Quando uma mulher bebe uns copos...

Ela não era uma mulher especialmente ousada. Sim, tinha tido as suas aventuras quando era mais nova, namoriscara vários rapazes, apanhara uns pifos, fumara uns charros, mas nunca passara além de certos limites. Embora gostasse, de vez em quando, de perder o controle, nunca o perdera totalmente.

Sim, é verdade, reprimira algumas fantasias. Uma vez, há mais de dez anos, tivera imensa vontade de dormir com o melhor amigo do marido, mas fechara os olhos, contara até a cinco e esquecera a coisa. 

De uma outra vez, numa despedida de solteira de uma amiga, apetecera-lhe trepar para o varão, despir-se à frente de todos, e enrolar-se no dançarino musculado que se exibia para o grupo feminino barulhento que ela e as amigas formavam. Mas, apesar de tudo, tinha a noção do ridículo, e dentro dos possíveis mantinha uma reputação de mulher misteriosa, não de tonta ou tresloucada.

Contudo, por vezes uma bebida muda a vida, e tudo o que contemos cá dentro salta para a superfície. Há meses que lhe fazia falta uma certa balbúrdia, e começava a sentir-se confiante outra vez. Caramba, já haviam passados dois anos sobre o divórcio, remoera as feridas, curara-se e agora estava com vontade de se perder. 

Foi aquele gin tónico que esteve na origem de tudo. Foi o primeiro, numa festa que até não estava especialmente divertida. E o primeiro é sempre o primeiro responsável pelas mudanças, mesmo que não tenha a responsabilidade de tudo.

O segundo e o terceiro, que se seguiram, encheram-lhe a cabeça de imagens. Parecia que estava dentro de um filme, havia gente por todo o lado. E sexo, muito sexo. 

Então, fixou-se num homem que dançava perto dela. Sabia quem era, sabia que estava disponível e sorriu-lhe. Um sorriso feminino faz milagres, e umas horas mais tarde estavam nus, em casa dela, deitados numa cama.

Ela sentiu-se excitada como há muito não se sentia, e ele ficou surpreendido com tanta genica e tanta fantasia que ia na cabeça dela. Lá foi cumprindo a sua função, tentando perceber o que ela queria, mudando de posição ou de táctica, mas rapidamente chegou à conclusão que só ele não chegava. 

Naquela noite, ela parecia querer muito mais do que apenas um homem. Ela queria todos os homens, tal era o seu desejo!

Mas também podia ser outra coisa, pois ela falava muito depressa, gritava muito, e ele nem sempre percebia o que ela dizia. Só houve uma coisa que ele percebeu, quando ela lhe chamou um nome diferente do dele.

Não reagiu, fez de conta que não ouvira, e continuou a fazer o que estava a fazer, mas soube imediatamente que não era só nele em quem ela pensava. 

No fim, quando se foi embora de casa dela, nem referiu o facto. Não valia a pena. Até fora uma noite agradável. O sexo fora bastante bom e mesmo que ela estivesse a pensar noutro homem, ou noutros homens, ou só estivesse a partilhar em voz alta fantasias da cabeça dela, a verdade é que quem lá tinha estado a fazer o servicinho era ele, e não outro. Ou outros.

Confirmou o que sempre soubera: quando as mulheres bebem uns copos a mais voam sempre para lugares muito distantes e muito fantásticos. E, por mais que um homem cumpra o seu dever, nenhuma realidade satisfaz uma fantasia. Seja ela qual for...

publicado por Domingos Amaral às 11:51 | link do post | comentar