A secreta conversa entre Passos e Seguro (versão não autorizada!)

Eis o que se passou verdadeiramente ontem, no inesperado e emocionante encontro entre Passos Coelho e António José Seguro. Mal este último entrou, e depois de um cumprimento seco entre ambos, o primeiro-ministro deu início à conversa.

Passos - Ena, faz tempo que não nos víamos!

Seguro - Pois é, pá...

Passos (sorrindo ligeiramente) - A culpa é tua...Andas muito radical!

Seguro (surpreendido) - Eu? Ora essa!

Passos (sorrindo) - Ele é moção de censura, ele é eleições antecipadas, ele é Abril e Grândola, ele é rasgar o memorando!

Seguro (surpreendido) - Rasgar o memorando? Isso é completamente falso! Eu nunca disse isso!

Passos - Mas andas lá perto!

Seguro - Nada disso! Tu é que andas radical!

Passos (surpreendidíssimo) - Radical? Eu? Estás bom da cabeça?

Seguro (faz cara séria) - Sim, radical! Tirar os subísdios outra vez? É preciso ser casmurro! E não vês que isto está uma tragédia social?

Passos (encolhe os ombros) - Não me venhas com essa história da carochinha outra vez...E o Tribunal Constitucional é um ninho de esquerdalhos, toda a gente sabe!

Seguro (abanando a cabeça) - Tu não aprendes mesmo! Não olhas para o lado? Isto está uma desgraça!

Passos (franzindo a testa e olhando para o lado) - Isto o quê? Não gostas da decoração? Mantive tudo o que era do outro...

Seguro (sorri, enervado) - Não desvies a conversa! O país está de pantanas, é isso que eu quero dizer!

Passos (encolhendo os ombros) - Isso é passageiro! Tem de ser assim uns tempos, mas depois melhora!

Seguro (surpreendido) - Quando? Já lá vão dois anos e nada, está cada vez pior!

Passos (franze a testa) - Aí é que estás enganado...Os juros desceram, o país é credível, os credores acham que estamos a fazer um esforço. A Merkel adora-me, e o Schauble adora o Gaspar! Isso é que conta!

Seguro (espantado) - Mas, e o desemprego, e a recessão, e as pessoas na miséria?

Passos (suspira fundo) - Pois, é uma maçada. Mas tem de ser!

Seguro (enervado) - Não acho!

Passos (surpreendido) - Não percebo...

Seguro (ainda mais enervado) - Isto não era inevitável, a receita é que está errada, vocês foram longe demais!

Passos (sorri) - Qual é a parte da frase "Não há dinheiro!" que tu não percebes?

Seguro (ri-se divertido) - Essa não é tua, é do Gaspar...Mas já vi que neste Governo é ele que pensa!

Passos (mexe-se na cadeira, enervado) - Ó Tozé, tens de perceber uma coisa, a troika é que manda, a gente não manda nada. Nem eu, nem muito menos tu! Percebes, ou queres que te faça um desenho?

Seguro (mais calmo) - Estou a ver que te irritas com facilidade...

Passos (compõe-se rapidamente) - É pá, tem de ser. Eles é que mandam, o resto é conversa da treta!

Seguro (arqueando a sobrancelha) - Foram eles que te mandaram falar comigo?

Passos (faz de conta que não percebeu): Uhmfborrrbbvnb...eles...temos de...conversar com...

Seguro (divertido) - Foram mesmo eles! E tu fazes o que eles mandam!

Passos (incomodado) - Eles querem o consenso nacional, dizem que é muito importante...É isso, consenso, foquemo-nos nisso...

Seguro (desconfiado) - E isso o que quer dizer?

Passos (encolhe os ombros) - Não sei bem...mas é consensual...

Nasce um silêncio na sala. António José Seguro espera que Passos Coelho fale, e o primeiro-ministro espera que seja o líder do PS a tomar a iniciativa. Passam alguns minutos a olhar para a janela. De repente, entreabre-se uma porta e o novo ministro Marques Guedes espreita, sorridente.

Marques Guedes - Há novidades?

Passos e Seguro olham um para o outro e depois o primeiro diz que não com a cabeça. Desiludido, Marques Guedes retira-se, fechando a porta. Passos Coelho respira fundo e toma a iniciativa.

Passos - Então?

Seguro - Então o quê?

Passos - O que é que vocês vão apoiar? Quais cortes?

Seguro - Cortes? Que cortes?

Passos - Em todo o lado, a gente tem de cortar a direito, 800 milhões, talvez mais!

Seguro - Se for no Estado Social, estamos contra! E se for mais austeridade, também!

Passos (exasperado, abana a cabeça) - Estes tipos...

Seguro (irritado) - Qual é a parte da frase "Não queremos mais austeridade nem cortes no Estado Social" que não percebes?

Passos (preocupado) - É pá, mas isso vai levar a um segundo resgate! Não compreendes que temos de voltar aos mercados antes?

Seguro (de repente mais sério) - Nisso estamos de acordo! É essencial!

Passos (mais animado) - Então, temos um consenso?

Seguro (depois de pensar uns segundos) - Sim...pode-se dizer que temos um consenso. Mas não se pode dizer que estamos de acordo.

Passos (intrigado) - Um consenso sem acordo? E como é que isso funciona?

Seguro (encolhe os ombros) - Não sei...

Passos (enfadado) - Pois...

Seguro (compõe-se na cadeira) - Infelizmente é o que há...

Passos (suspira) - Estás quase igual ao CDS do Portas, dizem mal de tudo, mas estão connosco...

Seguro (sorri, quase imperceptivelmente) - Isso já não sei, cada um fala por si.

Passos (levanta-se subitamente) - Bom, tenho de ir. E...já agora, estamos de acordo em voltar a falar um dia destes?

Seguro (levantando-se também) - Com data ou sem data?

Passos (reflete durante uns segundos) - É melhor sem marcar, não achas?

Seguro (reflete também uns segundos) - Sim, claro! Desde que fique claro que o PS não está de acordo com a austeridade nem com os cortes no Estado Social, tenho todo o gosto em vir cá mais vezes...A decoração é um bocado feia, vê-se logo que andou aqui a mãozinha de alguém...

Passos (sorri) - Pois...Bom, até um dia destes...Vou ter de explicar isto ao Marques Guedes com alguma minúcia...Consenso sem acordo parece-me um bocado esdrúxulo, não achas?

Seguro (sorri também) - É como austeridade expansionista, não é?

Passos sorri mas é um sorriso um bocado amarelo...E decide que o melhor mesmo é chamar o Poiares Maduro, talvez ele tenha alguma ideia de génio.

 

 

 

 

 

 

publicado por Domingos Amaral às 16:19 | link do post | comentar