não consegue governar o país. E depois?

Bom, e depois preparem-se para a nova AD. Sim, preparem-se, pois o mais certo é Passos e Portas fazerem uma aliança pré-eleitoral, com listas conjuntas, e apresentarem-se unidos às eleições, contra Seguro e o seu PS. 

Se há coisa que tem sido óbvia no último mês é a permanente aproximação do CDS ao PSD. Depois da crise da TSU e curadas as feridas, há agora entre Portas e Passos muito mais em comum, pois Passos já percebeu que sem Portas vale muito menos. A arrogância inicial de Passos esbateu-se na dureza da crise, e ele precisa cada vez mais do CDS.

Pé ante pé, o centro-direira juntou-se sem quase darmos por isso. Aliás, o regresso intempestivo de Sócrates só ajudou ao clima de pré-união. O ódio que existe nas bases do PSD e do CDS a Sócrates unificou o centro-direita, é uma cola poderosa como nenhuma outra.

E alguém duvida que, irmanados e aliados numa AD, Passos e Portas teriam mais votos do que Seguro e o seu PS? Acho que não há dúvidas. Com uma AD pré-eleitoral, Passos e Portas podiam não ter maioria absoluta, mas ficariam sempre à frente do PS de Seguro. Depois, poderiam até chamá-lo para um governo a três, mas sempre com o PSD a comandar. É isso que Seguro quer?

Se não é, parece. Esta moção de censura que hoje se vota é uma tontaria. Pedir eleições neste momento é um erro colossal do PS de Seguro. Se as eleições fossem convocadas agora, uma AD ganhava sempre ao PS de Seguro, e ficava quase tudo na mesma. Para quê então perder tempo em eleições?

 

PS: É claro que o PS pode sempre deixar cair Seguro e apresentar António Costa às eleições, mas um golpe de teatro desses é capaz de ser agora mais difícil...E também não é certo que Costa vencesse uma AD unida.

 
publicado por Domingos Amaral às 12:03 | link do post | comentar | ver comentários (6)
Terça-feira, 16.10.12

Falcões e Pombas

Quando Kennedy era presidente americano, inventou-se uma divisão política dentro da sua administração, a propósito da crise dos mísseis de Cuba. De um lado, existiam os "falcões", que defendiam uma intervenção radical, uma linha dura, que preferia o conflito. Do outro, estavam "as pombas", que propunham uma linha mais moderada e razoável, que preferia a diplomacia. Foi uma famosa divisão, e a partir dessa data, em muitos assuntos quase sempre se consegue dividir o mundo entre "pombas e falcões". Na actual crise, europeia e portuguesa, há "falcões" da austeridade e "pombas" orçamentais, há "falcões" de esquerda ou de direita e há até pessoas ou instituições que mudaram de campo, há um ano eram "falcões" e agora já são "pombas". Aqui vai a minha divisão:

 

"Falcões de direita" - São aqueles que defendem a linha dura, a austeridade a todo o custo como única forma de sair da crise, o "aumento enorme" de impostos deste orçamento. Em Portugal, este grupo é encabeçado pelo primeiro-ministro, Passos Coelho, tem em Vítor Gaspar o seu campeão, e em António Borges o seu "guru" espiritual. Têm com eles parte do PSD, alguns empresários e banqueiros, parte cada vez menor da opinião pública, mas ainda muito apoio na comunidade financeira e em alguma imprensa, nacional ou internacional. Lá fora, estão neste grupo Merkel e o Bundesbank, e por vezes o próprio BCE. 

 

"Pombas de direita" - São aqueles que defendem uma linha mais moderada, com menos impostos e mais cortes na despesa. Têm mais preocupações sociais com o desemprego e com as empresas, e estão profundamente desiludidos com o fracasso da "linha dura" em 2012. Em Portugal, este grupo inclui o CDS-PP de Portas, muitos sociais-democratas, como Manuela Ferreira Leite; a maior parte das confederações patronais, a maioria da opinião pública de centro-direita, e um apoiante de peso: o Presidente da República, Cavaco Silva, que não se cansa de colocar alertas no Facebook. Internacionalmente, o líder deste grupo é Mario Monti, primeiro-ministro italiano. 

 

"Falcões de direita que passaram a pombas" - Este grupo é encabeçado pelo FMI, que há ano e meio era muito duro, mas agora já está, e ainda bem, muito mais moderado e já reconhece que a austeridade "não está a funcionar". Neste grupo inclui-se também muita imprensa, especialmente a económica, que há um ano dava gritos de alegria e júbilo pela chegada da "troika", e agora já urra de indignação com o aumento de impostos. A julgar pelas sondagens, a maioria da opinião pública também teve um comportamento semelhante. 

 

"Falcões que, em certos dias e a certas horas, quase parecem pombas" - Neste grupo há dois exemplos. O primeiro é Mário Draghi, presidente do Banco Central Europeu, que de manhã diz que o BCE pode ajudar os países em dificuldades, e à tarde diz que eles têm de aplicar a "austeridade". O segundo exemplo é obviamente Durão Barroso, que de manhã lava as mãos dizendo que as medidas são decididas pelos governos e não pela União Europeia, e à noite diz que a "austeridade é necessária".

 

"Pombas de esquerda" - São aqueles que, mesmo a contragosto, aceitaram o "memorando da troika", mas que acham que a "receita" do Governo é errada e que existem mais alternativas. Este grupo é obviamente liderado pelo PS de António Seguro, mas tem na UGT e em João Proença o seu porta-voz mais credível. Há alguns economistas, nacionais e estrangeiros, que se alinham por aqui, como Paul Krugman ou Sitglitz, ou o português João Ferreira do Amaral. É um grupo que tem algum apoio da opinião pública e de certos comentadores famosos, e onde se inclui também o ex-presidente Jorge Sampaio. 

 

"Falcões de esquerda" - Não aceitam o "memorando da troika", e por vezes dizem que Portugal não deve pagar a dívida, que alguns consideram "ilegítima". Há ainda uns quantos que defendem a saída do euro. É aqui que se junta a esquerda caviar e a esquerda comunista. Incluem-se neste grupo a CGTP, com o seu novo líder Arménio Carlos, o PCP e o Bloco de Esquerda, e muitas personalidades independentes, que se reuniram recentemente no Congresso das Alternativas. É o grupo que defende a rua e as manifestações como forma de deitar o Governo abaixo.

 

"Pombas de esquerda que viraram falcões" - Embora seja um grupo minoritário, têm um apoiante de peso, Mário Soares. Relembre-se que Soares foi um dos principais responsáveis por insistir junto de José Sócrates que pedisse "ajuda internacional" e aceitasse o "memorando da troika". O antigo presidente, sempre  muito orgulhoso das suas ideias, revelou até ao país que esteve várias horas ao telefone com Sócrates, para o fazer aceitar a chegada da "troika". Um ano e meio depois, Soares transformou-se num dos mais ferozes lutadores contra a "troika" e o Governo, provavelmente sem ter ainda percebido que foi com a sua ajuda e dos seus telefonemas que a "troika" aterrou na Portela e Passos Coelho ganhou as eleições. Mas, enfim, a um ex-presidente permite-se tudo... 

publicado por Domingos Amaral às 12:17 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Segunda-feira, 17.09.12

Deus e o Diabo

Lá diz o povo que é difícil ficar bem com Deus e com o Diabo ao mesmo tempo. Mas é isso que Paulo Portas está a tentar, numa manobra de equilibrismo perigoso. Por um lado, coloca-se do lado da opinião pública, das manifestações, dos protestos gerais contra o Governo por causa das mexidas na TSU. Diz que sempre foi contra, que não está de acordo com a medida, e que há outras soluções alternativas para cortes. Ou seja, quer estar bem com Deus. Mas por outro lado, diz que não quer provocar uma grave crise política e que portanto não bloqueia a medida, podendo mesmo aprová-la se o PSD insistir nela, só para não deitar abaixo o Governo. Ou seja, também quer ficar de bem com o Diabo, que neste exemplo metafórico é personificado pela teimosia de Passos Coelho. Mas é possível, num momento tão dramático para Portugal, adoptar esta posição de "não, não, mas se tu quiseres mesmo, então é sim"? A mim parece-me que este é um momento clarificador: ou se está a favor ou se está contra, não há espaço para meias tintas e sofisticações florentinas. É uma tentação perigosa querer o melhor de dois mundos, querer ser ao mesmo tempo "popular" e "responsável". São, neste caso e neste momento, dois objectivos mutuamente exclusivos. Ou me engano muito, ou a intervenção dominical de Portas vai dar maus resultados. Ou Deus se desilude, ou o Diabo chateia-se à séria.   

publicado por Domingos Amaral às 10:18 | link do post | comentar | ver comentários (2)
 

Livros à venda

posts recentes

últ. comentários

  • Li com prazer o seu primeiro volume volume de assi...
  • Caro Domingos Amaral, os seus livros são maravilho...
  • Caro Fernando Oliveira, muito obrigado pelas suas ...
  • Gostei muito dos dois volumes e estou ansiosamente...
  • Bela e sensata previsão!Vamos ganhar a Final?!...
  • A tua teoria do terceiro jogo verificou-se!No enta...
  • Gostei de ler, os 2 volumes de seguida. Uma aborda...
  • Neste momento (após jogo com a Croácia) já nem sei...
  • Não sei se ele só vai regressar no dia 11, mas reg...
  • No que diz respeito aos mind games humildes, é pre...

arquivos

Posts mais comentados

tags

favoritos

mais sobre mim

blogs SAPO

subscrever feeds