Quatro razões para dar os parabéns ao Tribunal Constitucional

Apesar do Governo, e muitas outras pessoas, terem atacado furiosamente o Tribunal Constitucional, pela minha parte fiquei contente com a decisão da passada sexta-feira, e parece-me que há quatro razões, todas elas boas, para dar os parabéns ao TC.

 

1 - O Tribunal não criou um buraco nas contas, quanto muito criou um buraquinho!

Na verdade, o aumento da despesa do Estado resultante da decisão do TC não são mil trezentos e cinquenta milhões de euros. Esse é o valor bruto, mas como cerca de 550 milhões vão regressar ao Estado sobre a forma de IRS cobrado sobre os subsídios, o valor líquido do aumento de despesa é cerca de 800 milhões de euros. Ora, sendo a despesa total do Estado cerca de 80 mil milhões de euros por ano, o buraco que o TC criou é apenas de 1 por cento! Sim, leu bem, é um buraquinho minúsculo. Então 1% de desvio é muito? Desde quando? Como ontem dizia Manuela Ferreira Leite na televisão, então se eu em vez de gastar 1000 euros tiver de gastar 1010 euros isso é muito? A dramatização deste "desvio minúsculo" é uma farsa patética.

 

2 - As pessoas vão ter mais rendimento disponível para gastar!

A decisão do TC aumenta um pouco a despesa do Estado, mas não nos podemos esquecer que também aumenta o rendimento disponível dos funcionários públicos e pensionistas. O Estado terá de pagar os subsídios, e embora parte desse dinheiro seja para devolver em IRS ao Estado, uma parte importante ficará no bolso das pessoas. E isso é bom para a economia! Com mais dinheiro disponível, os portugueses podem gastá-lo, aumentando o PIB do país e contribuindo indirectamente para o aumento da receita, com o IVA que vão pagar sobre os seus consumos. Ora, para quem está em recessão, qualquer aumento do PIB é bom, venha de onde vier! A decisão do TC não só desagrava a recessão, como pode significar que mais alguns milhares de portugueses continuam empregados e não vão parar ao desemprego. Só os fanáticos da austeridade não vêm isso...

 

3 - Se há igualdade entre pessoas no público e no privado, isso significa que os despedimentos no sector público não são impossíveis!

Estou totalmente de acordo que deve existir igualdade entre funcionários públicos e privados, e por isso o Governo não pode tirar os subsídios a uns e manter os dos outros. O princípio da igualdade perante a lei é uma pedra essencial das nossas sociedades e democracias. E é exactamente por isso que eu julgo ser possível deduzir que o TC está a dizer, implicitamente, que não há razão nenhuma para os despedimentos no sector público não existirem. A impossibilidade de despedir funcionários públicos não é um princípio constitucional, não há nada escrito na Constituição que impeça o despedimento dos funcionários públicos. O que há em Portugal é uma espécie de convenção não escrita, mas falsa. Portanto, o Governo, este ou qualquer outro, pode despedir funcionários do Estado.

 

4 - Os mais ricos suportam melhor uma crise.

Ao não considerar inconstitucional a Contribuição Extraordinária de Solidariedade, que é cobrada sobre as pensões mais elevadas, o que o Tribunal Constitucional está a dizer, e bem, é que as pessoas com mais elevadas pensões não ficam afectadas na sua capacidade económica só porque pagam mais impostos sobre essas pensões. As pensões existem para garantir um mínimo de dignidade a quem já não pode trabalhar, não para manter o nível de vida faustoso do passado. Em épocas de grave crise financeira, pagar pensões altíssimas é obsceno, e por isso é perfeitamente legítimo que um Governo tribute mais as pensões mais elevadas. 

 

 

 

 

publicado por Domingos Amaral às 11:49 | link do post | comentar