Quinta-feira, 11.07.13

O Presidente Cavaco e a "armadilha da dívida"

Cavaco, ontem à noite, tentou acabar com o recreio.

O que ele vem dizer é que as lideranças partidárias de Passos, Seguro e Portas, andam a perder tempo em irredutibilidades que não contribuem para a estabilidade do país nesta hora difícil.

Colocou a parada alta, mas não demais. 

O que Cavaco pede, na fase 1, é que os partidos partilhem a responsabilidade do estado do país e partilhem também o poder. 

Não será nada fácil de conseguir o "compromisso de salvação nacional" exigido pelo Presidente.

Mas, ninguém pode dizer que é impossível.

Se cada parte ceder um pouco, é possível encontrar uma zona de consenso comum.

Não é impossível manter a credibilidade e ao mesmo tempo aliviar um pouco a austeridade.

Não é impossível cumprir o memorando e ao mesmo tempo promover o crescimento económico.

Não é impossível ser rigoroso e ao mesmo tempo lutar na Europa por soluções mais inteligentes e solidárias.

Nada disto é impossível, embora seja muito difícil de transformar estes princípios gerais numa solução governativa estável e duradoura.

Na verdade, existem apenas duas lideranças que podem sabotar o compromisso pedido pelo Presidente: Passos e Seguro.

Paulo Portas, chefe de um partido menor, será sempre menos importante numa solução a três, e provavelmente não fará ondas.

Mas Passos e Seguro podem torpedear qualquer acordo.

Passos porque, a haver compromisso, o mais certo é ele passar pela sua saída de primeiro-ministro. 

Teoricamente, ele até pode aceitar apoiar um governo no qual não esteja sentado, mas será sempre visto como um derrotado, pois a sua linha de afrontamento geral ao PS, aos parceiros sociais e ao Tribunal Constitucional será abandonada de vez, bem como a maior parte das suas ideias "neo-liberais", que tão fracos resultados deram.

Já quanto a Seguro, o que se lhe pede é uma inversão de rota brusca, pelo menos durante um ano. Até ontem, Seguro sempre pediu eleições, e extremou tanto a exigência que tem pouco espaço para recuar. Não sendo impossível, é-lhe doloroso. 

Só que, se Passos e Seguro não fizerem um esforço de compromisso, pelo menos até Junho de 2014, podem acabar mais cedo do que previam as suas carreiras políticas.

Se os três partidos não se entenderem, o mais certo é Cavaco passar à fase 2, e lançar um governo de iniciativa presidencial.

Nesse caso, nem Passos nem Seguro ganhariam nada. Ficariam com muita responsabilidade pela crise e sem nenhum poder para a aliviar. 

E ficariam anulados, pois qualquer solavanco que criassem levaria Cavaco a apontar-lhes o dedo, responzabilizando-os pelo caos.

Passariam para uma espécie de limbo político, onde não eram poder nem eram oposição, sendo sempre eternamente responsabilizados, o PS porque é o "pai da dívida", o PSD porque é o pai da "austeridade e do desemprego".

Por muito que custe a todos, a solução mais inteligente e serena seria PSD, PS e CDS apoiarem um novo de governo, liderado por alguém em quem Cavaco confie, e que durante um ano faria o possível para diminuir a austeridade interna sem perder a credibilidade externa. 

A política partidária ficaria mais ou menos suspensa durante doze meses, e depois tudo poderia recomeçar a partir de Junho de 2014. 

Embora a questão de fundo não se resolvesse, haveria uma transitória acalmia da hostilidade e da crispação geral em que estamos.

E, entretanto, a Europa podia evoluir. 

O que mais esta crise prova é que a "armadilha da dívida", em que alguns países europeus se encontram, não consegue ser resolvida por eles, individualmente.

Como já se viu na Grécia e em Itália, os sistemas políticos, impedidos de desvalorizar a moeda, não têm solução para a "armadilha da dívida" e por isso as crises se repetem. 

Enquanto a Europa não perceber isso, e não usar o seu tremendo poder para resolver a "armadilha da dívida", países como Portugal, Grécia, Chipre, Itália, Espanha e até a Irlanda, irão viver em sucessivas crises, com o sistema político aos solavancos.

A "armadilha da dívida" colocou estas democracias e os seus políticos numa situação terrível: eles podem sempre piorar as coisas, mas nunca as conseguem melhorar ou vencer em definitivo!

É essa a tragédia da Europa, e de Portugal.

E ainda só vamos a meio do filme.  

publicado por Domingos Amaral às 12:09 | link do post | comentar | ver comentários (5)
Segunda-feira, 08.07.13

A segunda grande utopia do euro

O euro não é uma união monetária, mas sim uma ilusão monetária.

Ou melhor, o euro são duas grandes utopias, duas ilusões monetárias.

A primeira ilusão, a primeira utopia, foi a de que os países, ao entrarem no euro, iriam ser prósperos, o seu crescimento económico ia aumentar e sobretudo, as suas finanças públicas iriam ser disciplinadas.

Como se viu, nem dez anos foram precisos para destruir esse monumental mito.

O euro não espalhou a prosperidade na Europa, não provocou grande crescimento económico na maioria dos países, e quanto à disciplina das finanças públicas dos orçamentos dos 17, estamos conversados.

O que o euro permitiu a todos foi uma ilusão monetária, a de que com baixas taxas de juro podíamos ser todos ricos.

O resultado está à vista, em quase todos os países da Europa o sistema financeiro desequilibrou, e a partir de 2008 descobriu-se um precipício de dívidas.

Todos - pessoas, empresas, bancos, Estados - se endividaram demais na zona euro, e todos acabaram em pânico.

Os monstros das dívidas públicas, ou soberanas, são apenas a ponta visível do iceberg da dívida, porque se olharmos mais fundo descobrimos que a dívida privada é bastante mais alta que a pública.

Mas, mal a crise rebentou, e principalmente a partir de 2010, uma nova ilusão, uma nova utopia, poderosa e intensa, se instalou na zona euro.

De um dia para o outro, todos quiseram acreditar na ilusão de que, com muito sacrifício, era possível pagar a colossal dívida. 

Oficialmente, a Europa mantém viva essa ilusão, e continua a tentar que os povos europeus acreditem que, com "ajustamentos" e "austeridade", é possível aos países pagarem as suas dívidas.

Grécia, Portugal, Irlanda, Chipre, até a Espanha e a Itália, são agora as principais vítimas dessa tremenda ilusão do euro.

Na verdade, as dívidas desses países não são pagáveis pelos próprios. Portugal, Irlanda, Grécia e Chipre, pelo menos estes quatro, não têm qualquer hipótese de pagar as suas dívidas.

Nem 100 anos de austeridade tornariam possível tal objectivo, e no entanto a Europa não quer deixar cair a ilusão.

O estado de negação europeu é preocupante, pois há muito que quem estuda a história destes "ajustamentos" sabe que eles raramente funcionam, e quando funcionam é porque os países têm uma moeda para desvalorizar, o que não é o caso.

Assim sendo, a austeridade deprime os países, aumenta o desemprego, e no fim eles ainda têm dívidas maiores do que tinham no início!

É o "paradoxo da dívida" em todo o seu esplendor. Quanto mais sacrifícios fazemos, mais cresce a dívida em percentagem do PIB! 

Além disso, e como já aqui escrevi muitas vezes, além da violência económica destes programas, há os desequilíbrios sociais e políticos que geram.

A maior parte dos programas de "ajustamento" dos últimos 50 anos falhou porque os sistemas políticos não aguentaram, e entraram em convulsão.

Nós portugueses, temos a tendência para olhar apenas para o pátio da nossa paróquia, e achar que tudo isto não passam de incompetências dos Passos, erros dos Sócrates, birras dos Portas, ou fanatismos dos Gaspares.

Até certo ponto, a dimensão nacional de cada crise é verdadeira, mas só é compreensível se percebermos o contexto, e esse chama-se "armadilha da dívida". 

É essa armadilha que sabota os sistemas políticos nacionais, e os desequilibra, e é por causa dela que nascem as crises. Que se vão repetindo, com maior ou menor gravidade, mas sem fim à vista. 

A segunda grande utopia do euro, a utopia redentora e sacrifical, que nos dizia que os "ajustamentos" iam resolver o problema, está a começar a estilhaçar-se à nossa frente com violência.

Na verdade, os ajustamentos não nos fazem sair da armadilha da dívida, pelo contrário, ainda nos atam mais os pés.

Para sair desta armadilha, só há duas formas. A primeira é não pagarmos a dívida, o que é desastroso e humilhante, mas já aconteceu muitas vezes em muitos países europeus, que beneficiaram de enormes perdões.

A segunda forma possível é a Europa "mutualizar" a dívida, libertando os pequenos países dessa carga. 

Uma dessas alternativas terá de existir nos próximos tempos, ou o perdão ou a mutualização.

Quem pensar o contrário, e acreditar que a austeridade nos vai permitir pagar a dívida, continua a não viver na realidade.

O melodrama da semana passada teve uma única virtude. Com novas funções, Paulo Portas passará a coordenar as negociações com a "troika", o que abre um importante oportunidade.

É essencial que a Europa perceba que tem de mudar o paradigma, passando do "ajustamento" para a resolução da "dívida". 

Talvez Portas consiga explicar à Europa que esmifrar mais Portugal e outros países não leva a lado nenhum. 

publicado por Domingos Amaral às 11:38 | link do post | comentar
Quarta-feira, 03.07.13

2ª Carta a Paulo Portas, a louvar a sua coragem

Caro Paulo Portas

Ao contrário de muitos, que te chamam garoto, eu quero aqui escrever publicamente que ontem tiveste uma atitude de grande coragem.

Há pouco mais de 9 meses, escrevi-te a minha primeira carta, a defender que te devias demitir depois da célebre TSU, que Passos e Gaspar queriam aprovar contra a tua vontade.

Na altura, não o fizeste, e deste mais uma oportunidade aos dois. Não estive de acordo mas compreendi. Para ti, ainda era cedo, embora para mim já fosse tarde demais.

E o que se passou nesses 9 meses, entre Setembro de 2012 e Julho de 2013? Muita coisa.

Em vez de Portugal melhorar, a situação económica afundou-se ainda mais. Tivemos o célebre "enorme aumento de impostos", e o que se vê é "um enorme aumento do deficit no primeiro trimestre". A dívida também aumentou e só os cegos acham que estamos melhor agora.

Além disso, a Europa caiu ainda mais na recessão, como muitos avisaram que ia acontecer. Os "austeritários" começaram a perder todos os argumentos, e de Paris a Berlim, passando por Bruxelas ou Roma, já ninguém acredita que a revolução "austeritária" é uma solução viável.

Em apenas 9 meses, a Europa mudou. Não muito, mas já mudou o suficiente para se perceber que esta receita austeritária fracassou rotundamente, e que há que encontrar outra saída para a crise.

Porém, por cá, continua a haver uma cabeça teimosa e cega, que nada ouve, nada aprende e nada muda.

Mesmo depois da confissão de derrota de Vítor Gaspar, a quem chamaram e bem o "arquitecto" da austeridade, Passos Coelho mantém-se obstinado e teimoso, como se nada tivesse acontecido.

Há muitos meses que o CDS vem chamando a atenção para a necessidade de mudança. Fê-lo mantendo até ao limite do possível a solidariedade com Passos.

Contudo, Passos é tão pouco inteligente, que não sabe ler qualquer sinal. Não percebe que a Europa já mudou, não percebe que já perdeu o país há muito, não percebe que a sua estratégia falhou colossalmente.

Como um cego e surdo, Passos caminha em direcção ao abismo sem ouvir ninguém.

Mas, há limites para tudo. 

Há anos que Passos humilha o CDS e te subalterniza ostensivamente. Isso, já de si desagradável, seria suportável se a direcção escolhida fosse a certa. Mas não é. Portanto, nada te obriga a ir agarrado a ele para o abismo.

As pessoas que hoje te chamam garoto têm de perceber que o que se passa, e o que te separa de Passos é uma profunda divergência política. Não é uma birra, nem um amuo. É muito mais do que isso.

Passos continua a acreditar na receita "austeritária" com a limitação intelectual de um fanático, e por isso nomeou a senhora que se seguia. Ora, é precisamente isso que está em causa. Esta política falhou, continuar no mesmo rumo é um puro suicídio.

Talvez tenhas contudo de explicar isso melhor. Talvez não baste um comunicado.

Portugal inteiro precisa de perceber que tu não acreditas mais neste rumo, nesta austeridade que só trouxe miséria e desgraça a Portugal. Tens de explicar a todos que é isso que divide hoje o CDS e o PSD de Passos.

Tal como os patrões, os sindicatos, a oposição ou a Igreja, ninguém acredita neste rumo e só estão nele por puro medo.

Sim, medo. É o medo terrível de ser castigado, o medo do futuro, a chantagem da alta finança, que leva as pessoas a aceitarem este rumo.

Ora, o medo não pode ser o dia a dia de um país. Portugal não pode continuar a viver nesse terror paralisante que leva muitos a quererem aceitar tudo, não vá alguém chatear-se connosco.

É preciso vencer esse medo, superar essa aflição. Sim, vai ser difícil, mas não podemos continuar a viver nesta chantagem.

A receita da Europa falhou, a receita da "troika" falhou, a receita de Passos falhou.

É isso que tem de ser dito, é isso que tem de ser praticado, e nós temos de o saber explicar à Europa.

Portanto, acredita nas tuas convicções, acredita que estás certo, porque estás. 

É evidente que provocar instabilidade tem custos, isso todos o sabemos. Porém, e ao contrário do que muitos para aí dizem, eu acho que neste momento a instabilidade é uma aliada de Portugal.

Quanto mais instabilidade existir agora, mais a Europa muda, e mais depressa muda.

Se, durante este Verão, como prevejo, Portugal, Grécia e talvez até a Irlanda, entrarem em turbilhão, a Europa da Sra Merkel vai ter de perceber que ou muda ou morre.

Há três anos não era assim, mas hoje as coisas mudaram. Merkel tem eleições em Setembro, tudo o que ela não quer é crises em Portugal ou na Grécia.

E é precisamente por isso que esta crise vem no momento certo. Agora, que a Europa já perdeu a fé na revolução "austeritária" e Merkel está em época eleitoral, é que é tempo de provocar uma mudança geral na Europa.

Portugal, com a tua decisão corajosa, será o motor dessa mudança. Através da instabilidade, aterrados com o pânico do colapso geral do euro, todos terão de mudar de política, para que a crise acabe.

Pela minha parte, cresceu mais uma vez a minha admiração por ti.

Não te deixaste vencer pela chantagem do medo, e agora é tempo de falares e dares uma nova esperança ao país. Fala, e explica a todos que não vais mais por esse caminho sinistro da "austeridade" das troikas, dos Passos e dos Gaspares.

Esse tempo acabou e ainda bem que foste tu a provocar uma morte mais do que anunciada.

E, caro Paulo, não tenhas medo que os juros subam. Quanto mais subirem, mais Portugal se torna essencial na Europa, e mais força tem para impor uma mudança geral de políticas.

Coragem é o que te peço, e esperança é o que em ti deposito.

"May the force be with you".

 

publicado por Domingos Amaral às 12:13 | link do post | comentar | ver comentários (29)
Terça-feira, 02.07.13

Gaspar: a revolução da austeridade devora os seus próprios filhos

A demissão de Vítor Gaspar não é apenas uma derrota pessoal, ou uma derrota política grave, do Governo.

A demissão de Vítor Gaspar é sobretudo uma profunda derrota da linha dura da Europa, dos austeritários que impuseram por todo o lado uma receita que falhou.

Vítor Gaspar era um menino querido do "establishment" europeu que nos governa.

Era louvado no Banco Central Europeu; era admirado no FMI; era estimado na Comissão Europeia, sobretudo por Oli Rehn; e era verdadeiramente mimado e amado pela Alemanha, especialmente pelo seu amigo Schauble.

Nada disto espantava, pois Vítor Gaspar foi o mais diligente executor da estratégia europeia da austeridade.

Decidida entre finais de 2009 e princípios de 2010, e aplicada com entusiasmo a partir daí na Grécia, na Irlanda, em Portugal, no Chipre, e mesmo em outros países como Itália e Espanha, a estratégia da "austeridade expansionista" foi a resposta convicta da Europa à crise das dívidas soberanas.

Schauble e Merkel, na Alemanha; Oli Rehn, na Comissão Europeia; e ainda Trichet, no BCE; aos quais se juntou depois o FMI; decidiram que existiam dois princípios orientadores para combater a crise das dívidas.

O primeiro era que o "ajustamento" seria feito apenas pelos países devedores, esses irresponsáveis. E o segundo era que os programas de "ajustamento" seriam rápidos, intensos e profundos, com uma enorme dose de austeridade, que provocaria efeitos fortes no início, mas rapidamente se tornaria "expansionista", regressando os países, em 3 anos, a um crescimento económico mais saudável.

Foram estes dois princípios: o sofrimento e a punição dos países devedores, de uma forma rápida e profunda; que orientaram a Europa, e Vítor Gaspar, que entra no combóio apenas em meados de 2011, apressou-se a levar estas orientações à prática com um zelo e uma dedicação notáveis.

No princípio, durante o segundo semestre de 2011, as coisas ainda pareceram resultar.

Mas, com o passar do tempo, tornou-se evidente que os pequenos ganhos positivos da estratégia "austeritária", como a recuperação de alguma credibilidade e a descida dos juros, eram pouco face ao descalabro na frente económica, onde tudo ia de mal a pior, do desemprego à dívida, do deficit ao crescimento.

Nos últimos meses, a linha "austeritária" tem vindo a perder força, perante a tragédia que assola a Europa.

Há cada vez mais vozes na Europa a pedirem uma direção diferente; o FMI já fez o seu mea culpa. O choque com a realidade é total, a linha austeritária falhou em toda a linha, e deixou a Europa mais dividida e mais pobre.

Pelo menos desde 2011, muitos economistas, entre os quais me incluo, defendem que só a reestruturação das dívidas dos países mais frágeis resolverá este imbróglio; e que só uma verdadeira União Europeia, política, orçamental, bancária e da segurança social; nos permitirá sair deste monumental sarilho.

Até há pouco tempo, a "Europa dos duros" venceu sempre, mas agora começa a ser claro para todos que por este caminho não se vai a lado nenhum. Como diz a música dos Talking Heads, "we are on the road to nowhere".

A demissão de Gaspar é pois o reconhecimento absoluto da derrota da linha austeritária.

Apesar de ser adorado pelos alemães, apesar de ser "credível" aos credores, a verdade é que, como ele próprio reconhece na sua carta de despedida, a sua "credibilidade" foi destruída pela realidade dos resultados económicos. Despede-se com um deficit trimestral de 10,6 por cento, uma enormidade depois de tanta austeridade inútil.

Gaspar é uma vítima de si próprio e dos seus famosos amigos e mentores, da sua estratégia austeritária, da sua "blitzkrieg" financeira, da sua Quimioterapia Fiscal. A "revolução austeritária", como se diz que acontece em todas as revoluções, acabou a trucidar e a devorar um dos seus filhos mais amados.

 

 

 

publicado por Domingos Amaral às 11:09 | link do post | comentar | ver comentários (3)
Quarta-feira, 19.06.13

Será que eu estou a resvalar perigosamente para a esquerda?

Nos últimos meses, vários bons amigos têm chegado perto de mim e, num tom preocupado, manifestado a sua perplexidade por eu andar "tão à esquerda"!
Eu fico um pouco surpreendido, pois não me sinto nada a resvalar para a esquerda só por ter as opiniões que tenho.
O que há em mim é uma grande preocupação com o actual estado da Europa e de Portugal, e uma rejeição de muitas políticas que têm sido impostas. 
Para mim, a receita da "troika" "criou um ciclo vicioso de contracção do PIB, aumento do desemprego, quebra da actividade económica e aumento consequente de alguma despesa do Estado o que, em última análise, agrava o défice”.
Além disso, considero que “não existe realismo em alguns dos objectivos fixados nos programas de ajustamento”.
Sei bem que “é preciso rigor, mas é também necessária flexibilidade e, sobretudo, bom senso”.

É evidente que  “as dívidas são para pagar”, mas isso “não pode ser feito à custa das famílias e das empresas”, nem pode ser “uma hipoteca do futuro”.

O que temos de seguir é “um caminho sustentável de rigor, mas flexível o suficiente para não matar de exaustão e desespero quem o empreende”.

Além disso, acho que a Europa se tem portado muito mal, e tem tomado péssimas decisões.
A situação é ainda mais grave quando o assunto são os resgates à Grécia e a Chipre onde "o processo de decisão política é inconsequente, mal conduzido e quase infantil”.
Acredito sinceramente que "isso destrói a confiança dos cidadãos, dos investidores e dos mercados”.
Se dizer tudo isto é ser de esquerda, então graças a Deus estou bem acompanhado.
Todas as citações a bold deste post são retiradas da moção dos eurodeputados Nuno Melo e Diogo Feio, que será levada ao próximo Congresso do CDS.
Será que também o CDS já é "de esquerda"? 

 

 

 

 

 

 

publicado por Domingos Amaral às 15:26 | link do post | comentar | ver comentários (4)
Segunda-feira, 17.06.13

Prefere ter dívidas ou ter desempregados?

A pergunta que dá o título a este post é a pergunta que devemos todos fazer sobre Portugal e sobre a Europa.

O que é mais grave para um país ou para a Europa, ter dívidas ou ter desempregados?

Desde Setembro de 2009, data em que a senhora Merkel venceu as eleições na Alemanha, a resposta da Europa foi simples: não é aceitável ter dívidas!

Os países mais fortes, com a Alemanha à cabeça, foram peremptórios: não pagavam as dívidas dos países mais pobres! 

Quem se endiviou demais, que pague pelos seus erros, foi esta a máxima exemplar da Europa, com Merkel a ser a cara desta direção geral. 

Depois, um pouco por todo o Sul da Europa, os "merkelianos" tomaram conta do assunto, e começaram a impôr doses cavalares de austeridade.

Parecia simples: se tens dívidas a mais, deixa de gastar, corta nas despesas e paga o que deves!

Simples, mas estúpido. Aos "merkelianos", apaixonados pela austeridade, escapou um pequeno mas muito importante detalhe. É que um país não é um família, e uma União Europeia não é uma quintarola qualquer.

Ao começarem a praticar austeridade todos ao mesmo tempo, primeiro na Europa do Sul e depois mesmo no norte, na Holanda, na França, na Finlândia e até na Alemanha, os "merkelianos" esqueceram os efeitos "sistémicos" que isso iria trazer a todos. 

Parecia muito fácil dar ordens austeras à Grécia, impôr a Portugal e à Irlanda umas "troikas" exigentes. A coisa ia ao sítio de certeza.

Porém, só com o passar do tempo os "merkelianos" descobriram que massacrando as pequenas partes, um dia o todo ia também sofrer.

E foi isso que aconteceu. A recessão, em vez de ser localizada, expandiu-se como um vírus. A austeridade, tão bela e virtuosa, transformou-se numa ceifeira de empregos e empresas. Os Estados mirraram, algemados pela sra Merkel e pelos seus papagaios locais, como Gaspar e Passos.

Quatro anos depois, a Europa descobre o paradoxo que o economista Irving Fisher descobriu há mais de 80 anos: se todos cortarem nos gastos, nos salários e nas despesas ao mesmo tempo, todos ficam mais pobres!

Olha-se hoje para a Europa, do Atlântico até aos fiordes, de Paris a Atenas, e o que se vê é um mar de desempregados, um lago recessivo onde ninguém faz mais do que boiar, tentando não naufragar.

É este o legado da Sra Merkel e dos seus seguidores, é esta a herança da austeridade. Em pânico com as dívidas, os europeus geraram um monstruoso e arrepiante desemprego. É isso que preferem? Preferem ter desempregados aos magotes em vez de dívidas?

Sempre aqui escrevi que Merkel foi a pior coisa que aconteceu à Europa em muitas décadas. Uma mulher lenta de raciocínio, uma pata choca com uma moral de merceeira, sem qualquer visão lúcida sobre o destino comum da Europa.

Só peço a Deus, todos os dias, que os alemães corram com ela. Caso contrário, o desastre não vai parar. No seu cérebro de foca mal amestrada, a sra Merkel nunca irá perceber que é muito mais grave para a Europa ter desempregados do que ter dívidas. 

 

publicado por Domingos Amaral às 12:33 | link do post | comentar | ver comentários (6)
Quinta-feira, 06.06.13

A minha profunda desilusão pessoal com Passos Coelho

Fez esta semana dois anos que Passos Coelho venceu as eleições, e dois anos chegaram para o considerar uma das maiores desilusões da minha vida política.

Conheci Passos Coelho em meados da década de 90. Eu era jornalista, n´O Independente, e a minha tarefa era dedicar-me ao Parlamento. Conversava com deputados de todos os partidos, e guardo boas recordações de muitos deles, entre os quais Passos Coelho.

À data, Marcelo liderava o PSD, Marques Mendes era presidente do Grupo Parlamentar, e tinha em Passos Coelho um fiel e dedicado vice-presidente. Na Assembleia da República, Mendes e Passos formavam uma boa dupla. Eram empenhados, lúcidos, e eram também bem dispostos.

Por várias vezes, almocei e jantei com os dois, e dava-me bem com eles. Reservando a necessária distância, imposta pelos cargos deles e pelo meu trabalho, conseguimos desenvolver uma boa relação, de respeito e estima.

No caso de Passos Coelho, formei desses tempos uma boa opinião. Era preparado, atento, e era também simpático, cordial. Além disso era, tal como Mendes, divertido, e parecia bem com a vida.

Embora os tempos nos tenham afastado, quando Passos Coelho se tornou líder do PSD, acreditei que tinha todas as características para convencer o país das suas ideias, e para chegar a primeiro-ministro de Portugal.

Para mais, o seu discurso até vencer as eleições era acutilante, verdadeiro e parecia confiável. Com o país já farto da arrogância de Sócrates, e com a situação europeia a degradar-se a olhos vistos, Passos emergia como uma solução, e pelo que conhecia dele, era fiável.

Embora me pareça que o PSD foi precipitado a rejeitar o famoso PEC IV, pois trocava um ganho de curto prazo (a derrota de Sócrates) por um sarilho de médio prazo (governar Portugal sujeito a uma resgate da troika), acreditei que Passos Coelho o fazia pelas razões que à época explicou ao país.

É fundamental relembrar isto, pois é essa a fonte da minha desilusão. Passos, até vencer as eleições, sempre defendeu que a "austeridade" era o caminho errado. Mais: prometeu não subir impostos, nem cortar salários, subsídios ou pensões!

A sua posição fundamental era a defesa intransigente de um corte na "despesa do Estado"! O seu discurso era a "reforma do Estado", o "corte nas gorduras", as "reformas estruturais", o ataque aos interesses e ao desperdício do Estado!

Inocente e iludido, como muitos, acreditei nele. Apesar de Portugal já ter vistos dois filmes semelhantes, pois tanto Barroso como Sócrates tinham prometido não subir os impostos e depois fizeram-no; apesar disso, eu acreditei que Passos Coelho seria diferente, que se ia manter fiel às suas promessas e às suas prioridades. 

Quando tomou posse como primeiro-ministro, interpretei o "ir para além da troika" como ambição reformista, e desejo de alterar mais regras e comportamentos no Estado, para além do que já estava combinado com a "troika". Nunca me passou pela cabeça que esse "ir além da troika" fosse o que veio a ser.

Nos meses seguintes, já sentado em São Bento, Passos Coelho deu a maior cambalhota política a que Portugal assistiu e fez tudo ao contrário do que prometera.

Prometera não subir impostos e subiu! Prometera não cortar subsídios e cortou! Prometara não cortar salários e cortou! E prometera cortar a sério na despesa do Estado, reformando-o, e...não cortou, nem o reformou em quase nada.

Ou seja, fez o que prometera não fazer e não fez o que prometera fazer!

Para além disso, e para minha grande surpresa, alinhou a 100 por cento pelas teorias da Sra Merkel, impondo alegremente uma "austeridade violenta", e acreditando com a fé de um fanático que isso ia dar bom resultado.

Para quem o conhecia pessoalmente, como eu conhecia, e para quem criara boas expectativas sobre ele, como eu criara, esta conjugação de faltar à palavra, executar piruetas políticas, revelar fezadas infantis e mostrar puras incompetências, danificaram de forma absoluta a ideia que tinha dele.

Hoje, posso dizer que Passos Coelho me enganou, me desiludiu e considero-o mais um político em que não confio, porque não tem palavra, não tem lucidez e não tem competência para o lugar que ocupa.

Mas, o mais grave não é isso, nem a minha desilusão pessoal é muito relevante para Portugal. O mais grave é que Portugal julgou que, ao livrar-se de Sócrates ia para melhor, e foi para pior.

Passos Coelho colocou Portugal num buraco negro bem mais fundo do que aquele que já existia. A recessão é profundíssima, o desemprego assustador, a dívida colossal.

É verdade que a culpa não é só dele. Merkel, Schauble, Rehn e Gaspar são igualmente responsáveis pela desgraça que assola a Europa e Portugal.

Mas, desses eu nunca esperei grande coisa. Nunca me iludiram e, portanto, nunca me desiludiram.  

publicado por Domingos Amaral às 10:18 | link do post | comentar | ver comentários (20)
Terça-feira, 28.05.13

Os falsos mitos económicos da Europa

A Europa está infestada de mitos económicos, histórias falaciosas e fantasias grosseiras, que nos foram vendidas ao longo de duas décadas, e que a deixaram como está, em agonia e com um sombrio futuro pela frente.

E quais são esses mitos que ensombram a Europa? Aqui deixo uma pequena lista:

 

MITO 1 - As dividas dos países do Sul têm de ser pagas, custe o que custar. 

É o mais grave mito que atinge a Europa no presente, onde se mistura uma moralidade de merceeiros com a cegueira dos fanáticos.

Há uma coisa que os europeus deviam meter de vez na cabeça: os países do Sul não têm qualquer hipótese de pagar as dívidas.

Veja-se por exemplo Portugal: a dívida pública atinge 127% do PIB, e a dívida privada, de que se fala menos porque não dá jeito, atinge 340% do PIB.

Sim, leu bem, no total a dívida de Portugal quase chega aos 470% do PIB nacional! E, parecidos connosco, estão a Grécia, a Irlanda, Chipre, a Espanha, a Itália.

Estas dívidas nunca serão pagas.

Enquanto os europeus não perceberem isso, e não reestruturarem as dívidas, e mutualizarem uma grande parte delas, as economias europeias continuarão afocinhadas no desespero e no desemprego.

 

MITO 2 - As exportações vão salvar o crescimento dos países.

É outro mito fantástico, a que os países em crise se agarram, como os náufragos se agarram às bóias de salvação.

Com o consumo e o investimento privados retraídos, e com os gastos dos Estados impedidos de aumentarem, todos olham para as exportações como a salvação das pátrias!

Vã esperança, e patética fantasia. As exportações ajudam, mas não salvam. Não existem praticamente casos de países que tenham saído de recessões profundas só à custa de exportações. 

Para mais, quando quase todos os países europeus querem exportar, para onde vão eles exportar se ninguém quer importar?

 

MITO 3 -  A austeridade orçamental vai resolver o problema das dívidas.

Mais um mito muito promovido pela Europa, em especial pela Alemanha, que durante anos impôs aos outros este caminho.

Como se tem visto, a Europa inteira está em recessão, com um desemprego a crescer para níveis perigosos em muitos países, e não houve qualquer melhoria verdadeiramente significativa, nem nos déficits públicos, nem no crescimento económico, nem na capacidade de pagar dívidas.

Cinco anos depois de 2008, a Europa está cada vez mais pobre e mais paralisada.

 

MITO 4 - A inflação faz mal às economias.

Este é um mito repetido como se fosse um dogma, uma profissão de fé. Contudo, e ao contrário do que dizem os papagaios de poder, para os europeus era precisamente um pouco de inflação que dava jeito agora.

Principalmente no Norte da Europa, pois assim os salários no Norte subiriam mais do que os salários no Sul, permitindo a países como Portugal, Espanha, Grécia, Itália, Irlanda, recuperarem a "competitividade" relativa que perderam.

Mas, quem falar em inflação é queimado em auto-de-fé pela inquisição económica da Alemanha!

 

 

MITO 5 - A liberdade de movimentos de capitais é essencial para a Europa.

Outro terrível mito, que está na origem da maior parte das desgraças financeiras que assolam a Europa.

Infelizmente, foi devido à sagrada liberdade de movimentos de capitais que as economias do Sul se endividaram sem restrições.

Com os capitais a circularem pelos mercados financeiros à velocidade da luz, é impossível controlar as dívidas dos países. 

O que é necessário agora é alguma repressão financeira, que obrigue os bancos e os Estados a uma moderação, e que volte a impor restrições aos seus delírios financeiros.

Se os mercados financeiros não fossem tão livres, e tão gananciosos, talvez não estivéssemos onde estamos hoje. 

 

MITO 6 - A União Europeia não pode ser uma união de transferências dos países ricos para os países pobres

Eis a mitologia europeia em todo o seu esplendor! O mito diz que os povos do Norte não têm de "pagar", e que os povos do Sul não podem viver "à conta" dos do Norte. Pois...

Basta olhar para os Estados Unidos da América para perceber que uma união monetária não significa que vamos ser todos iguais.

Pelo contrário, haverá sempre Estados ricos e Estados pobres; tal como na Europa existirão sempre países ricos e países pobres.

E nos Estados Unidos são os Estados ricos que financiam os pobres, transferindo para lá dinheiros federais.

Se a Europa quiser sobreviver enquanto união monetária, é isso que terá de acontecer. Os países do Norte terão de transferir fundos para os do Sul, gostem ou não. Caso contrário, a união monetária não funciona.

Quem pensar o contrário continua a viver num mundo de fantasia.

 



 

publicado por Domingos Amaral às 12:15 | link do post | comentar | ver comentários (4)
Sexta-feira, 10.05.13

A Europa e a Sra. Merkel deviam pagar os nossos subsídios de desemprego

Já é evidente para todos que a Europa se espetou ao comprido no combate à crise económica e financeira que a invadiu.

O desemprego europeu é avassalador, há cinco países a serem resgatados (Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha e Chipre) e as más notícias não param.

Quase cinco anos depois do início da Grande Crise Financeira de 2008, são por demais evidentes os graves erros cometidos pelos europeus, na resposta àquela que era apenas uma crise financeira e bancária, entre 2008 e meados de 2010.

O primeiro erro foi precisamente esse: os europeus não compreenderam que uma crise financeira devia ser resolvida com medidas financeiras, e não com a economia. Ao obrigarem as economias a sofrer, os europeus transformaram uma crise financeira grave numa crise económica gravíssima.

Em 2009, bastaria o Banco Central Europeu ter dito o que disse três anos mais tarde, em 2012 - que faria o que fosse preciso para "salvar o euro" - e as coisas teriam sido bem mais fáceis para todos.

Contudo, os europeus preferiram um caminho diferente. Liderada pela Alemanha, a Europa decidiu dar sermões e pregar moralidade e aplicar "um castigo" aos países com dívidas excessivas.

O ajustamento teria de ser feito exclusivamente pelos "devedores", esses irresponsáveis que viveram "acima das suas possibilidades"! Esta moralidade durona, típica de Merkel e Schauble, esquecia uma verdade essencial: para existirem devedores "irresponsáveis" também têm de existir credores "irresponsáveis", e os ajustamentos devem ser feitos por ambos, e não apenas pelos "devedores".

Mas, a fúria punitiva e castigadora dos alemães levou a vitória, e os programas de ajustamento aplicaram-se somente aos devedores. E à bruta. As "troikas" dedicaram-se à violência e à rapidez. A austeridade tinha de ser depressa e muita, para funcionar.

Vários anos depois, os resultados desta "Cruzada Austeritária" estão à vista de todos: desemprego brutal, recessão económica profunda nos países intervencionados, e recessão económica geral no resto da Europa.

É claro que, em certos casos, como o de Portugal, os efeitos nefastos foram amplificados por um Governo mais "troikista" do que a própria "troika", e agora ninguém vê forma de Portugal sair deste buraco negro. Mas, a culpa principal é da Europa, e não nossa.

É por todas estas razões que faz cada vez mais sentido a proposta de ser a Europa a pagar os subsídios de desemprego dos países que estão sob intervenção. Se a política europeia foi um erro de proporções gigantescas, o fardo das consequências devia ser suportado sobretudo pela Europa, e não pelos países.

Uma importante parte do desemprego criado em Portugal, na Grécia, na Irlanda, em Chipre e até em Espanha ou Itália, resulta directamente das erradíssimas políticas que os alemães nos impuseram a todos. Ora, porque não mandar-lhes a conta?

Era assim que devia ser. Merkel impôs uma política brutal, essa política falhou e gerou um desemprego brutal, pois então que seja a causadora disto tudo a suportar o preço, pagando os nossos subsídios de desemprego. Talvez assim a senhora aprendesse...

   

publicado por Domingos Amaral às 16:28 | link do post | comentar | ver comentários (4)
Terça-feira, 23.04.13

Barroso e a austeridade insuportável...

O presidente da Comissão Europeia, o nosso magnífico Durão Barroso, veio finalmente constatar o óbvio, dizendo que a austeridade chegou ao limite do aceitável na maior parte da Europa, e que provoca perigosos riscos, sociais e políticos.

É espantoso como durou mais de quatro anos o discurso salvífico da austeridade, tão do agrado de tanta gente neste país e por esse mundo fora. E é espantoso que venha agora Durão Barroso criticar esse discurso de austeridade, quando durante esses mesmos quatro anos, foi um dos seus defensores mais empenhados. 

Sim, por mais cambalhotas que a Comissão Europeia e o seu presidente queiram dar em 2013, alguém terá de lhes esfregar na cara a memória do que foi a política europeia activamente promovida pela Comissão, por Barroso e pelo fanático Oli Rehn, que desde finais de 2009 apoiaram, constantemente e com grande vigor, as políticas austeritárias impostas pela Alemanha da Sra Merkel. 

Durante praticamente quatro anos, a Comissão Europeia foi um pau mandado da Sra Merkel e do Sr. Schauble. Quando eles diziam "mata", a Comissão dizia "esfola"! Os programas de ajustamento, as troikas, as austeridades violentas que caíram sobre a Grécia, Portugal, a Irlanda, a Espanha, a Itália, Chipre, e mais tarde começaram também a cair sobre a França e a Holanda, tiveram o apoio entusiástico desta gente.

Tivesse a Comissão Europeia mais lucidez e jamais teria apoiado um caminho em que só os loucos podem acreditar. A Europa está cada vez pior, cada vez com mais desemprego e mais crise, e quem quisesse ter pensado um pouco antes, bastava olhar para a história económica dos últimos 100 anos para saber que a austeridade sempre produziu desastres enormes.

Mas, é claro que Merkel e a Comissão e toda essa gente que governa a Europa não quis saber da História! Com aquela arrogância que costuma caracterizar os fanáticos, avançaram a toda a velocidade para uma austeridade bruta, cega e injusta. O resultado está à vista de todos, a Europa está moribunda, e no meio dela só a Alemanha obviamente resiste. 

Quatro anos depois, Barroso vem agora dizer o óbvio, que este caminho chegou ao fim. Pois veremos se os alemães estão pelos ajustes, mas é evidente que já ninguém na Europa acredita na austeridade. Os desastres crescem a olhos vistos e o terror de uma multiplicação de Chipres pela periferia europeia é bem real. 

Se este caminho da austeridade for invertido a tempo, e o mais depressa possível, a Europa ainda se poderá salvar. Mas, a descrença é imensa, a crise muito profunda, e a Alemanha não está ainda preparada para mudar o seu discurso e as suas políticas. Por isso, bem pode Barroso falar, mas como ele não manda nada, temo que o desastre continue.  

publicado por Domingos Amaral às 11:35 | link do post | comentar | ver comentários (4)
 

Livros à venda

posts recentes

últ. comentários

  • Li com prazer o seu primeiro volume volume de assi...
  • Caro Domingos Amaral, os seus livros são maravilho...
  • Caro Fernando Oliveira, muito obrigado pelas suas ...
  • Gostei muito dos dois volumes e estou ansiosamente...
  • Bela e sensata previsão!Vamos ganhar a Final?!...
  • A tua teoria do terceiro jogo verificou-se!No enta...
  • Gostei de ler, os 2 volumes de seguida. Uma aborda...
  • Neste momento (após jogo com a Croácia) já nem sei...
  • Não sei se ele só vai regressar no dia 11, mas reg...
  • No que diz respeito aos mind games humildes, é pre...

arquivos

Posts mais comentados

tags

favoritos

mais sobre mim

blogs SAPO

subscrever feeds